O "Coxinha", o "Mac-Calango", a Legalidade e a Legitimidade
Primeiramente, quero contar com a paciência do leitor (a) por repetir números que estão sendo amplamente divulgados e que, certamente, já são de seu conhecimento.
Resultado Final da Eleição – TSE
Dilma Rousseff – 54.501.118 votos.
Aécio Neves – 51.041.155 votos.
Abstenções, nulos e brancos - 37.279.085 votos.
Total de Eleitores - 142.821.358
A primeira consideração a ser feita, por evidente, é que ao se somar os votos do candidato derrotado, mais as abstenções e mais os votos nulos ou brancos, chega-se à cifra de 88.320.240 brasileiros (as) que serão governados por quem não elegeram independentemente de quem se sagrou vitorioso.
A Legalidade
E antes que os partidários da Candidata reeleita argumentem que:
1) são considerados apenas os votos válidos;
2) que as regras são essas e que todos sabiam das mesmas;
3) que os descontentes tivessem votado no Candidato derrotado
e mais uma longa série de justos argumentos, direi que lhes dou plena, geral e irrevogável razão. Sua Excelência, Presidenta reeleita Dilma Rousseff, atendeu totalmente às regras do jogo eleitoral e não há qualquer dúvida quanto à legalidade de seu êxito.
Mas, também lhes direi que o que questiono não é a Legalidade da vitória, mas sim a Legitimidade da representação oriunda desse modelo de escolha.
A Legitimidade
Afinal, como considerar legítima uma governança que não foi eleita pela maioria? Como considerar legítimo um processo de escolha que é recusado por trinta e sete milhões de brasileiros? Provavelmente, os mesmos que estiveram nas manifestações de Junho de 2013 e que nessa eleição continuaram a não ter “quem os representasse”.
Como considerar legítimo um processo eleitoral que divide o país, apesar dos desmentidos oficiais, e enseja a separação da população conforme o seu local de nascimento ou de moradia, a sua faixa de renda e até a sua orientação sexual; ensejando, assim, o surgimento dos chamados “Coxinhas”, dos ditos “Mac-Calangos” e doutros estereótipos, tão horrorosos quanto esses.
Como considerar legítimo um processo que ameaça os pequenos avanços éticos que começavam a florescer e que, ao contrário, estimula o ressurgimento daquela visão equivocada de quem vê o Nordeste apenas como um reduto de beneficiários de programas sociais, como o chamado “Bolsa Família”, conforme já se nota nas Redes Sociais. Ou, então, que trata os habitantes do Sul e do Sudeste como “playboys”, “monstros capitalistas”, “exploradores do povo sofrido” etc.
Como, enfim, considerar legítimo um Sistema que parece apoiar-se na máxima de Maquiavel:
“Dividir para governar”.
Acredito que para além das paixões partidárias, todos aqueles dotados de um mínimo de bom senso haverão de concordar que existe a necessidade premente de se mudar a sistemática atual.
A Reforma Política
Prometeu a Senhora Presidenta reeleita fazer uma “Reforma Política”. Medida, que a meu ver, será mais importante que qualquer outra, desde que não se limite a tratar das questões menores e tenha a coragem de enfrentar os tabus que infelicitam a nossa República desde o seu nascimento.
Que haja, sob seus auspícios, uma profunda discussão acerca do Presidencialismo atual, pois como se viu, ele não capaz da promover a necessária legitimidade do Poder conquistado.
Discutir com seriedade, se não é o momento de se instalar o Parlamentarismo – como existente noutras grandes democracias, haja vista a maior facilidade que ele concede ao eleitor de mudar os maus governos e, destarte, influir com mais eficiência sobre a gestão da riqueza que produz e que o Governante eleito gerencia.
Discutir seriamente se já não passou da hora de se consolidar na grade escolar nacional (e não eliminá-los, como ameaça fazer a Senhora Presidenta Eleita) cursos de Filosofia, Sociologia e Política (sem doutrinamento) para que desse modo a população abandone de vez o ranço saudosista pelo “Pai Imperador”, que os mais humildes de intelecto, ainda enxergam na figura do Presidente (a). Que aos alunos, seja ensinado que os Candidatos e Candidatas são apenas indivíduos que disputam um emprego. Indivíduos comuns, que disputam uma vaga no Serviço Público para atuarem como gestores do País por um tempo determinado e não são, definitivamente, “Heróis Libertadores” que haverão de salvar o “povo oprimido” da “ameaça comunista”, da “exploração capitalista” ou das diabruras do Saci Pererê.
Discutir, enfim, outro tipo de Governo que ao se tornar legítimo seja reconhecido universalmente, já que, ai sim, expressará a vontade da maioria efetiva.
Com a palavra, os senhores eruditos que melhor saberão decidir.
A mim, modesto escrevinhador, incapaz de avançar nas minúcias dessas formas de regência, por me faltar instrução e sabedoria, só cabe essa pequena contribuição ao debate. Oxalá, a luz que dele surgir afaste a escuridão que já se mostra tão ameaçadora quanto foi num passado recente.
Fabio Renato Villela
São Paulo, 27 de Outubro de 2014.
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