CONCURSOS:

Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia?  Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.

 

Arrábida

Bem cá em cima, encostado num banco de cimento mal feito, muito peculiar, absorvo na degustação de um copo de vinho, uma aragem de Verão encorpada e leve que me eleva os sentidos na imagem que recebo, à meia-luz de um Sol que se afastou.
Sei que é branco, gizado em U saliente para fora à moda de quinhentos, e engalanado na guarda de uma vegetação mediterrânica, que mal distingo, mas que lembro o seu maravilhoso verde hirsuto de azeitona.
A garrafa, erecta, e já entornada no laço do seu gargalo, faz-me companhia. Está morno na boca, na saliva; quente na pele contra o semblante do fumo do cigarro. Deixo-me ir, desistente. No copo ainda preso na vontade dos lábios, reviro o olhar para o abismo, e lá no fundo, movem-se no mar sereno aguarelas espelhadas do céu quase nocturno em tonalidades símias de cio. Soltam-se-me as inibições do rigor da celebração que ali ao lado decorre, entre a camisa desbragada nas calças; a gravata alarga-se na camisa aberta ao peito, desajeitada. Oh, como me gosto assim desimpedido: louco.
O vento dança, travesso, e como eu gira a mulher que se debruça sobre o promontório bem junto ao muro velho, levantando subtilmente a saia de um vestido que também sei ser branco, adornado de sombras abstractas de flores delineadas a preto forte, em linhas muito simples e finas. Vacila no meu olhar, fixamente, teimosamente, como um cendal sem pressa.
O assombro da natureza multiplica-se no meu mugir de boi, com essa mulher que se entrega para trás nos seus cabelos muito compridos, quando a brisa a sobe e penetra num gemido mudo, encolhendo-se, e só a minha mão fechada, agora chegada sobre o casaco atirado ao lado, sente a força desse som de ilusões. Os olhos estão fechados. Pressinto-os. E os meus, agora com mais brutalidade, percorrem-na nos pés nus cruelmente doces no osso elegantemente desenhado, onde estes se estendem numa vertigem contínua de sopros de carne firme sem fim, curvando as pequenas saliências bem pronunciadas em belos vales torneados que desaguam na bacia oculta, como se fosse a de Petra, mas, já sem o perdão da imaginação do que para lá existe desse monte húmido entre fendas.

Submited by

segunda-feira, agosto 9, 2010 - 17:25

Prosas :

No votes yet

Jorgelupus

imagem de Jorgelupus
Offline
Título: Membro
Última vez online: há 12 anos 2 semanas
Membro desde: 03/20/2010
Conteúdos:
Pontos: 173

Add comment

Se logue para poder enviar comentários

other contents of Jorgelupus

Tópico Título Respostas Views Last Postícone de ordenação Língua
Poesia/Tristeza O abraço 3 205 03/27/2010 - 22:39 Português
Poesia/Tristeza Vale das Sombras 3 180 03/28/2010 - 15:30 Português
Poesia/Tristeza Respiro inerte 2 242 03/28/2010 - 18:12 Português
Poesia/Tristeza Eterna despedida 1 218 03/29/2010 - 17:51 Português
Poesia/Tristeza Luz escura 1 224 03/30/2010 - 17:21 Português
Poesia/Tristeza O Portão 2 202 04/01/2010 - 18:20 Português
Poesia/Tristeza Tríptico 1 221 04/01/2010 - 19:14 Português
Poesia/Tristeza Pedras Vivas 1 432 04/05/2010 - 18:55 Português
Poesia/Tristeza A cegueira do crocodilo 2 300 04/06/2010 - 17:32 Português
Poesia/Tristeza Sombras moribundas 2 208 04/06/2010 - 17:46 Português
Poesia/Tristeza Actor de ti mesmo 2 260 04/12/2010 - 21:55 Português
Poesia/Tristeza Vómitos de veneno 1 193 04/14/2010 - 22:20 Português
Poesia/Tristeza Alma em Terra 2 261 04/22/2010 - 23:13 Português
Poesia/Tristeza Crença cega 2 414 04/23/2010 - 16:58 Português
Poesia/Tristeza O Sopro do Cadáver Sentado 2 541 04/25/2010 - 20:57 Português
Prosas/Lembranças O Porto é assim 1 299 05/10/2010 - 20:32 Português
Prosas/Tristeza A fé 1 371 05/30/2010 - 04:11 Português
Prosas/Tristeza Portugal era um império... 1 629 06/12/2010 - 21:30 Português
Poesia/Tristeza Vale das Sombras 0 571 11/18/2010 - 15:55 Português
Poesia/Tristeza Árvores suspensas 0 662 11/18/2010 - 16:01 Português
Poesia/Tristeza Árvore sentida 0 551 11/18/2010 - 16:02 Português
Prosas/Pensamentos O monstro 0 658 11/19/2010 - 00:03 Português
Prosas/Saudade mágoa 0 627 11/19/2010 - 00:05 Português
Prosas/Tristeza síndrome 0 612 11/19/2010 - 00:05 Português
Prosas/Mistério Arrábida 0 662 11/19/2010 - 00:08 Português