O campo da alma
Figos maduros secam no parapeito da janela.
Ainda me lembro dos pingos de mel dos teus olhos
quando brilhavam mesmo nos dias frios de Inverno.
Os picapaus namoravam no interior de uma árvore
plantada há mais de um século por um pastor
que procurava no doce dos frutos suculentos
um antídoto para a amargura que o assolava
nos dias em que palmilhava terrenos selvagens
sem que pudesse ouvir a bela voz de uma qualquer flor.
O campo da alma onde o perfume se despia
para tomar banhos no riacho que atravessava os montes
encontrava nas roupas gastas pelo tempo
um aliado que o ajudasse a furar as sombras da pele
e a descobrir um novo cântico para remendar a nostalgia.
Já não há figos no parapeito da janela...
Ainda me lembro das casas feitas de granito ou de xisto
acolherem o teu sorriso quando eu já não estava.
As nuvens cinzentas chocavam umas como as outras;
um escárnio ensurdecedor povoava os tímpanos,
enlouquecia a escrita a tinta da china de cor preta,
escondia no núcleo do teu ego contagiante
o carisma com que enlaçavas os poemas que te escrevia.
A planície mudou de cor, transformou-se em pálida seara
que centrifuga as minhas células com lâminas afiadas.
O pó dos caminhos fustiga-me os olhos feridos
pelos solavancos de azeitonas verdes e amargas
que ainda permanecem na oliveira antiga já esquecida.
Agora já não quero pensar no passado e tu surgiste.
Há um vazio profundo que se acerca de mim sorrateiramente
e quando dou por mim já não suporto a dor que ele me causa.
Depois penso como a tua presença no meu coração
me faz crescer uma esperança avassaladora e alegre
de poder voltar a sentir-me vivo e respirar tranquilamente
rumo à felicidade que sempre me escapou entre os dedos.
O campo da alma tem um horizonte sem fim,
dois belíssimos rasgos paralelos de imagens
que me observam através da distância que nos separa
unidas apenas pelo brilho das estrelas fascinantes...
Mas eu não posso gostar de ti
porque se tudo for uma ilusão que me desiluda
sei que tudo em mim será poente definitivo.
rainbowsky
Submited by
Poesia :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 4053 reads
Add comment
other contents of rainbowsky
Tema | Título | Respuestas | Lecturas | Último envío | Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
Ministério da Poesia/Fantasía | Diálogo transparente | 0 | 916 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Meditación | Escreves ou não? | 0 | 2.031 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Intervención | Esperanças | 0 | 1.417 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Amor | Estrela | 0 | 2.620 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Meditación | Farol identidade | 0 | 1.556 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Desilusión | Feitiço | 0 | 1.614 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Pasión | Gelo violeta | 0 | 1.641 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Ministério da Poesia/Amor | Há tanta luz | 0 | 1.765 | 11/19/2010 - 18:27 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Medo | 3 | 870 | 09/21/2010 - 05:54 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Desassossego | 3 | 1.890 | 09/16/2010 - 21:06 | Portuguese | |
Poesia/General | Expresso descafeinado | 2 | 1.404 | 09/16/2010 - 20:38 | Portuguese | |
Poesia/Tristeza | Não pedi à caneta | 4 | 993 | 09/11/2010 - 00:33 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | A estrada íngreme | 1 | 997 | 09/01/2010 - 00:43 | Portuguese | |
Poesia/Amor | TU FAZES-ME DELIRAR... | 4 | 1.285 | 08/29/2010 - 20:11 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Ponto de luz | 2 | 644 | 08/23/2010 - 16:05 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Guerra e uma pequena flor | 1 | 1.042 | 08/15/2010 - 23:32 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Guerra e uma pequena esperança | 1 | 715 | 08/15/2010 - 20:06 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Homem de negro em arame branco | 3 | 771 | 08/14/2010 - 17:58 | Portuguese | |
Poesia/General | Caixa de correio | 5 | 882 | 08/14/2010 - 13:17 | Portuguese | |
Poesia/Tristeza | Mata-me o gelo no teu copo | 1 | 668 | 08/10/2010 - 16:35 | Portuguese | |
Poesia/Tristeza | Silencio-me nas tuas mãos... | 3 | 611 | 08/10/2010 - 00:01 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Neste planeta... | 2 | 768 | 08/05/2010 - 00:17 | Portuguese | |
Poesia/Tristeza | Viver às escuras | 3 | 640 | 08/04/2010 - 01:17 | Portuguese | |
Poesia/Desilusión | A visita do carteiro | 3 | 1.212 | 08/03/2010 - 22:57 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Languescente terminação | 2 | 1.347 | 08/03/2010 - 17:53 | Portuguese |
Comentarios
"Agora já não quero pensar no
"Agora já não quero pensar no passado e tu surgiste.
…
Mas eu não posso gostar de ti
porque se tudo for uma ilusão que me desiluda
sei que tudo em mim será poente definitivo."
Há imagens que se levantam e permanecem. Há momentos que se prolongam no tempo e há sempre a magia das tuas palavras.
Abraço
O campo da alma
Belo, imagético, profundo pela diversidade de estados de alma, por vezes expressos em belas antíteses...
Poesia...
:)
Se me permites, o passado já
Se me permites, o passado já lá foi, e os figos decerto, que já apodreceram no parapeito, avança e continua, pois és alma que pela dor inflingida, cresce mais bela que o ferimento côncavo desse amor perdido. Excelente.
O campo da alma
Lindo poema, gostei muito, meus parabéns!
Destaco essa linda estrofe:
Há um vazio profundo que se acerca de mim sorrateiramente
e quando dou por mim já não suporto a dor que ele me causa.
Depois penso como a tua presença no meu coração
me faz crescer uma esperança avassaladora e alegre
de poder voltar a sentir-me vivo e respirar tranquilamente
rumo à felicidade que sempre me escapou entre os dedos.
Nosso abraço,
Marne