Eu sei que foi você - capítulo 17
A notícia de que um oficial de justiça fora à escola pusera a escola em estado de alerta e, depois que ele saiu, a diretora ficou bastante nervosa.
Não demorou a todos ficarem sabendo e começarem a comentar:
-Os pais da Virgínia vão processar a escola.
Michele falou com desdém:
-Alguém mandou a idiota dar um tiro nela mesma?
Cassandra e Marcelo, sentados lado a lado, olharam-se com desconforto.
-Bem, o que vai ser, Cassandra?
-Não sei, Marcelo.
-Temos que dar um jeito no Narciso.
-Vamos pensar em um.
Narciso entrou na sala e, de longe, olhou com raiva para Cassandra e Marcelo.Michele disse a ele:
-Narciso, sabe que os pais da Virgínia vão processar a escola?
-E daí? O que eu tenho com isso?
-Eu penso que é idiotice deles. Foi a filha deles que se matou. Se ela não foi capaz de aguentar umas brincadeiras...
Cassandra se ergueu de sua carteira, foi para perto de Michele e perguntou:
-Você teria aguentado se tivesse sido com você?
-Mas não foi.
-Deixa a Michele, Cassandra. Ela não pensa em ninguém além dela.interveio Marcelo.
-Nossa Marcelo, vai defender sua namorada?
-Eu sei me defender.retrucou Cassandra.
-Olha você, Marcelo - intrometeu-se um colega - deixou os amigos para andar com essa estranha.
Narciso olhou disfarçadamente para Marcelo, desejoso de lhe dar um murro no nariz.
-Estranhos são vocês, que acham que o que foi feito com Virgínia foi brincadeira! Não foi brincadeira, foi nojento! Alguém inventou um monte de mentiras contra a coitada e vocês, sem saber se era verdade ou não, tornaram a vida dela insuportável, perseguindo-a, xingando-a e batendo nela! Eu sei que você, Michele, bateu nela junto com a Angelina!
Michele recuou ante a acusação de Cassandra. Os colegas ficaram a olhar, pasmos. Marcelo segurou Cassandra pelos ombros e Narciso prestou bastante atenção.
-Pensa que eu não sei, sua nojenta? Duas moças seguraram Virgínia para que você e a Angelina pudessem dar tapas na cara dela!
-Sua merdinha!gritou Michele.
-E a coitada vinha todos os dias, perguntando-se até quando aguentaria tanta gente contra ela! Isso foi brincadeira? Muitos de vocês aqui humilharam, perseguiram e maltrataram a Virgínia, rindo da dor dela! Eu tenho nojo de todos vocês, covardes!
-Calma, Cassandra!pediu Marcelo.
-Não, não ficarei calma! Vocês me acham estranha, não acham? Mas eu digo que prefiro ser assim, a ser como qualquer um de vocês, que foram capazes de se divertir à custa do sofrimento que causaram!
A professora de História chegara um pouco atrasada e ficara à porta, escutando. Quando Cassandra terminou, viram que a professora estava ali e se calaram. Cassandra olhou firmemente para a professora, que disse:
-Sentem todos. Cassandra, ouvi o que você falou.
-Tudo?
-Tudo. Quero falar com você depois.
Depois que a aula terminou, a professora disse que queria falar em particular com Cassandra. Marcelo pediu para ficar.
-Está bem. Feche a porta. Não quero que os alunos escutem do lado de fora.
Cassandra sentou. A professora estava muito séria. Perguntou:
-Por que você enfrentou todos daquele jeito, Cassandra? Virgínia era sua amiga?
-Eu nunca falei com ela, professora. Acontece que eu acho que foi uma sujeira o que fizeram com ela.
-Sim, filha, foi uma sujeira enorme. Então, você enfrentou a todos apenas porque sabe que o que fizeram com a pobre menina foi errado?
-Sim, professora.
Sentado numa carteira, Marcelo ouvia, tenso.
-Sabe, Cassandra, hoje em dia, as pessoas não querem se envolver nos problemas dos outros. Cada um pensa apenas em si e isso me entristece. Também me entristece pensar que alguém seja capaz de usar a Internet de forma tão irresponsável, apenas para destruir a vida de uma pessoa. Eu soube o que espalharam na Internet sobre ela e penso que, fosse verdade ou não, ninguém tinha o direito de persegui-la. Agora, a menina está morta e os pais dela vão processar a escola. Espero que isso alerte a todos para evitar que tragédias desse tipo se repitam. Eu me formei acreditando que o papel da escola é formar cidadãos. Mas, se a escola não serve para ensinar respeito ao ser humano, que cidadãos ela está formando?
Cassandra olhou para a professora, séria.
-Eu não sei como tudo isso vai terminar, professora.
-Eu comecei a ter uma certa esperança na juventude ao ver o que você fez, Cassandra. A maioria das pessoas não protesta contra o que está errado.
-Puxa, professora, eu não sei o que dizer.
-Diga sempre o que achar certo, Cassandra. Nunca esqueça disso.
A professora se despediu e saiu. Abrindo a porta, deparou-se com os outros alunos esperando do lado de fora. Cassandra apareceu à porta e Michele a insultou:
-Ganhou, não foi, Cassandra? A professora é desses politicamente corretos, que vivem fazendo discursos sobre lutar por um mundo melhor!
-Fica na sua, Michele - Marcelo veio atrás - Você devia deixar a Cassandra em paz.
-Essa merdinha disse que a Angelina e eu batemos na Virgínia!
-Eu vi vocês fazendo isso!
-Pois diga onde foi que fizemos isso!
Cassandra se aproximou de Michele e falou, olhando-a nos olhos:
-Foi no pátio, pouco antes do começo das aulas. Você, a Angelina e mais duas conversavam e viram que a Virgínia passava. Então, você foi para perto dela e começou a xingá-la! Ela tentou seguir o caminho dela, mas vocês quatro a cercaram, deram rasteiras, riram dela, puxaram o cabelo, empurraram e chamaram de piranha até que ela lhe deu um tapa na cara, Michele! Então, você mandou as outras duas a segurarem e você e a Angelina ficaram batendo nela, rindo e mandando que ela pedisse para vocês pararem de bater!
Angelina empalideceu com a exatidão de Cassandra e Michele se exasperou:
-Como você pode ter visto isso? Não havia mais ninguém no pátio! Estava escondida?
Narciso a interrompeu, sarcástico:
-Michele, como você é burra! Agora, todo mundo sabe! Devia ter disfarçado!
Todos olharam para Michele e Angelina e a primeira, com os olhos brilhantes de raiva, mandou Cassandra aos piores lugares.Marcelo mandou:
-Cala a boca, Michele!
Cassandra, porém, apenas respondeu:
-É só isso que você sabe dizer?
Michele saiu bufando de raiva. Narciso passou por Marcelo e Cassandra e disse em voz baixa:
-Ainda não acabou, Cassandra.
-Por que não resolvemos isso de uma vez, Narciso? Acho que você quer que isso termine, não quer?
-Quero.
-Ah, não vai haver nada - disse Marcelo - Pensa que vou deixar você sozinha com ele?
-Calma, Marcelo. Não vou bater na sua namoradinha. Que tal no pátio, após o fim das aulas? Quero falar em particular com você, Cassandra! Vamos pôr um fim nisso! E, se você não concordar, continuarei fazendo de sua vida um tremendo inferno!
-Você não vai ficar só com ela!
-Bem, o Marcelo pode ficar a uma pequena distância.
-Está certo, ele ficará a uma certa distância, para não ouvir a conversa.
Quando deu o intervalo, Marcelo e Cassandra foram à biblioteca e ele alertou:
-Não confio nele, Cassandra.
-Nem eu. Por isso, vou querer seu celular. Ele tem gravador, não tem?
-Tem.
-Eu vou gravar tudo.
-Tem que tomar cuidado para que ele não perceba.
-Tomarei.
As horas pareceram intermináveis para Cassandra e Marcelo, que não viam a hora das aulas acabarem. Narciso tinha os olhos concentrados nos dois, louco para ter sua conversa definitiva com Cassandra.
A última aula foi a de Biologia, matéria de que Cassandra gostava muito.
-Você gosta de plantas, Cassandra?
-São silenciosas. Eu me sinto em paz perto delas.
Logo que a aula acabou, Cassandra e Marcelo se entreolharam. Discretamente, Marcelo lhe passou o celular.
-Chegou a hora.
Narciso passou por eles, sorrindo maldosamente:
-Estou à sua espera, esquisitinha.saiu.
Marcelo e Cassandra foram andando devagar. Ninguém percebia a tensão em seus espíritos. Marcelo colocou a mão no ombro de Cassandra.
-Nervosa, Cassandra?
-Um pouco.
No pátio, Narciso os esperava. Cassandra pediu a Marcelo:
-Fique aqui. Eu ficarei bem.
Narciso tinha um risinho triunfante.
-Muito bem, Narciso. Estou aqui.
-Tenho que admitir, esquisitinha. Você é bem corajosa.
-Por que não para de me chamar de esquisita?
-Porque é verdade.
-Bem, e se eu passar a chamá-lo de covarde, mentiroso e safado? Já que é verdade, não há problema, há?
-Ora, sua...
-Eu já sei que você me acha uma bostinha. Por que não pula essa parte?
-Você sempre sabe o que vão dizer ou fazer, Cassandra? Por acaso, você lê pensamentos?
-E se eu dissesse que sim? E que foi por isso que...
-Bem, não interessa. Sei que não é possível. Eu nunca soube como você descobriu tudo e sei que não vai dizer. O que interessa é que você sabe que fui eu.
-Sim, foi você que inventou aquelas coisas sobre a Virgínia e espalhou na Internet.disse Cassandra rispidamente.
-Chega! Fui eu, sim! Eu estava com raiva da Virgínia e, por isso, inventei que ela tinha ficado com metade dos rapazes da escola e desconfiava que estava grávida!
-E veja o que houve, não foi?
Narciso baixou a cabeça e falou baixo:
-Eu nunca pensei que as coisas...
-Sairiam de controle? Narciso, o que você esperava? Como algo que começou assim podia acabar bem?
-Tenho pesadelos com isso todas as noites! Mas, como sabemos, não há mais nada que possamos fazer!O melhor é que ninguém saiba!
-Eu não vou expor seu segredo. Quem vai acreditar em mim?
-Você não pode provar que eu fiz isso, Cassandra, mas, se você falar, vão juntar dois mais dois e desconfiar de mim.
-Claro, já que você dava em cima da Virgínia e ela não lhe dava bola, verão que você tinha boas razões, não é?
-Cale a boca, Cassandra! Eu a chamei aqui para negociar. Por que continuar com isso, não é? Eu tenho minha vida para viver e não quero...
Irritou-se com o olhar de Cassandra, que sugeria saber o que ele pretendia dizer e falou:
-Quero que você deixe a escola. Ou você faz isso ou juro que se arrependerá! Vai se arrepender de ter aparecido no meu caminho, bostinha!
-Você quer mandar na minha vida, Narciso?O que direi a meus pais?
-Não me importa!
-Você não pode mandar na vida dos outros, Narciso!
-Você não devia ter se intrometido, Cassandra! Podia ter ficado na sua e não estaríamos assim!
-O que houve com a Virgínia não lhe incomoda?
-O que virá de bom se todo mundo souber o que eu fiz, Cassandra? Todos vão me odiar!
-Acho que não temos mais o que conversar.
Indo para junto de Marcelo, Cassandra fez o sinal de que gravara toda a conversa.
Narciso, no seu lugar, dizia-se:
-Vá embora da minha vida, Cassandra!
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