CONCURSOS:

Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia?  Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.

 

Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo II :A eterna história da utopia

Era uma prodigiosa novidade o aparecimento de um navio a vapor nas águas da Mancha em 1822 ... Toda a costa normanda esteve por muito tempo assombrada. Hoje dez ou doze vapores cruzam-se em sentido inverso no horizonte do mar, sem atrair os olhos de ninguém. Quando muito, algum observador especialista distingue, pela cor da fumaça, se o carvão que consome o navio é de Gales ou de Newcastle. Passam; é quanto basta. Se partem: Boa viagem!; se chegam: Welcome!

Não era tão grande a calma a respeito de tais invenções no primeiro quarto do nosso século, e estas máquinas fumegantes eram particularmente suspeitas entre os insulares da Mancha. Neste arquipélago puritano onde a rainha da Inglaterra foi censurada por violar a Bíblia narcotizando-se para dar à luz, o navio a vapor teve como primeiro cumprimento o ser batizado com este nome: Devil Boat — Navio-Diabo.

A esses bons pescadores de então, outrora católicos, agora calvinistas, e sempre beatos, pareceu-lhes aquilo o inferno flutuante.

Um pregador da terra tratou da questão: Temos nós o direito de fazer trabalhar juntos o fogo e a água que Deus separou? Aquele animal de ferro e fogo não era a imagem de Leviatã?

Não era isso refazer o homem, a seu modo, o primitivo caos? Não é a primeira vez que acontece qualificar a ascensão do progresso de retrogradação ao caos.

Idéia louca, erro grosseiro, absurdo: tal foi o veredicto da Academia das Ciências consultada por Napoleão no começo deste século, acerca do vapor. Os pescadores de Saint-Sampson tem desculpa, em matéria científica, ao nível dos geômetras de Paris; e, em matéria religiosa, uma pequena ilha como Guernesey não tem obrigação de ser mais ilustrada que um grande continente como a América. Em 1807, quando o primeiro navio de Fulton, patrocinado por Livingston, provido da máquina de Watt mandada da Inglaterra, e tripulado, além da equipagem, por dois francêses, somente, André Michaux e outro, fez a sua primeira viagem de Nova York a Albany, deu-se o caso de acontecer isso no dia 17 de agosto. Esta coincidência deu origem a que o metodismo tomasse a palavra, e em todas as capelas os pregadores amaldiçoaram a máquina, declarando que o número dezessete era o total das dez antenas e das sete cabeças da besta do Apocalipse. Na América invocava-se contra o vapor a besta do Apocalipse; na Europa a besta do Gênesis. Nisto consistia toda a diferença.

Os sábios haviam rejeitado o vapor como impossível; os padres, a seu turno, rejeitavam-no como ímpio. Fulton era uma variante de Lúcifer. Os habitantes simplórios das costas e dos campos aderiam à reprovação pelo incomodo que lhes causava a novidade. Na presença do vapor, o ponto de vista religioso era este: a água e o fogo são um divórcio. Este divórcio é ordenado por Deus. Não se deve desunir o que Deus uniu, nem unir o que ele desuniu. O ponto de vista do camponês era: isto mete-me medo.

Para cometer, naquela época remota, a empresa de uma navegação a vapor entre Guernesey e Saint-Malo, nada menos era preciso que um homem como Mess Lethierry. Só ele podia concebe-la na qualidade de livre pensador, e realizá-la na qualidade de marinheiro atrevido. O seu eu francês concebeu a idéia; o seu eu inglês executou-a.

Em que ocasião? Digamo-lo.

Submited by

domingo, maio 24, 2009 - 15:08

Poesia Consagrada :

No votes yet

VictorHugo

imagem de VictorHugo
Offline
Título: Membro
Última vez online: há 13 anos 19 semanas
Membro desde: 12/29/2008
Conteúdos:
Pontos: 159

Add comment

Se logue para poder enviar comentários

other contents of VictorHugo

Tópico Título Respostasícone de ordenação Views Last Post Língua
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Apresentação 0 380 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Dedicatória 0 320 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo I 0 292 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo II : O tutu da rua 0 370 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo III : Para tua mulher, quando te casares 0 289 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo IV : Impopularidade 0 299 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo V : Outros pontos ambíguos de Gilliatt 0 307 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo VI : A pança 0 411 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo VII : Casa embruxada, morador visionário 0 844 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Primeiro: Elementos de uma má reputação - Capítulo VIII : A cadeira Gild-Holm-Ur 0 310 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Segundo : Mess Lethierry - Capítulo I : Vida agitada e consciência tranqüila 0 357 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Segundo : Mess Lethierry - Capítulo II : Uma preferência de Mess Lethierry 0 290 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Segundo : Mess Lethierry - Capítulo III : A velha língua do mar 0 295 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Segundo : Mess Lethierry - Capítulo IV : Vulnerabilidade por amor 0 344 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo I : Garrulice e Eflúvios 0 284 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo II :A eterna história da utopia 0 316 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo III : Rantaine 0 287 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo IV : Continuação da história da utopia 0 324 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo V : O navio-diabo 0 291 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo VI : Lethierry entra na glória 0 778 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo VII : O mesmo padrinho e a mesma padroeira 0 721 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo VIII : A melodia Bonny Dundee 0 674 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo IX : O homem que advinhou quem era Rantaine 0 738 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo X : Narrativas de viagens de longo curso 0 639 11/19/2010 - 15:54 Português
Poesia Consagrada/Conto Victor Hugo: Os trabalhadores do Mar – Primeira Parte: O Senhor Clubin : Livro Terceiro:Durande e Déruchette - Capítulo XI : Lance de olhos aos maridos eventuais 0 791 11/19/2010 - 15:54 Português