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OS GÉMEOS - 11
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Céline contava-lhe isto desprendida, atenta à estrada e ao conta-quilómetros, como se falasse sozinha. Antes, estivera sempre calada e já bastante longe de Paris limitara-se a dizer, mais afirmando do que perguntando: — Era você... James.
E ele respeitava-lhe o silêncio.
Céline era uma mulher muito bonita. De perfil notava-lhe as formas excitantes do busto e das ancas e o desenho helénico da cabeça. Assim ia confirmando a si mesmo que estava apaixonado por ela. Era uma mulher que parecia não ter a noção da sua beleza. Não se pintava. A roupa, em tons claros de cremes e castanhos tabacos, também não lhe acrescia nada ao seu encanto natural. E a vivacidade dela desenvolvia-se a nível íntimo, apenas passando para fora dela através da intensidade com que dizia as coisas pelos seus olhos azuis. Contenção, era a sua maneira de estar, corroborada por falar pouco. Não teria uma cultura por aí além, ou, porque era muito simples, não a deixava perceber. Mas tinha algum espírito de humor e por debaixo da pele, agora mais morena, devia ser um vulcãozinho...
A viagem ainda estava muito longe do fim e o mutismo de James, se por um lado era bom, permitindo-lhes gozar aparente serenidade, por outro tenderia a tornar-se insuportável.
James não podia deixar de a ter acompanhado. Dormira pouco, ocupando a maior parte da noite a pensar nas consequências que iam surgir de uma relação de amor com Céline. A questão de a começar ou não, fora arredada desde logo. Era poderosa demais a atracção por ela, e de já se conhecer tão bem a si próprio nem colocava a hipótese de se afastar da complicação. As afeições fossem por pessoas, fossem por causas ou situações, nele manifestavam-se sempre arrebatadoras. A sua autenticidade como homem dependia essencialmente da generosidade das suas dedicações. Contrariar isso era sofrer com amargura, em vez de sofrer, pelos mesmos motivos, com o coração enternecido. Concordava com Marchinot numa perspectiva factual, pelo menos as paixões tinham um começo definível e deviam ter um fim claro. A sua paixão por Céline começara num momento exacto, num sítio certo: o cofre-forte de um Banco. Era evidente que um dia haveria de terminar, e também em tempo e local precisos. Às vezes umas paixões são mais implicantes, e têm de ter prioridade sobre as outras. Depois do assalto, a sua devoção ideológica tivera de primar, até por razões de integridade física, sobre o chamamento de Céline. Agora era o tempo conveniente, e talvez único, para viver Céline...
O amor, ao que já sabia, era pródigo em armadilhas, e o dele não tinha virtudes que justificassem ser dispensado da regra.
Não bastaria a sua restritiva condição de resistente político, e o destino ter-lhe casado Céline entretanto? Agora ainda tinha de se defrontar com outro embaraço: como persuadir uma mulher de que a amamos, depois de lhe ter batido grosseiramente, e que continuamos pobres, depois de, sob os seus olhos, ter roubado 200 milhões?
Arrebatamento!... O que lhe seria necessário para a convencer era arrebatamento. A sinceridade dele, só, não daria plausibilidade ao seu amor. Tudo concedia a Céline razão para uma dúvida perversa: não estaria ele assim a comprar-lhe a delação?
De qualquer modo a única solução era ser honesto com ela.
Escrito de acordo com a Antiga Ortografia
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