A Morte do Lidador - Capítulo I
— Pajens! Ou arreiem o meu ginete murzelo; e vós dai-me o meu lorigão de malha de ferro e a minha boa toledana. Senhores cavaleiros, hole contam-se noventa e cinco anos que recebi o batismo, oitenta que visto armas, setenta que sou cavaleiro, e quero celebrar tal dia fazendo entrada por terras da frontaria dos mouros.
Isto dizia na sala de armas do castelo de Beja Gonçalo Mendes da Maia, a quem, pelas muitas batalhas que pelejara e por seu valor indomável, chamavam Lidador. Afonso Henriques, depois do infeliz sucesso de Badajoz, e feitas pazes com el-rei Leão, o nomeara fronteiro da cidade de Beja, de pouco tempo conquistada aos mouros. Os quatro Viegas, filhos do bom velho Egas Moniz, estavam com êle, e outro muiots cavaleiros afamados, entre os quais D. Ligel de Flandres e Mem Moniz - que a festa de vossos anos, Senhor Gonçalo Mendes, será mais de mancebo cavaleiro que de capitão encanecido e prudente. Deu-vos el-rei esta frontaria de Beja para bem a haverdes de guardar, e não sei se arriscado é sair hoje à campanha, que dizem os escutas, chegados ao romper d'alva, que o famose Almoleimar correr por êstes arredores com dez vêzes mais lanças do que tôdas as que estão encostadas nos lanceiros desta sala de armas.
— Voto a Cristo - atalhou o Lidador - que não cria em que o senhor rei me houvesse pôsto nesta tôrre de Beja para estar assentado à lareira da chaminé, como velha dona, a espreitar de quando em quando por uma seteira se cavaleiros mouros vinham correr até a barbacã, para lhes cerrar as portas e ladrar-lhes do cimo da tôrre da menagem, como usam os vilãos. Quem achar que são duros de mais os arneses dos infiéis pode ficar-se aqui.
— Bem dito! Bem dito! - exclamarem, dando grandes risadas, os cavaleiros mancebos.
— Por minha boa espada! - gritou Men Moniz, atirando o guante ferrado às lájeas do pavimento - que mente pela gorja quem disser que eu ficarei aqui, havendo dentro de dez léguas em redor lide com mouros. Senhor Gonçalo Mendes, podeis montar em vosso ginete, e veremos qual das nossas lanças bate primeior em adarga mourisca.
— A cavalo! A cavalo! - gritou outra vez a chusma, com grande alarido.
Dali a pouco, ouvia-se o retumbar dos sapatos de ferro de muitos cavaleiros descendo os degraus de mármore da tôrre de Beja e, passados alguns instantes, soava só o tropear dos cavalos, atravessando a ponte levadiça das fortificações exteriores que davam para a banda da campanha por onde costumava aparecer a mourisma.
*Conto Popular Português de Autor Desconhecido, compilado por Alexandre Herculano
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