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DEIXAI-ME CHORAR, DEIXAI-ME SER NATAL
Deixai-me chorar, deixai-me ser Natal.
Deixai que cada lágrima caia vertida
desde o meu âmago até ao chão de sofrimento
que sozinho piso.
Que minhas lágrimas
não caiam amparadas pelo vosso ombro,
pois o meu desespero são toneladas de sombra
que vos esmagaria qualquer credo
onde vos escondeis até ao pó.
Deixai que cada lágrima
escorra sem que seja importunada
por esperanças que apenas a vossa pena contém.
Afastai-vos,
deixai passar o meu choro
pelas ruelas das vossas emoções.
Que se abram alas nas valas da noite
para que o meu choro carregue a sua cruz
de insónias até ao fim do calvário do meu desabafo.
Deixai que o meu fôlego
se esgote no grito que só a mim pertence,
que só em mim está ao alcance de um soluço
onde tudo acabe.
Grite comigo quem quiser
mas que o ouça em mim não mais que um silêncio.
Deixai que o silêncio me conforte a alma,
fazei de conta que estou morto.
Que o vosso silêncio
não seja mais do que uma lembrança,
tentai ser criança quando me prometerdes sorrir.
Saiam, quero estar só,
aquecer-me do meu frio e sair de mim.
Não me procureis em mim,
vou ausentar-me pelo meu pensamento,
desaparecer no meu sentimento de Natal.
Vou caminhar pelos caminhos
que o meu olhar asfalta.
Que ninguém ouse perseguir-me,
vou demasiado apressado rumo a nenhures.
Nenhures é sítio só meu,
onde o céu são palavras ainda por escrever.
Não me amordaceis a boca
com as vossas tristezas,
guardai o estender das vossas mãos na vossa cara.
Não vos quero ver
porque não me quero ver no vosso olhar,
não me ateis os olhos ao vosso escuro
quando não me entendeis.
Ide, mas deixai-me
onde me encontrastes se me encontrastes.
Se quereis ser Natal, deixai-me chorar também.
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