a Face Burguesa

"Mas a parte que me coube nesse latifúndio* ..."

Foi de tal sorte
que nunca achei seu Norte.
E nem quem se importe,
ou que comigo a dor suporte,
compreendendo que eu não sou forte.

Que junto suporte, a face e a infantilizada teoria
do burgês que me chega à revelia.
Que se enfia em meu dia
ostentando sua gorda cara sadia.

Primeiro aprendi a amar.
Agora, a odiar.
A desprezar essa insolência
de se achar excelência
até onde lhe falta experiência.

Essa arrogância de impor a outros
seus burros conceitos, ocos e poucos.
Essa presença que se oferece
e que me causa asco e espécie;
e que me entristece
ao mostrar que ilusão também desce.

Seria bom se tudo só fosse um pesadelo
e eu voltasse a te querer com desvelo.
Mas o telefone toca de novo. Maldito aparelho!
Por lhe atender, a Morfina
cobra-me sua propina.
( ... tomara que não se tenha quebrado o tornozelo ...)
Gemo a dor
e finjo ouvir a hipocrisia sem cor.

Eu queria conseguir chorar,
mas além de tudo
fui condenado a ser mudo e surdo.
Ou, escutar todo e qualquer absurdo.

Tudo ouço,
mas só anseio
pelo silêncio como galanteio.
(de tudo tão farto, de tudo tão cheio ...)

Será que para viver
terei que mais isso sofrer?
Mas então ...
para quê viver?

* Do Mestre ancho João Cabral de Melo Neto, em "Vida e Morte Severina".

Submited by

Martes, Septiembre 1, 2009 - 21:33

Poesia :

Sin votos aún

fabiovillela

Imagen de fabiovillela
Desconectado
Título: Moderador Poesia
Last seen: Hace 8 años 22 semanas
Integró: 05/07/2009
Posts:
Points: 6158

Comentarios

Imagen de KeilaPatricia

Re: a Face Burguesa

MUTO BOm

:-)

Imagen de MarneDulinski

Re: a Face Burguesa

fabiovillela!

Gostei, sempre é lindo!

Eu queria conseguir chorar,
mas além de tudo
fui condenado a ser mudo e surdo.
Ou, escutar todo e qualquer absurdo.
Marne

Imagen de PedroDuBois

Re: a Face Burguesa

João Cabral é o ícone da poesia enxuta, cerebral e ao mesmo tempo sibilina: áspera pedra não sensibilizada pela ignorância burguesa de todas as horas: como os noticiosos de hoje, puro sangue e ensanguentada maneira de nos fazer apáticos e capadócios. Assim são os poetas na preocupação estética do social. Abraços, Pedro.

Add comment

Inicie sesión para enviar comentarios

other contents of fabiovillela

Tema Título Respuestas Lecturas Último envíoordenar por icono Idioma
Prosas/Otros O "Coxinha", o "Mac-Calango", a Legalidade e a Legitimidade 0 4.270 10/28/2014 - 23:22 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte VIII - A Perseguição Política 0 2.932 10/25/2014 - 20:30 Portuguese
Poesia/General Asas, quem dera 0 2.074 10/24/2014 - 00:33 Portuguese
Prosas/Mistério Rousseau e o Romantismo - Parte VII - A Publicação de "Emílio", de "O Contrato Social", de "La Nouvelle Héloise" e outras 0 12.697 10/23/2014 - 13:56 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte VI - O rompimento com os Enciclopedistas 0 4.459 10/22/2014 - 13:29 Portuguese
Poesia/General Destino 0 2.522 10/16/2014 - 01:05 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte V- Os Enciclopedistas 0 4.929 10/15/2014 - 20:35 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte V - Notas Biográficas, continuação 0 3.790 10/14/2014 - 19:53 Portuguese
Prosas/Otros O FIM da FILOSOFIA e da SOCIOLOGIA no ENSINO MÉDIO 0 4.349 10/13/2014 - 19:23 Portuguese
Poesia/Amor O Voo da Vida 0 2.126 10/10/2014 - 14:22 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte III - Jean Jacques - Notas biográficas 0 5.858 10/09/2014 - 15:04 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte II - Jean Jacques Rousseau - Prefácio 0 1.559 10/08/2014 - 19:20 Portuguese
Prosas/Otros Rousseau e o Romantismo - Parte I - Preâmbulo 0 4.029 10/08/2014 - 00:16 Portuguese
Poesia/Amor Retornos 0 1.774 10/06/2014 - 15:17 Portuguese
Poesia/Tristeza A Mulher e as Fotos 0 2.587 10/03/2014 - 22:04 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte X - Considerações Finais 0 8.750 10/02/2014 - 19:59 Portuguese
Poesia/Dedicada Luz e Sombra 0 3.185 10/01/2014 - 00:19 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte IX - O Antagonismo entre Voltaire e Rousseau 0 3.040 09/29/2014 - 20:43 Portuguese
Poesia/Tristeza Canção de Sarajevo 0 1.867 09/28/2014 - 19:59 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte VIII - O Tempo da Concessão e do Abrandamento 0 4.075 09/27/2014 - 00:27 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte VII - O Tratado sobre a Tolerância 0 5.821 09/25/2014 - 14:41 Portuguese
Poesia/Tristeza Yumi do bordel 0 5.505 09/25/2014 - 13:17 Portuguese
Poesia/Tristeza Dragões 0 3.277 09/23/2014 - 20:17 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte VII - Ecrasez L´infame 0 4.537 09/23/2014 - 20:02 Portuguese
Prosas/Otros Voltaire e o Iluminismo francês - Parte VI - Dicionário Filosófico (a Enciclopédia) 0 2.844 09/22/2014 - 14:18 Portuguese