Blue Moon

Meia noite e o clube Blue Moon, resplandescia de vida, na metrópole de Chicago.
Vivia-se os ultimos dias do Blues e o rock and roll espreitava.
Emma Star, a dona do Clube Blue Moon, fazia contas á vida e assustava-se com os ventos negros que se aproximavam.
Durante a lei seca, havia sobrevivido e erguido um verdadeiro Império. Adorada pela Máfia, adorada pela policia de Chicago, mantinha a ténue fronteira dos atritos bem segura.
Definia-se como uma trapezista numa ténue e imaginária linha de equilibrio, e graças á sua mestria e diplomacia conseguia encher o clube todas as noites.
Confiara o seu talento em Jerome Day Lee, outrora um trompetista da moda, agora perdido em alcool e blues. Mas o seu talento ainda residia, graças á inspiração e aposta de Emma.
Era nos dias em que o clube enchia que Jerome tocava com toda a alma que tinha. Não raras vezes a prória Emma, sentia uma lágrima escorre-lhe pela face ao ouvi-lo.
Presença assidua do seu clube, era Jim Jim Jingles o chefe da máfia e padrinho da abertura do clube.
Jim Jim, considerava-se acima de tudo o patrono das artes e amava o som dos Blues. Não dispensando o Champagne, que àvidamente Emma lhe fazia chegar à mesa.
Jim Jim e os seus capangas, sentavam-se a um canto do clube, indiferentes a quem frequentava.
Mas Jim Jim era um cavalheiro, até na arte de se vestir. Sempre de fato imaculado. Sempre de de rosto bem tratado. Nascera para ser Líder e apesar dos seus gestos calmos, era frio e calculista.
Regra geral, na outra ponta do Clube, sentava-se Tony Shark ( ou Dead Tony como lhe chamava Jim Jim).
Tony era bem mais novo que Jim Jim, louco por aescender ao poder na Familia e tomar conta do lado Oeste de Chicago, mas Jim Jim não o iria entregar de bandeja.
Os dois grupos eram vigiados atentamente por Samuel Brick ( ou Sammy the kid, como lhe chamava Emma), detectice da policia de Chicago e tambem ele um aspirante ao sucesso de prender o grande Jim Jim.
Blue Moon era assim um rastilho seco de pólvora, só precisava de uma chama ou faulha para rebentar de vez., e por incrivel que pareça, Emma geria com pinças toda a situação, sem revelar alguma tensão.
Mas agora um novo desafio espreitava. Se Jerome já estava ultrapassado, com a nova tendencia que surgia nos rádios, iria definitivamente acabar. Emma tentara recrutar duas cantoras as " Golden Singers Sisters", mas o resultado tinha ficado aquém do previsto, mesmo que cantassem, com pouca roupa.
Era tudo uma questão de hábito e o publico habituara-se ao trompete de Jerome.
-Emma, estou arrasado e só agora comecei.
-Não comeces Jerome! Hoje estou sem paciência para choros...
-Não é isso Emma, não estou em forma.Eles já notaram.
-Jerome, eles vem aqui para beber e relaxarem com as meninas. Não te rales com isso.
-Sim, tens razão. Mas sinto-me a perder a força!
Emma lançou um rápido olhar para a miuda que segurava o tabuleiro do tabaco:
-Rose, chega aqui!
Como uma gazela, serpenteando por entre os pés perdidos, que deambulavam pelo chão frio do clube, a miuda morena, alcançou com precisão impressionate o pequeno balcão espelhado:
-Chamou Patroa?
-Sim ouve, dá-me um desses Camel ( entregando o maço a Jerome). Está a correr bem a venda?
-Nem muito. O costume, suponho.
-Ouve miuda, o Jerome está numa crise existencial. Aquilo que cantas-te ontem quando fechamos o clube...
-Sim?
-Eras capaz de repeti-lo?
-Sim. Hoje quando fecharmos posso cantar de novo.
Emma soltou uma gargalhada bem audivel e ripostou:
-Não querida. Falo em cantares agora, ali no palco.
-No palco?
-Exacto.Não era o que querias? Tens a tua chance.
-Mas o Clube está tão cheio.
-Precisamente por isso. O Jerome hoje não se safa, e se não á atracção aqueles buldogs começam a trocar piropos e isto corre mal.
-Mas não estou preparada.
-Claro que estás, basta mostrares um pouco as pernas e as mamas se for preciso.
Incrédula a jovem nem pestanejou. Pousou o tabuleiro no balcão e ofensivamente protestou:
-Não sou uma miuda do Champaghe e de colo entendes? Tenho a minha virtude intacta. Não sou qualquer uma. Despeço-me!
Emma sorriu arrependida, e agarrou levemente o pulso da jovem:
-Desculpa, hoje estou nervosa. Esquece o que disse. Canta só hoje, por favor!
-Sim, que diabos, canta comigo miuda. Eu acompanho-te ao trompete. Vamos fazer algo unico.
Danny Rose suspirou e encolhendo os ombros, sentenciou:
-Imaginemos que aceitava e corria mal. De certeza que querias o teu publico enfurecido, Emma?
O ar meditativo da dona do Clube foi interrompido por uma voz profunda e ponderada:
-A miuda tem razão no que diz. Mas uma chance não deve ser desperdiçada.
Os seis olhos se viraram para o estranho de chapéu cinzento e gabardine.
-Desculpe? - Indagou á laia de desafio Emma.
-Só digo que se a miuda tem talento, que o exiba.
-Com quem tenho o prazer de falar?
O atlético sujeito sorriu, tirou o chapéu pousando-o discretamente no balcão e respondeu, em tom irónico:
-È curto o teu prazer! Jonh Menphis, de Nova York.
-Muito bem Senhor Menphis, na Big Apple tem o costume de se meterem nas conversas?
-Frequentemente, Dona Emma.
-Como sabe quem sou?
-Não seria musico se não soubesse.
Jerome exibiu um sorriso amarelo, perante a afirmação do estranho e interrompeu:
-Musico, ah? ès muito novo para ser musico. Ou és um desses charlatões do rock?
-Charlatões?
-Sim, esses miudos armados em musicos, sem conseguirem ler uma pauta de musica.
-Bem, eu sei ler pautas.
-Eu sabia. Livra-te dele Emma. Só vai trazer sarilhos!
-Calma Jerome, ninguem vai trazer sarilhos ao meu clube. Que instrumento tocas?
-Piano.
-Ah piano...Pfff
-Tranquilo Jerome!
-Pois bem, como vês eu tenho um piano no palco. Se fores tão bom musico, como és de garganta.
Menphis sorriu, deu mais dois goles de Gin e retorquiu:
-Podes apostar todas as tuas joias!
-Tocas o Blue Moon?
-De olhos fechados.
Emma riu a bom rir pela segunda vez nessa noite. Olhou de soslaio para o ambiente do clube e reparou no olhar fixo de Jim Jim em Tony. Estava a ferver o ambiente. Precisava de um balde de gelo....
-Ok grande senhor de Nova York. Vais tocar o Blue Moon e tu Rose vais cantar.
-O quê? Eu pensava que ja tinha deixado bem claro...
-Miuda, nunca negues uma oportunidade.
Rose olhou fixamente o olhar candido e sereno do estranho e sem se dar conta, confirmou:
-Ok, vamos lá!
Deliciada Emma levou a mão ao ombro de Jerome e segredou:
-Meu lindo, vai anunciá-los. Vamo-nos rir um pouco.
-Isto é errado Emma. Isto é muito errado!
-Vai por mim Jerome. Vai valer a pena.
Encolhendo os ombros o trompetista, dirigiu-se ao palco e pegando no microfone anunciou:
-Senhores e senhoras, directamente de Nova York, o pianista Menphis e a nossa jovem promessa Rose, para vocês em exclusivo aqui no Blue Moon. E adivinhem, Rose vai cantar precisamente o tema Blue Moon.
O publico apaludiu, enquanto Samuel Brick, o detective de chicago observava atentamente o rosto do estranho, Já o vira em qualquer lugar e não conseguia compreender onde. Disfarçadamente, foi caminhando até perto do palco, ondde escolheu uma pequena mesa redonda, livre e sentou-se inquieto.
Aos primeiros acordes do piano, Rose transfigou-se e assumiu a pose de uma diva, sob um redondo de luz no palco, começou forte e impiedosa:

Blue moon,
You saw me standing alone,
Without a dream in my heart,
Without a love of my own

Ao piano Menphis, fazia os dedos cairem pesadamente certos no tom correcto e a um canto, escondido atrás das grandes cortinas negras do palco Jerome acariciava a Harmónica, lembrando-se de outros tempos e outras Eras, onde tudo era inocente e vago.
Alarmado pela presença, tão perto de Brick, Jim Jim aconselhou um dos seus capangas a ter a mão preparada para sacar da arma.
Tal gesto alarmou Tony, que momentos antes havia trocado uns piropos com o capanga, e sem receios abriu o casaco, agarrando a coronha da sua arma, preparado para a sacar.
Emma apercebendo-se do movimento de Tony, aproximou-se dele e tentou em vão acalmá-lo
No palco Rose, seguia segura:

Blue moon,
You knew just what I was there for.
You heard me saying a pray for
Someone I really could care for.

A tensão era grande, os receios estavam no limite. Temendo ainda o pior, Emma levantou-se com um beijo na face de Tony e foi tentar juntar-se a Jerome, para trás do palco.
A voz de Rose enchia a plenos pulmões o ambiente:

Blue moon,
You saw me standing alone,
Without a dream in my heart,
Without a love of my own.

Jim Jim mantinha o olhar atento em Brick, que por sua vez concentrava-se em Menphis. o pianista, que era observado por Jerome, angustiado por o ver tocar tão bem Jerome que era desejado por Emma, que era observada pelo capanga de Jim Jim, que era observado em todos os seus musculos por Tony Shark.
A nota final aproximava-se, Rose rejubilava de talento, segura e formosa. Seguia-se as ultimas frases:

Blue moon...
Without a love of my own.

E Rose acabou, nuns apalusos nervosos mas sentidos.
Deliciada Emma aproximou-se do palco para cumprimentar e felicitar os seus novos talentos, quando inesperadamente Menphis repara no distintivo a brilhar de Brick, e sem perder tempo, saca de uma arma, escondida por baixo da gabardina, perto do cinto e dispara em direcção a Jim Jim, atingindo-o.
Nesse pronto momento,Brick saca da arma, e atinge Menphis. Que proporciona que Tony saque da arma, e dispare para o guarda costas de Jim Jim, atingindo-o no peito.
Porem ao ser alvejado, o Guarda costas dispara acidentalmente, acertando Brick nas costas que por sua vez ao cair, dispara uma ultima vez.
Passos, gritos e horror sucedem-se em atropelos. Mesas são viradas, clientes são empurrados.
Deitada no chão, Rose esgueira-se para trás do piano e algures no meio do Salão do clube, começa um pequeno incêndio.
Jerome atónito, observa o corpo ensaguentado de Menphis caido no palco. Observa a confusão, o caos e subitamente, vislumbra o corpo de Emma tombado perto do palco. Desesperado, avança em direcção a ela, limpando o pequeno fio de sangue que escorria dos lábios dela,abraçando-a:
-Eu disse que era um erro. Esse gajo cheirava mal.
-Pois disseste meu doce Jerome. Pois disseste!
-Emma, estás ferida. Balearam-te.
-Oh Jerome, o que eu fui fazer!
-Aguenta Emma, a ambulância não tarda. Raios me partam se compreendo o que se passou aqui!
Emma sorriu timidamente e perguntou:
-A Rose...Está bem?
-Sim. Está. A miuda safou-se!
Por uns segundos os dois fitaram-se longamente, depois, sentindo a voz fugir-lhe, Emma pediu:
-Tens a tua armónica?
-Sim Emma, está aqui.
-Toca para mim, como sempre tocas-te...uma ultima vez.
De lágrimas nos olhos castanhos, Jerome nem hesitou. Pousando a cabeça dela no seu colo, tocou um Blues conhecido, na sua velha e gasta Harmónica até Emma deixar de respirar.

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Tuesday, April 20, 2010 - 20:58

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Mefistus

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ÔNIX's picture

Re: Blue Moon

DE uma criatividade imensamente grande e intenso este teu estilo inconfundível

Tens um mundo recheado de tanta coisa; um mundo de desbravar e sempre mas sempre encontrando muito de espectacular

Beijo meu

Matilde D'Ônix

PS: pois disseste um dia que terias um romance editado, ou fui eu que sonhei com esta oportunidade
Desculpa, mas esta nota devia seguir po PM, mas este site tem sido um desespero nestes últimos dias

Librisscriptaest's picture

Re: Blue Moon

E conseguiste, outra vez, deixar-me deliciada, porque trazes-me o Blue moon, da grande Ella, quase me consegues deixar fã da versão da Rose e cliente habitué do clube da Emma Star! Adorei a historia, muito bem construída, com um cenário envolvente q me deixou assim a sussurrar baixinho, olha, olha quem esta ali na outra mesa...
Adorei cada personagem e o desfecho q esta arrebatador e dramático, ainda assim sente-se um romance muito blues no ar!
Beijinho grande, grande em ti!
Tb levo este comigo!
Inês

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Re: Blue Moon

Genial Mefistus!
Genial mesmo.
Senti-me num filme a preto e branco,de emoções fortes.

Parabens, e continuo á espera do 5 da Enoah

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