O fim dos tempos

O fim dos tempos
 -Fazem-me faltas as mutações de palavras montadas em esconsos alicerces dominando Babel, de tudo, o pouco que li não entendi nada, talvez porque não fosse eu suficientemente intenso e apaixonado no íntimo, mas a leitura que fiz foi de único sentido e transverso, entrou mas não saiu potente no papel, (escrito algo ambíguo que não me era destinado), e que ordinário envelope sem remetente encontrou em mim! -Sem a fórmula alquímica equivalente ao ácido realístico.
  Fazia-me falta a inacção mansa, inesperada e o balanço harmónico no silêncio suspenso para não me encontrar em cada frase pronunciada e em cada crepúsculo, contorcido de desconfiança da rua deserta e medo da alienação e de todo o vivo quarteirão da vila, do arrojo e da vulgar opinião e depois ter de falar por falar do insucesso, do parentesco que cultivo com ele e com o meu umbigo despropositado, também da saudade do nada (dizem sempre vem repetida em porções ou e em bruto), á toa quando se grita em tom mudo ou falar da sonora chuva que não cai porque se esqueceu onde morava a poeira.
      Fazem-me falta a erupção e o abismo Estremo … abrupto e que antecede o estrondo da queda de um anjo no inferno, presto homenagem ao aborrecimento, ao esquecimento e á erudição, pela falta de esperança que encontro na extinção de facto.
  Faltando-me a limitada coragem pouco mais me acompanha na queda, talvez na atenção que dispenso á paisagem eu veja um desejo evoluindo discreto dessa viagem pouco concreta, admito fazer algumas confidências mesmo quando estas deixam de ser confidenciais se e quando ficarem vazias as portas da curiosidade autêntica, mesmo assim sei que o desafio de sentir é uma alucinação endomorfica de que não prescindo mas não significa nada porque não espero ser diferente do vazio penhasco que apesar de previsto, não enfrento (eterno conflito), vivo da mentira e do desconforto, não me convidem para o programa de desintoxicação da impotência virtual porque o que quero é viver pendurado nesta alma ingénua e embalsamada, posso não albergar grandes pensamentos ou aptidões mas modero as explicações para o mistério da alma cotada e reporto-me em estratégias consumadas.
  Sou sério candidato à fraude e ao roubo (como governador de um castelo extra-sensorial) reconheço-me ainda mais corrupto do que me julgava inicialmente quando ainda habitava em paz comigo, agora a capacidade de me debater esfuma-se e navego á bolina, ao sabor do temporal.
  Não posso cultivar mais a indignação pois corro o risco de ser barbaramente derrotado por ela em conflito bélico e directo (homem a homem), espancado até á morte. Administrei mal a minha cota parte de senso comum e resultou no desastre que se conhece, me travisto infinitamente de poeta mas não avisto nada de novo na estrada em que um cantoneiro ainda insiste em volver a terra da berma, cada dia que passo por ela envelheço um pouco e na berma crescem ervas, flores amarelas e um rastilho do odor bucólico, ele me devolve o sentido prático de convívio e com o despropósito de andar por esta estrada despido, tenho saudades da estrada, atalho do insignificado.
  Possuo uma dificuldade inerente aos cegos ocasionais de me deslocar entre as árvores e os obedientes servos e pasmo quando vejo contorcionistas e equilibristas revirarem latas de lixo abocanhando os restos da utopia que a história nega.
 Não uso outra roupa senão a emoção e quando estou nu, espontaneamente a minha mente embriaga-se de liberdade, depois miro-me no espelho mas a roupagem não me serve quando a envergo e não tenho outra para me vestir, desfaz-se o preconceito e a viela minha paralela espelha a angústia, numa aflição auto-infligida como quando pondero no que sentiria se me abandonassem numa lua sem o reflexo na fachada.
 A ligação amorosa com a personagem plenitude estende-se até pr'além do entendimento e da paixão. Tomara que alguma coragem tenha de renunciar a esta sensibilidade instável, quiçá insuportável e egoísta de me auto criticar.
   Opúsculo sinistro é o manifesto de saudade no futuro invicto, faziam-me jeito os sortilégios cabalísticos das sílabas que não entendo para que me afoitasse no luar depois do fim dos tempos.


Fazem-me falta as palavras
Que não entendo,
Para escrever cartas
Sem remetente,
Faz-me falta a inacção,
Para não me encontrar em cada esquina,
De rua e quarteirão
E não ter de falar,
Da saudade que dizem sempre vem
Ou da chuva que não cai porque se esqueceu,
Faz-me falta o abismo
Estremo.

Joel-Matos (12/2010)
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Jueves, Diciembre 16, 2010 - 21:45

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