OS GÉMEOS - 19
.
Conheceu-a no laboratório de análises da clínica onde Madeleine fora internada, e graças à familiaridade de James com o Dr. Brent.
Porque existisse alguma empatia entre eles, ambos biólogos, ou porque ela tivesse sido comovida pelo afectuoso acompanhamento que ele dedicava ao drama da cunhada, foi-lhe aparecendo, como se tratando de casualidade, sempre com uma delicadeza preocupada em que a sua presença não fosse intrometida, mais como se por uma sua ética de solidariedade académica lhe devesse prestar apoio moral a ele, que o não dizia mas na realidade vivia um pânico psicológico tão intenso como o de Madeleine.
Escutava-o com uma atenção solícita, que ele teve dificuldade em interpretar, porque quase sugeria um silencioso apelo para que a ajudassem a fugir à sua própria solidão.
Certamente, concluiu William, ela achara alguma comparação entre o isolamento em que ele realizava o seu trabalho no ermo arrozal e a sua própria vivência de emigrante, longe das suas raízes tão diferentes das ocidentais. E essa conclusão, superficial, como ele admitiu, inspirou-o a convidá-la para sua assistente de investigação. Isto, já quase em cima do seu regresso a Lameira Grande, pouco ou nada sabendo de Hana, pois ela, sem notória reserva, pelo menos que ele antes se apercebesse, nunca se detivera a contar-lhe grande coisa da sua vida; apenas consciente de que ela tinha um espírito crítico muito apurado, possuía uma preparação técnica apreciável, e, pormenor enigmático, com a sua qualidade de perspicaz reverência lhe comunicava uma sensação mental de dominada serenidade. Duvidava bastante que ela aceitasse a sua inesperada proposta de trabalho, mas Hana limitou-se a sorrir com um contentamento moderado e a conceder-lhe uma cerimoniosa vénia de honorada aceitação. Mais não pretendeu do que vinte e quatro horas para tratar de encerrar os seus assuntos pessoais e, pedido com envergonhada cortesia, o préstimo influente de M. James para facilitar junto do Dr. Brent a sua libertação profissional na clínica.
James, sem nenhum entusiasmo, não levantou contudo objecções à contratação de Hana, e colaborou para que ela se pudesse desvincular da clínica. Mas, pensativo, não deixou de citar a William um interessante provérbio oriental: As flores, são sempre perfumadas, agora, como outrora. Dos corações humanos, nada sabemos.
Entre James budista e James maoista haveria uma linha de separação muito ténue! — reflectiu Willy — Que poderia ser um mero traço de beleza feminina, dom que contudo não era muito nítido em Hana.
— Levas contigo uma mulher muito especial, William... — observou-lhe Madeleine, intimidade terna e azul resguardada sob uns vulgares óculos escuros, sorriso recortado de pudica amorosidade, mão carinhosa a afagar-lhe o braço, no momento em que Hana, incapaz de ter a indelicadeza de beliscar a gentil insistência de James, permitiu que este, encarregando-se de agarrar na sua pequena mala de viagem, a encaminhasse para um dos atendimentos mais isolados no balcão de check in, alegadamente para evitarem perder tempo.
— Hana?... — retorquiu William, quase lacónico, receoso de usar palavras, a mente a refugiar-se na melodia do Concerto de Aranjuez, não a despropósito presente no espírito dele, como uma mensagem paliativa para o seu constrangimento. — Talvez... Pareceu-me uma escolha acertada para o género de trabalho. Oxalá seja. Bem preciso de uma assistente qualificada.
— Vais ver que é... Apanhei esta do “Vais ver”, contigo... Obrigada por isso, e por tudo... Gostaria de te ir visitar qualquer dia. É melhor não!... Vou pensar. Desejo-te todo o êxito, Willy!
— Vai-me dando notícias, Madeleine. Jimmy, no seu entusiasmo de viver, esquece-se de mim.
— Não quer perturbar-te. É raro falar em ti, e quando o faz é como se vocês estivessem sempre à mão um do outro, ou como se tu não existisses para além da minha imaginação. Mas na realidade agora sei que és uma segunda personalidade dele, física e psíquica.
— Madeleine... A despeito das más circunstâncias em que aconteceu, foi bom eu ter vindo.
— Foi... e não vou esquecer-me nunca, Willy...
Escrito de acordo com a Antiga Ortografia
Submited by
Prosas :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 1406 reads
other contents of Nuno Lago
Tema | Título | Respuestas | Lecturas | Último envío | Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Amor | MADRIGAL | 0 | 1.430 | 03/07/2013 - 12:15 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | ... outra me sorrirá! | 0 | 984 | 03/07/2013 - 12:05 | Portuguese | |
Poesia/Erótico | CARMINS de ti | 0 | 1.331 | 03/06/2013 - 15:44 | Portuguese | |
Poesia/Poetrix | Viveremos em universos paralelos? | 0 | 887 | 03/06/2013 - 15:37 | Portuguese | |
Poesia/Amor | BEIJOS | 0 | 1.481 | 03/06/2013 - 15:29 | Portuguese | |
Poesia/Erótico | Não é verdade!? | 0 | 1.054 | 03/05/2013 - 17:00 | Portuguese | |
Poesia/Amor | TROVA | 0 | 1.294 | 03/05/2013 - 16:52 | Portuguese | |
Poesia/Dedicada | Balada para o meu amor | 0 | 1.094 | 03/04/2013 - 15:17 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | EPIGRAMA | 0 | 1.264 | 03/04/2013 - 15:01 | Portuguese | |
Poesia/Erótico | HORA DO TIGRE | 0 | 1.068 | 03/04/2013 - 14:48 | Portuguese | |
Poesia/Erótico | TEUS SEIOS… | 0 | 1.055 | 03/03/2013 - 15:29 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | FANTASIANDO | 0 | 1.342 | 03/03/2013 - 15:23 | Portuguese | |
Poesia/Desilusión | Vais perder-me… | 0 | 1.359 | 03/03/2013 - 15:14 | Portuguese | |
Poesia/Dedicada | Jogo marcado… | 0 | 683 | 03/02/2013 - 12:05 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Eu sei! | 0 | 927 | 03/02/2013 - 12:00 | Portuguese | |
Poesia/Poetrix | Me diz!… | 0 | 2.026 | 03/02/2013 - 11:51 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Nos teus olhos | 0 | 1.680 | 03/01/2013 - 17:29 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Para ti... | 0 | 906 | 03/01/2013 - 17:23 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Oceânica | 0 | 912 | 03/01/2013 - 17:07 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Já é madrugada! | 0 | 1.326 | 02/28/2013 - 12:30 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | Fazes de mim um gelado! | 0 | 891 | 02/28/2013 - 12:23 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | Te rogo!... | 0 | 1.112 | 02/28/2013 - 12:15 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Podem acreditar… | 0 | 951 | 02/27/2013 - 17:37 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | Diz que é tudo mentira! | 0 | 696 | 02/27/2013 - 17:31 | Portuguese | |
Poesia/Poetrix | Reflexos… | 0 | 1.224 | 02/27/2013 - 17:26 | Portuguese |
Add comment