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Uma tragédia monumental

De que forma a dor pode nos transformar, marcando não somente nossas vidas mas de todos que estão ao nosso lado e repercutindo nas existências dos que vêm depois de nós? Esta é a pergunta que permeia todo o percurso de As doze tribos de Hattie, romance de estreia de Ayana Mathis, publicado em 2013, que narra, em três gerações, uma tragédia monumental que começa no ano de 1923 e vai até 1980. 
O título do livro, As doze tribos de Hattie, é uma referência às doze tribos de Israel. Estas doze "tribos" são seus descendentes, que espalhados pelo mundo, tentam encontrar seu lugar e alcançar a felicidade, ainda que sigam caminhos tortuosos e, em vez da tão almejada bem-aventurança, acabem encontrando sofrimento. 
Hattie Shepherd nos é inicialmente apresentada como uma jovem esperançosa, que acredita que construirá uma vida feliz. Casada com August, ela é, aos dezessete anos, mãe de um lindo casal de gêmeos, a quem batiza com os nomes de Filadélfia e Jubileu. Inexperiente, ela não está preparada para os duros golpes que logo receberá da vida, pois logo acredita que deixou o tempo de sofrimento para trás há dois anos, ao se mudar, com a mãe e as duas irmãs, do Estado sulista e racista da Geórgia, para a Filadélfia, no norte dos Estados Unidos.
É comovente e encantador como Hattie, com apenas quinze anos, se sente maravilhada ao ver uma realidade totalmente diferente da sua Geórgia natal, marcada pela perseguição violenta aos negros, tendo seu pai sido assassinado. 
Deslumbrada, Hattie acredita que encontrou sua Terra Prometida. Porém, ela logo sofrerá um revés cruel da vida. Com apenas dezessete anos, quase uma criança, pobre, ela vê seus amados bebês adoecerem de pneumonia e luta, impotente, para salvá-los, vendo-os morrer em seus braços.
A morte dos gêmeos atinge Hattie de forma indelével, marcando-a para o resto da vida e determinando a maneira como ela se relacionará com os outros nove filhos que conceberá e também com a neta que se verá encarregada de cuidar devido à doença mental de uma filha.
Se ela não perdeu a capacidade de amar, perdeu a de demonstrar amor, não apenas devido à perda dolorosa que deixou um vazio profundo em sua alma, mas também devido às decepções com o marido, um bêbado, mulherengo e incapaz de proporcionar uma vida decente à família e às limitações impostas pela pobreza extrema, que a obrigarão a lutar com todas as suas forças para alimentar e vestir os filhos.
O livro é narrado de forma fragmentada, mostrando o destino de cada um dos seus descendentes que sobreviveu: Floyd, Six, Alice e outros. Seus filhos só conseguem lembrar dela como a matriarca rígida e implacável, que administrava a casa com eficiência a lutava pela sobrevivência de todos, mas era incapaz de dar afeto. Mesmo depois de crescidos, eles ainda são como crianças perdidas e necessitadas do amor materno que ela não soube conceder. O que eles não entendem é que Hattie, após perder seus gêmeos, percebeu que o mundo não ama ninguém e quis que seus outros filhos se preparassem para sobreviver e enfrentar uma realidade hostil. 
Infelizmente, Hattie verá que sua maneira de criar os filhos não os preparou melhor para a vida. Eles tomarão rumos errados e tropeçarão, sentindo-se perdidos e desorientados. E todos se ressentirão da dureza com que foram criados, lembrando de uma mãe severa e de um pai incapaz de sustentá-los dignamente.
Embora o livro não tenha, a rigor, um personagem principal, já que aborda os diferentes destinos dos dos descendentes de Hattie, vê-se que ela é o elo de ligação entre cada um dos personagens. Sua rigidez e força são presenças dominantes em todos os capítulos, do primeiro ao último.
À medida que vai envelhecendo e vendo as trajetórias seguidas por seus descendentes, Hattie se lamenta e reconhece que não foi capaz de preencher muitas de suas necessidades. Entretanto, ela está muito velha para mudar, muito endurecida pelas lutas que sempre precisou travar. E, ao se ver tão repentinamente obrigada a cuidar da neta Sala (sua décima segunda tribo) sente-se tão despreparada como quando se sentia aos dezessete anos, enquanto assistia à agonia dos gêmeos. Neste momento tão crucial, pergunta-se se conseguirá fazer pela neta o que não pôde fazer pelos filhos.
Narrado numa prosa envolvente e não-linear, As doze tribos de Hattie aborda, de maneira crua e sofrida, como a dor nos marca de forma permanente, a busca incessante do ser humano pela felicidade, os conflitos de gerações, como as incompreensões mútuas são capazes de romper os frágeis laços das relações humanas e a necessidade inquestionável de ser amado.

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sábado, setembro 3, 2016 - 11:48

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