Tempo que não volta
Vielas, vilarejos e aquele ribeirão
O sonho bordado nas janelas, o casarão
As redes nas varandas, a gente na calçada
Os passeios junto às árvores centenárias
Na praça dos encontros e desencontros
Os bancos de concreto, bons pra coluna
O rodopio e a chegada no mesmo ponto
A Maria fumaça que era trem e alegria
A conversa do velho Bóia, as mentiras do Eurico
As garrafas de leite na porta,
as bananas nanicas, ouro e maçã do Pimenta
olha o padeiro, verdureiro, tudo na caderneta
Ao tempo do café moído e torrado em casa
Da broa de milho com erva doce
E da boa prosa que rolava na cidade
De Bert Kaempfert ao Tijuana na velha vitrola
Do Teixeirinha ao Ray Charles que emoção
Dos seriados Anjo, Jerônimo - o herói do sertão
No tempo do rádio de válvulas,
Da CIA com sua "Voz das Américas"
E do mingau de trigo da "Aliança para o Progresso"
Ah, este tempo que ouvia falar de reforma agrária
Da trinca de Jotas: Juscelino, Jânio e Jango
Até colégio fechar e surgir a trinca ditadura
Tinha 10 anos, e me punham medo do vermelho
do Prestes, do Arraes, do Brizola
Meu pai ouvia o movimento no rádio clandestino
Mas, havia o circo, do pobre leão magro
do palhaço perna-de-pau,
dos trapezistas voadores, do mágico
Vielas, vilarejos e aquele belo açude,
o tempo de cair na água do Náutico e ser peixe
o tempo de subir nas árvoves e ser macaco
O tempo de tragar cigarro de palha e ser grande
o tempo de soltar pipa e ser pássaro
o tempo de pegar na mão da menina e ter arrepio
Ah, tempos idos, mas nunca esquecidos
das travessuras, ingenuidades e descobertas
das coisas boas e ruins da vida
Ao tempo de olhar nos olhos, de sinceridade
de roubar um beijo e corar, palpitar o peito
do desabrochar da adolescência e sua rebeldia
Tempo de desafiar as convenções, de transgredir
de botar o pé no mundo e o rumo da vida assumir
Deixando pra trás a Vila e seus encantos...
AjAraújo, o poeta humanista, poema dedicado a minha Vila querida: Santanésia, distrito de Piraí, recordando meus 10 anos passados durante a queda do governo de João Goular, escrito em 1980 e revisitado em março de 2010.
Submited by
Poesia :
- Login to post comments
- 3376 reads
Add comment
other contents of AjAraujo
Topic | Title | Replies | Views |
Last Post![]() |
Language | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Intervention | Hora (Sophia Breyner Andresen) | 0 | 2.871 | 07/11/2011 - 11:06 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Como nuvens pelo céu (Fernando Pessoa) | 0 | 1.885 | 07/11/2011 - 11:04 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Navegue (Silvana Duboc) | 0 | 2.598 | 07/11/2011 - 11:01 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Mapa de Anatomia (Cecília Meireles) | 0 | 1.625 | 07/11/2011 - 10:58 | Portuguese | |
Poesia/Love | Obsessão do Mar Oceano (Mário Quintana) | 0 | 2.493 | 07/11/2011 - 10:57 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Quisera ter | 0 | 2.544 | 07/11/2011 - 00:36 | Portuguese | |
Poesia/Fantasy | A dama e o cavaleiro | 0 | 4.802 | 07/11/2011 - 00:22 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Quartetos | 0 | 1.318 | 07/11/2011 - 00:20 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Cantiga quase de roda (Thiago de Mello) | 0 | 6.546 | 07/11/2011 - 00:17 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | A Vida Verdadeira (Thiago de Mello) | 0 | 3.796 | 07/11/2011 - 00:12 | Portuguese | |
Poesia/Love | Janela do Amor Imperfeito (Thiago de Mello) | 0 | 3.841 | 07/11/2011 - 00:10 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | O pão de cada dia (Thiago de Mello) | 0 | 9.972 | 07/11/2011 - 00:05 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | A Esperança (Augusto dos Anjos) | 0 | 1.589 | 07/10/2011 - 03:14 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Versos íntimos (Augusto dos Anjos) | 0 | 10.735 | 07/10/2011 - 03:12 | Spanish | |
Poesia/Intervention | Solitário (Augusto dos Anjos) | 0 | 1.359 | 07/10/2011 - 03:10 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | Trevas (Augusto dos Anjos) | 0 | 849 | 07/10/2011 - 03:09 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | Ao luar (Augusto dos Anjos) | 0 | 2.892 | 07/10/2011 - 03:07 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Soneto (Augusto dos Anjos) | 0 | 1.606 | 07/10/2011 - 03:05 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | O berço e o terremoto (Mário Quintana) | 0 | 3.053 | 07/10/2011 - 02:55 | Portuguese | |
Poesia/Love | Presença (Mário Quintana) | 0 | 2.316 | 07/10/2011 - 02:55 | Portuguese | |
Poesia/Intervention | O auto-retrato (Mário Quintana) | 0 | 2.908 | 07/10/2011 - 02:50 | Portuguese | |
Poesia/Meditation | A canção da vida (Mário Quintana) | 0 | 4.114 | 07/10/2011 - 02:48 | Portuguese | |
Poesia/Dedicated | Os arroios (Mário Quintana) | 0 | 1.643 | 07/10/2011 - 02:44 | Portuguese | |
Poesia/Love | Eu queria trazer-te uns versos muito lindos (Mário Quintana) | 0 | 2.263 | 07/10/2011 - 02:41 | Portuguese | |
Poesia/Aphorism | Canção de nuvem e vento (Mário Quintana) | 0 | 2.316 | 07/10/2011 - 02:37 | Portuguese |
Comments
Ao tempo de olhar nos olhos,
Ao tempo de olhar nos olhos, de sinceridade
de roubar um beijo e corar, palpitar o peito
do desabrochar da adolescência e sua rebeldia
Re: Tempo que não volta
"Mas, havia o circo, do pobre leão magro
do palhaço perna-de-pau,
dos trapezistas voadores, do mágico"
Ai poeta, que saudades! Tempos que ficaram esquecidos no tempo... agora tão bem relembrados! Eternizados, sim!
Obrigada pelo poema
Carla
Re: Tempo que não volta
Ao tempo de olhar nos olhos, de sinceridade
de roubar um beijo e corar, palpitar o peito
do desabrochar da adolescência e sua rebeldia...
Ah, tempos idos, mas nunca esquecidos, aqui os eternizas!!!