CONCURSOS:

Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia?  Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.

 

O Quadro

É-me cara a imagem, costurada na memória, daquela manta de serapilheira que servia de tela para a fotografia pontilhada da mais bela aldeia semeada na escola secundária. Ano após ano, os alunos cumpriam o horário estabelecido para os “trabalhos Oficinais – têxteis”, fazendo correr a linha de lã atrás da agulha – como num jogo de traquinice de recreio – na proeza engenhosa de construir mais uma rua, mais um jardim, mais uma casa daquela aldeia fantástica. E enquanto crescia a manta, na rotina pontuada, cresciam em número os farrapos das histórias e das aventuras imaginadas naquele lugar nunca acabado, nunca preso a uma só verdade. Toda a sua beleza e força residiam nesta cornucópia de soluções, enquanto espaço aberto e de conclusão indefinida.

Assim é também a nossa experiência do real…

A nossa vida é um quadro. Um quadro inacabado e sempre em mutação. Se for dado por terminado, então é porque alguém, por nós, deu a última pincelada e o assinou postumamente.

Todos os dias, ao acordar, olhamos para a tela e procuramos precisar o ponto da pintura que vamos acrescentar ou retocar. Temos espaços próprios para cada uma das nossas vivências. O espaço da família, o espaço dos amigos, o espaço do trabalho, o espaço dos sonhos… o nosso espaço íntimo. A qual acudir hoje? E quando se baralham e misturam todos, como aplacar a oxidação das cores!?

Não raramente, não são os olhos que vão ao encontro do quadro, é o quadro que se impõe aos olhos. Mesmo quando estes se fecham na vã tentativa de embarcarem na balsa da cegueira… E sempre que têm êxito na fuga, estão lá os ouvidos para escutar o impertinente quadro!

Tintas brilhantes irradiam o sol dos dias felizes. Mas prontamente a moldura engrossa-se e começa a reduzir a pintura sob a sua sombra. Por vezes, fica tão escuro que não se enxerga nada: Nem se consegue encontrar o buraco negro que tudo absorve para o adoçar com a simpatia do pastel.

Dêem-me um estilete e eu rasgo por completo esta miséria de quadro!

E damos largas à composição. Adicionamos as figuras, os momentos, os lugares e tudo o que vamos marcando à nossa volta. Primeiro os contornos, depois o preenchimento colorido. Ficamos tão soberbos do muito que acumulamos e reunimos que decidimos comprar uma moldura nova, uma parede nova para acomodar, bem alto, a nossa bela pintura, a nossa triunfante vida. E quanto mais juntamos, mais elementos temos para sonhar novas metas, novas molduras, novas paredes.

Pensamos então: Está quase! O quadro completa-se segundo o curso de pintura social que frequentei desde que nasci. Já tenho quase tudo para a pintura perfeita!

E quando o artista se prepara para encomendar a cadeira, onde se sentará em repouso e contemplação definitiva em frente à sua obra, cai o quadro lá do ponto bem alto em que foi colocado e perde-se na mancha suja do chão. O peso era tanto que o prego do destino não o segurou. Remende-se o que for passível de remendo ou inicie-se uma tela nova.

Em segredo, também vos digo que o próprio artista, cansado das imagens de sempre, decide, em certos casos, dar um encosto descuidado ao quadro e provoca a sua queda no caos… para renascer.

E quando pensamos já ter tudo alcançado…
Talvez a minha busca ainda não tenha terminado…

Andarilhus “(ºoº)”
XXIII : I : MMVII

Lírica: Dead Can Dance: I Can See Now

Submited by

quarta-feira, março 19, 2008 - 22:58

Prosas :

No votes yet

Andarilhus

imagem de Andarilhus
Offline
Título: Membro
Última vez online: há 13 anos 49 semanas
Membro desde: 03/07/2008
Conteúdos:
Pontos: 868

Comentários

imagem de Henrique

Re: O Quadro

Texto bem escrito, boa interpretação das coisas!

:-)

Add comment

Se logue para poder enviar comentários

other contents of Andarilhus

Tópico Título Respostas Views Last Postícone de ordenação Língua
Poesia/Tristeza Remos de Vida por Mar Inóspito 3 680 07/29/2010 - 00:39 Português
Poesia/Meditação Derrubar os Nossos Muros 1 652 07/29/2010 - 00:38 Português
Poesia/Pensamentos Aqueles Que Instigam os Nossos Demónios Cativos 1 795 07/16/2010 - 15:58 Português
Poesia/Intervenção O Drama sem Argumento 3 843 05/29/2010 - 15:31 Português
Poesia/Tristeza O Voar Rastejante 1 642 04/25/2010 - 13:09 Português
Poesia/Gótico O Uivo da Lua (Um texto comum de MariaTreva e Andarilhus) 7 1.075 03/04/2010 - 16:06 Português
Poesia/Amor A Obra do Amor 4 805 03/03/2010 - 02:55 Português
Poesia/Gótico Protege-me com tuas lágrimas 5 616 03/03/2010 - 02:51 Português
Poesia/Amor Outra vez... 6 798 03/03/2010 - 02:06 Português
Poesia/Aforismo O Tesouro 4 528 03/02/2010 - 17:19 Português
Poesia/Meditação Um Natal Aqui Tão Perto 4 646 03/02/2010 - 03:04 Português
Poesia/Dedicado Vestida de Mar (ia) 4 687 03/01/2010 - 20:18 Português
Poesia/Meditação Fado Vadio 5 637 03/01/2010 - 15:29 Português
Poesia/Geral Farei de ti um concorrente do Sol 7 781 02/28/2010 - 19:45 Português
Poesia/Meditação Um bom ponto de partida... 7 570 02/28/2010 - 19:24 Português
Poesia/Meditação O Fio Ténue da Marioneta 5 634 02/28/2010 - 13:55 Português
Poesia/Desilusão O Canto Escuro 7 800 02/28/2010 - 12:39 Português
Poesia/Aforismo Lições de Vida, Lições de Amor 5 796 02/28/2010 - 01:38 Português
Poesia/Aforismo Folha de Outono 5 725 02/28/2010 - 01:17 Português
Poesia/Paixão Guarda-me no teu beijo 8 952 02/28/2010 - 00:48 Português
Poesia/Tristeza Coroa de Espinhos 3 741 02/27/2010 - 21:07 Português
Poesia/Fantasia A Pura Dimensão 3 877 02/27/2010 - 20:56 Português
Poesia/Geral Das Certezas (tomo IV) 2 987 02/27/2010 - 15:03 Português
Poesia/Paixão Saída 3 795 02/26/2010 - 17:26 Português
Poesia/Amor Obra-prima 3 683 02/26/2010 - 17:13 Português