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Batem à Porta

    Um pequeno conto que escrevi à uns 5 ou 6 anos...

    Batem à porta.
    - Estas paredes sufocam-me querida, se não fosse por ti já tinha abandonado isto tudo,
impressionante como ainda consigo sentir o teu perfume, por debaixo deste sufoco, a que o mofo
me fez acostumar.
    Diz o homem,
    Sentado numa cadeira de verga, que acompanhava a desolação existente naquele quarto, naquele
espaço que por mentes menos ambiciosas, poderia ser chamado de habitação. Uma desolação
mórbida onde a cor parecia fugir ao longo dos tempos, um ar doente que parecia ser possível de se
inalar, a cada inspiração sem se conseguir evitar esse facto, tudo ali parecia ser doentio. O presságio
da própria morte presente, austera na sua realidade.
    Batem à porta,
A ressonância do som é intacta, abafada pelas barreiras, cobertas de papel de parede crestado, pela
humidade e pela velhice que apodrecia dia após dia sem qualquer interregno convalescente.

    - Quem é?
    Interroga o ambulante sentado,
    Sustentando a interrogação na sua voz roca, que tenta sufocá-lo a cada palavra proferida.

    - Correio!
    Ouve-se do outro lado,
    O homem levanta-se dirigindo o olhar para um retrato suspenso meio de lado, por um prego, que
parecia querer saltar daquelas paredes e refugiar-se no lugar mais escondido que existi-se à face da
terra. O retrato, o maior contraste que poderia existir naquelas paredes, uma mulher de longos
cabelos pretos, e possuidora de uns singulares olhos azuis, em que a beleza destoava e onde apenas
a sua expressão melancólica se fundia com o espaço que a circundava. Ao dirigir-se à porta o retrato
segue o homem com os seus olhos acentuados, cor de pérola. A porta é aberta. O olhar é revoltante,
indignado.

- Correio senhor, correio!
    Responde quem se apresentava à porta do quarto desolado,
O homem estica o pescoço para fora da entrada e olha para os lados do corredor, com o escuro,
pareciam tornar-se infinitos de uma ponta para à outra, o fim parecia ser impensável naquelas
extremidades, uma miragem, que poderia apenas surgir na imaginação, ou então nas pequenas
tentativas que a luz ao lado direito arriscava, para se manter acesa em curtos espaços de tempo,
enquanto a noite perdurava. Numa dessas tentativas vê-se o brilho de sangue sobre o artefacto que o
carteiro carrega, uma mensagem ensanguentada, segurada por uma pequena mão que tenta esquivarse ao sangue, ainda fresco mantendo-se naquele pedaço.
    - Mais uma carta ensanguentada? É tudo o que tens para mim?
    Pergunta o homem ao carteiro,
    Um carteiro anão. Uma cicatriz irregular surgia-lhe do cabelo até meio da face esquerda, apenas
interrompida pela pala que tapava os estragos que tinham sido causados na sua vista, o rosto era
sujo e mal ajeitado. Também aquela cara, tinha estado já ensanguentada, algo comum para quemhabitava naquela metrópole, quase uma marca de registo, todos teriam já estados cobertos de
sangue, nem que parcialmente, nem que o sangue não fosse o seu.
    Um carteiro anão que teria já presenciado o que poucos poderiam presenciar duas vezes, o
despejador de mensagens, o albergue da tragédia, o pequeno ser que carrega os grandes fardos e que
com eles vive, e com eles falecerá um dia.
    - Desculpe senhor, a minha única função é entregar mensagens. Mas também é um fardo muito
pesado para mim, cartas de sangue chamam muito à atenção às criaturas da noite, o cheiro custa
demasiado a sair-me das mãos.
    Justifica o carteiro anão,
    Ao entregar a carta, o pequeno ser da cara mal tratada, desaparece no escurecer de um dos lados
do corredor, com um jeito desconfiado de tudo o que o rodeava, o seu medo aumentava a cada
segundo de vida, a cada passo dado, por aquelas pequenas pernas trémulas, trémulas de mais, quase
sentidas por quem o observava. Com certeza imaginava já mentalmente o seu novo trajecto, e tudo
o que o mesmo poderia contemplar. Com certeza entregaria mais uma desgraça, sendo a desgraça o
contemplo da sua vida, vivendo cada minuto com ela, chegando a adora-la por conveniência e ao
mesmo tempo detesta-la.
    O homem volta a olhar de uma ponta à outra os extremos infinitos, aquele ritual tinha-se já
repetido por diversas vezes de forma semelhante.
    A carta era remetida da própria morte que à muito tempo tinha sido travada de um trabalho que a
aferrolhara na sua lista e que teria ocorrido naquele mesmo quarto. Não se devia interromper o
trabalho deste ser máximo, contudo a sua magnificência teria sido desafiada. Apenas os ignorantes
desafiavam a morte, os indolentes ou os apaixonados, mesmo que doentios.
    “Amanda, escrevo-te vezes sem conta, sinto-me insustentável sem uma resposta tua. Deixei de
sentir o teu coração, sinto os meus sentidos ofuscarem-se quando tento pensar em ti.
    Temo o pior, mas espero ainda encontrar-te em vida, para assim consumar a tua morte, que será
também a minha, já que a morte deixa de fazer sentido sem ti.
    Espero que ninguém se tenha intrometido na minha demanda, porque irá sofrer o pior dos dos
dias que alguém, já mais, poderá sentir.
    Procurar-te-ei até te encontrar, ou até encontrar quem realmente deva achar.
    Amo-te Amanda”
    O homem fecha a carta,
    Dirige o olhar para o retrato da bela dos olhos cor de pérola, que o acompanhava com o seu olhar,
por onde quer que ele se deslocasse naquela divisão os olhos azuis miravam-no de cima a baixo,
não por gosto, não por obrigação, apenas por desprezo.
    O rude sujeito abre a única gaveta, outrora acompanhada por duas semelhantes, de uma mesa-decabeceira, gaveta em que tanta carta a impedia de ser fechada por completo, o sangue que escorria
de cada uma, misturava-se nas várias tonalidades avermelhadas, pela graduação do sangue que já
estava seco e do que ainda se encontrava meio húmido.
    - Mais uma Amanda, o cheiro a sangue nunca me largou, mesmo depois de partires… como eu te
amo e como tu sabes disso. Não sabes?
    O homem olhou para o retrato expectante,
    Com o seu jeito rude moveu a cabeça delicadamente em direcção àquele olhar, dando-lhe um
beijo de paixão doentia, que o consumia e lhe quebrava qualquer corrente, que o pudesse relacionar
com um amor verdadeiro.
Aqueles lhos azuis pérola penetrantes choraram, choraram sangue, de morte e tristeza.Aprisionada naquele retrato, aquele ser em que a beleza era quase inalada, observa o degredo de
algo tão doentio, que parecia querer ficado no reflexo dos seus molhos por inúmeras eternidades.
    - PORQUE ÉS ASSIM? SABES QUE EU SEMPRE QUIS O MELHOR PARA TI!
    O homem pontapeia a mesa-de-cabeceira,
    Indignado pontapeia o frágil compartimento ensanguentado, onde teria colocado as cartas
sebentas pela hemofilia presente. Involuntariamente a gaveta abre-se, apavorada pelas atitudes
dementes do rude homem. Gotas de sangue são lançadas contra a parede, num conjunto acto
automático de pavor, escorrendo pelo relevo, que o papel de parede crestado, teria ganho pela
humidade, escorrendo até onde a sua viscosidade assim o permitisse. Nem o pequeno postigo
escapa àquele insensível derrame de sangue, o postigo, o único contacto visual com o mundo
exterior, dele via-se a lua cheia que se presenciava naquela noite, agora ensanguentada, com um
sobreposição de planos, nunca antes se teria visto a lua a sangrar.
Escorria o sangue que alguém teria provocado, escorria o sangue que não era seu demandando o
feito daquela noite.
    - Eu amo-te Amanda! Eu amo-te!
    Geme o homem chorando,
    Limpa as suas lágrimas insanas e com um só gesto limpa também a langonha que estaria
pendurada nas suas narinas. Após uns segundos de uma troca de olhares, abre a porta e sai
apressado pela revolta e pela angustia, batendo-a com uma força bruta, naturalmente própria de si
mesmo, mas está tudo bem, pois a porta já está habituada, o quadro fica ainda mais de lado que da
ultima vez, qual será o dia que o prego ganha o salto que tanto deseja para a sua libertação?
    “Eu amo-te Amanda! Eu amo-te!”,
    Recorda o homem as palavras antes citadas por si, ao retrato dos belos olhos azuis. Com o seu ar
doentio as palavras surgiam-lhe na mente tal e qual ele as tinha dito, a mesma expressão, o mesmo
sentido, o mesmo ar, a mesma doença. Continuando a ouvi-las dirigiu-se para a extremidade do
corredor, num passo exaltado e desorientado pela indisposta revolta, no corredor, onde a luz, a
teimosa luz o iluminou por breves segundos, segundos que parecem horas na sua mente enquanto
recorda as palavras antes proferidas, mas a teimosia da tal lâmpada têm um fim, nem ela, a teimosa
se acha capaz de dar um rumo ao sujeito rude que deambula por aquele corredor, a sua
luminosidade cessa e a escuridão prevalece naquele momento. Um jeito cauteloso atesta o homem
quando se depara no interior da escuridão a que alguma força o teria exposto, mas uns quatro passos
bastam para encontrar uma nova fonte de luminosidade, que surgia ao fundo da escadaria,
conduzindo-o ao nível zero do edifício.
    - Como te amo Amanda.
    Proferiu uma vez mais na nova claridade que o iluminava,
    Desta vez, de uma forma suave e calma, quase como uma salvação que pode-se leva-lo a
acreditar, que tal afecção seria facto de uma real veracidade, algo que o seu génio desejava
inconscientemente e inconsciente demandava o seu bem-querer doentio. Talvez o amor do homem
não fosse totalmente impuro e por breves instantes ele presumiu sentir o que deveria ser uma paixão
verdadeira, alimentando-o suficiente para se sentir bem-aventurado por aquele sentimento inóspito,
alimentando-o por mais uma noite.

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segunda-feira, agosto 8, 2011 - 19:27

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