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As mãos ou a Mente
Entrei num café, numa tarde sem nada para fazer. Sentei-me junto à janela e fui invadida pela claridade de um dia de sol. As férias de verão tinham começado há pouco tempo e as crianças iam agora para a escola. Imaginei-as a rir, aquelas gargalhadas estridentes próprias de crianças que, depois de serem crianças, nunca mais se rirão assim. Ainda me lembro de dar essas gargalhadas, por tudo e por nada, como que a celebrar uma inocência genuína relativamente ao mundo que acabou por me desiludir.
Estou na casa dos vinte e parece que essas gargalhadas já passaram há 100 anos luz. Não dei muitas mais gargalhadas depois disso, até há bem pouco tempo atrás, quando ainda acreditava nas pessoas.
Sim, ainda há pessoas honestas. Ainda que muita da informação que recebemos seja manipulada, há pequenos estilhaços do espelho da humanidade que passam para o lado de cá.
Sentei-me nessa janela a receber essa luz tão bem-vinda, como se há séculos vivesse na escuridão. Do outro lado da rua ficava outro café, cheio de belos doces e muita gente. Mas não me atraiu. Não me quis juntar àquela multidão. Eu, a socialmente correcta, queria-me isolar da sociedade sem, claro, abdicar da luz.
Coloquei o portátil em cima da mesa, pedi um café e quase acendi um cigarro. Parecia que tinha recuado uns três anos atrás quando tudo o que fazia estava associado a um café. Na altura, gostava de pensar que era uma tertuliana de gema que, tal como Camilo, Eça, Bocage, ou Negreiros, confraternizava e escrevia nesses ambientes de fumo, agora limpos, aborrecidamente saudáveis.
Comecei a jogar um jogo. Estúpido e viciante (dois adjectivos que estão frequentemente interligado). Pesou-me a consciência. Queixo-me de que não tenho tempo para ler nem para escrever e, de repente, quando tenho um tempo livre gasto-o com isto. Estúpido e viciante… mais uma vez.
Então, fiz por perder, desliguei o jogo e abri uma página Word.
Apercebi-me que a escrita fluía sem que para isso fizesse algum esforço e, quando me dei conta, tinha já uma página. Sabia que tal proeza não iria durar muito. Sou por natureza sucinta e tenho uma tendência irritante de engalfinhar uns assuntos nos outros… (como aliás já fiz). Mas soube-me bem este exercício cerebral, saber quem é o mais rápido: as mãos ou a mente… não sei.
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Comentários
Re: As mãos ou a Mente
Acho que é a mente, esta voa por lugares inimagináveis, por espaços jamais visto e idéias nunca ditas, a mente vai ao infinito e retorna ao finito, enquanto os dedos se movem lentos sobre o teclado, do portátil. Parabens
Re: As mãos ou a Mente
Acredito que seja a mente. Na casa dos vinte e com gargalhadas há mais de 100 anos luz? De facto, vivemos num mundo cada vez mais estrangulador...
Qualquer dia, nem as crianças riem.
Gostei do texto, faz-nos reflectir sobre as pequenas escolhas do dia a dia, que tão importantes são.
Re: As mãos ou a Mente
Um pensamento que exercita as mãos e a mente!!!
:-)