O Retrato - Capítulo VIII

"VIII

Vila Real, 6 de Janeiro de 2008

Querido Luís,

Tenho tanta coisa para te contar que nem sei por onde começar.
Desejava tanto que estivesses aqui comigo neste momento!
Tive uma discussão com a minha irmã e vim para a casa do tio João para tentar pôr as ideias em ordem. Aqui sempre tenho mais paz!
O mundo pode estar a acabar lá fora, mas aqui tudo estará sempre perfeitamente em paz. Nada poderá correr mal dentro destas quatro paredes. Sabes, é como se houvesse uma força sobrenatural que habitasse estas paredes e as tornasse incrivelmente poderosas.
Em primeiro lugar, podias-me dizer que estupidez foi essa de achares que te ia recriminar por preferires os cavalos ingleses? Deves estar a gozar com a minha inteligência, só pode. Mas bem, eu nem vou comentar essa história.
Em segundo lugar, tenho que te dizer que tu não estás doido. Nem sei bem como te explicar isto, mas... eu sei perfeitamente do que estás a falar. Também eu tenho vivido essa sensação esquisita de que algo de muito estranho se está a passar.
Outro dia, estava eu a ligar para a Cátia e ouvi uma voz do outro lado da linha a pedir ajuda. Fiquei assustadíssima. Quase que entrei em parafuso! Agora, imagina a minha cara quando li o teu e-mail.
Senti uma espécie de alívio momentâneo, por descobrir que afinal não era única a dar de caras com estranhos acontecimentos, logo seguida de um arrepio na espinha.
Não consigo pensar em mais nada.
Se isto se repetir vamos ter que tomar medidas. Ainda não sei o quê, mas alguma coisa vai ter que ser feita.
Para mudar um bocado de assunto. Há pouquinho descobri uma foto muito engraçada do tio João, nos seus tempos de faculdade, abraçado a uma rapariga. Quando ele voltar já lhe vou chatear a cabeça... lol...
Olha, diz alguma coisa o mais depressa que poderes.

Beijos com saudades
Marta"

(in O Retrato - Autora: Luzia Gomes - Corpos Editora)