GLOSAS LIV

54

A negra furia Ciume.

Morre a luz, abafa os ares
Horrendo, espesso negrume,
Apenas surge do Averno
«A negra fúria Ciume.»

Sobre um solio côr da noute
Jaz dos infernos o nume,
E a seus pés tragando brazas
«A negra furia Ciume.»

Crespas viboras pentêa,
Dos olhos dardeja lume,
Respira veneno, e peste
«A negra furia Ciume.»

Arrancando á Morte a fouce
De buido, hervado gume,
Vem retalhar corações
«A negra furia Ciume.»

Ao cruel socio de Amor
Escapar ninguem presume,
Porque a tudo as garras lança
«A negra furia Ciume.»

Todos os males do inferno
Em si guarda, em si resume
O mais horrivel dos monstros,
«A negra furia Ciume.»

Amor inda é mais suave
Que das rosas o perfume,
Mas envenena-lhe as graças
«A negra furia Ciume.»

Nas azas de Amor voâmos
Do prazer ao aureo cume,
Porém de lá nos arroja
«A negra furia Ciume.»

Do ferreo calix da morte
Próva o funesto azedume
Aquelle a quem ferve n'alma
«A negra furia Ciume.»

Do escuro seio dos fados
Saltam males em cardume:
O peor é o que eu soffro,
«A negra furia Ciume.»

Dos immutaveis destinos
Se lê no idoso volume
Quantos estragos tem feito
«A negra furia Ciume.

Amor inda brilha menos
Do que subtil vagalume,
Por entre as sombras, que espalha
«A negra furia. Ciume.»

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Lunes, Octubre 5, 2009 - 21:18

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