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A Morte do Lidador - Capítulo IX

Se já vivestes vida de combates em cidade sitiada, tereis visto muitas vêzes um vulto negro que em linha diagonal corta os ares, sussurrando e gemendo. Rápido, como um pensamento criminoso em alma honesta, êle chegou das nuvens à terra, antes que vos lembrásseis do seu nome. Se encontrou na passagem ângulo de tôrre secular, o mármore converte-se em pó; se atravessou, pelas ramas de árvore basta e frondosa, a fôlha mais virente e frágil, o raminho mais tenro é dividido, como se, com cutelo sutilíssimo, mão de homem lhe houvera cerceado atentamente uma parte; e, todavia, não é um ferro açacalado: é um globo de ferro; é a bomba, que passa, como a maldição de Deus. Depois, debaixo dela, o chão achata-se e a terra espadana aos ares; e, como agitada, despedaçada por cem mil demônios, aquela máquina do inferno estoura, e de roda dela há um zumbir sinistro: são mil fragmentos; são mil mortes que se derramam ao longe. Então faz-se um grande silêncio vêem-se corpos destroncados, poças de sangue, arcabuzes quebrados, e ouvem-se o gemer dos feridos e o estertor dos moribundos.

Tal desceu o montante do Espadeiro, rôto dos milhares de golpes que o cavaleiro tinha descarregado. O elmo de Ali-Abu-Hassan faiscou, voando em pedaços pelos ares, e o ferro cristão esmigalhou o crânio do infiel, abriu-o até os dentes. Ali-Abu-Hassan caiu.

— Lidador! Lidador! - disse Lourenço Viegas, com voz comprimida. As lágrimas misturavam-se-lhe nas faces com o suor, com o pó e com o sangue do agareno, de que ficou coberto. Não pôde dizer mais nada.

Tão espantoso golpe aterrou os mouros. Os portuguêses seriam já apenas sessenta, entre cavaleiros e homens d'armas: mas pelejavam como desesperados e resolvidos a morrer. Mais de mil inimigos juncavam o campo, de envôlta com os cristãos. A morte de Ali-Abu-Hassan foi o sinal da fugida.

Os portuguêses, senhores do campo, celebravam com prantos a vitória. Poucos havia que não estivessem feridos; nenhum que não tivesse as armas falsadas e rôtas. O Lidador e os demais cavaleiros de grande conta que naquela jornada tinham acabado, atravessados em cima dos ginetes, foram conduzidos a Beja. Após aquêle tristíssimo préstito, iam os cavaleiros a passo lento, e um sacerdote templário, que fôra na cavalgada com a espada cheia de sangue metida na bainha, salmodeava em voz baixa aquelas palavras do livro da Sabedoria:

"Justorum autem animae in manu Dei sunt, et non tangent illos tormentum mortis".

*Conto Popular Português de Autor Desconhecido, compilado por Alexandre Herculano

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sábado, abril 11, 2009 - 19:45

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