Misteriosa linguagem (I)
Nas montanhas, os vidoeiros e pinheiros silvestres estremeciam em ondas ordenadas. Obedeciam ao vento caprichoso que se fazia sentir nos ramos mais altos. Não era bem uma floresta, pois o número presente de elementos fazia supor, mais, uma reunião. Uma tertúlia de árvores! Podiam-se contar… Eram as últimas resistentes.
E o que elas sabiam? … Ai, o que elas sabiam!
Hão resistido a alguns fogos, secas, inundações e a colossais tempestades de furacões, familiares poderosos do ar que se movia levemente apressado nesse início de tarde, de princípio de verão.
Enquanto pequenas, vingaram por força da sorte, ao ruminar repetitivo de vários rebanhos. Quando os pinheiros eram crianças e as bétulas adolescentes, muitas ovelhas, cabras e vacas, ousaram e insinuaram convertê-las em terra nova e fresca. Esse foi o destino de muitas.
Três gerações de pessoas calcorrearam e pisotearam aquele chão que sustém as suas raízes.
Madeireiros sedentos de lucro imediato acabaram com as mais robustas e frondosas. Não se ocuparam em replantar, tão pouco. Quando já nada havia a explorar, foram pobres e tristes embora. Famílias de seres humanos que nunca mais ousaram por ali passar.
As últimas àrvores resistentes, tinham sido as mais pequenas e enfezadas... Ainda eram raquíticas no tempo da grande destruição. Mesmo assim, vigaram pelo àrduo solo granítico.
Elas sentiram. As útimas resistentes conservavam tudo. Tudo.
O esquecimento das pessoas, agora, favorecia-as.
(enquanto os humanos não se lembrassem de regressar com novas ideias de moda… bom esquecimento!)
Desde que não houvesse projecto para a sua residência que tinha sido desde sempre aqueles montanhosos relevos de inóspitos contornos, o tempo das árvores congelava numa aparente passividade.
As bétulas marcavam o tempo das estações com a presença das folhas e das cores que tinham. O mato rasteiro da urze e carqueja cercavam-nas a certa distância e marcavam uma quase redonda fronteira entre os penedos e a linha de água. Nas partes mais altas e secas, morava a giesta – reino triunfante.
Nestes novos tempos, até os rebanhos e manadas escasseavam naquela serrania. Era uma nova oportunidade para a emergência que o grupo formava, estas, outrora imperatrizes da montanha viva… sempre erectas e viris (também a erecção definha! – mesmo que morra de pé… um rigor mortis).
Mas hoje, já a tertúlia conspirava em ser floresta uma vez mais. O mato venceu o pantanoso e daninho prado rasteiro. No Inverno, a água já não ensopava a superfície. Em vez disso, ribeiros, ribeirinhos e riachos sulcavam e esculpiam o recém terreno conquistado.
A informação que a família arbórea ocultava, tornava-as conscientes. E não ouviam, não cheiravam, não viam, nem saboreavam. Porém… sentiam.
Tacteavam com as folhas, ramos troncos e raízes. Percebiam de energia, que é como dizer que ouviam, cheiravam, viam e saboreavam. Sempre orgulhosas e de pé se mantinham. Com esperança… eterna esperança…
A água que as raízes sugava, absorvia conhecimento. Informação.
Cada molécula contava uma história – os infindáveis e insondáveis sítios por onde passara.
Os infindáveis e insondáveis sítios por onde passara em todo o Mundo!
E até antes dele. Assim viviam e sabiam.
A misteriosa linguagem das árvores sobre o mágico conhecimento das coisas, era preservado em absoluto segredo. No maior e mais profundo sigilo.
Ficava o orgulho de ser.
A natureza que é e contém.
O sangue que é seiva.
A alma e o amor de ser.
Natureza.
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