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OS GÉMEOS - 29

.

 

(continuação)

 

Foi com imenso alívio que recebeu a chamada telefónica de Louise. Estava debaixo do chuveiro, quando o campainhar do aparelho se misturou com o zunido ciciado da cortina de água com que tentava expurgar de cima de si a poeira e a transpiração que se lhe tinham acumulado na pele durante as deambulações que o caso Zeca lhe havia ocasionado, acreditava, mas que no fundo eram apenas o sintoma mais visível do estado de nervosismo que se fora apossando dele à medida que ia empreendendo nos transtornos que se avizinhavam, por tão implicante quanto infeliz forma de despacho que a leviandade do homem estimulara.

— William, por favor, venha depressa ter comigo. Traga a Hana. É urgente.

— O que é que se passa de mais grave ainda? Onde é que você tem estado?

— Não se preocupe demasiado. Não é nada de grave. Desculpe a minha precipitação. Você sabe ao que me refiro... Afastei-me durante o dia para evitar a parvoíce daquele polícia.

— Louise... nós não temos nada com...

— Claro. E isto vai resolver-se por si... mas entretanto não deixará de nos trazer aborrecimentos e maçadas. É melhor que tratemos de nos salvaguardarmos sem hesitação. É para isso que preciso da vossa ajuda.

— Mais precisamente, para?

— Vamos revisitar alguns dos lugares por onde vadiámos na noite de aniversário de Hana e procurar testemunhos que corroborem os nossos movimentos. Venham. Estas coisas devem ser atalhadas de imediato, para que nos deixem em paz. Venham! Mas não tragam disposição fúnebre... Para que não se desperdice mais tempo e paciência do que a indispensável. Talvez ainda possamos completar a noite que a destrambelhada da Zirá interrompeu...

— Não sei se Hana estará pelos ajustes.

— William, eu tive o cuidado de telefonar a ela também, e se você estiver muito tempo a falar comigo ela vai ter de esperar que você se prepare. Como se deve recordar ela só costuma usar um par de brincos, um colar e uma túnica a adornar a sua graciosa orientalidade... Além de sandálias. E isso demora pouquíssimos minutos a vestir. Faça-me o favor de se apressar, sim?

  Assim que começou a descer as escadinhas do Black Cat, um pouco hesitante, o que lhe acontecia ali sempre porque a luz era algo difusa e amarelada e dava à estreiteza do espaço a característica de uma atmosfera em suspensão, veio até ele uma inefável euforia, que logo lhe fez lembrar a presença de Jimmy nos momentos em que a proximidade do irmão se revelava  também nalguma comunhão de preocupações. Sorriu contente, um pouco surpreendido com a recordação.

À frente seguia Hana, com o cabelo a adquirir um tom de negro esverdeado, e entre os dois via o dorso nu e escultural de Louise, com o rolinho de cordão que lhe segurava o vestido a parecer que roçava no pescoço dela com a voluptuosidade adequada àquela pele suave e que atiçava carícias. A sensação de bem-estar que experimentava provinha-lhe decerto de visão tão agradável, completada pela elegância com que elas se moviam.

Ah! Não!... A cave estava pouco frequentada e logo que transpôs a passagem do último degrau para o salão reparou instintivamente naquele inimitável gesto de postar a cabeça numa posição que não deixava sugerir o ponto que os seus olhos tentavam observar. Aparecia em boa altura!

Porque é que o irmão estava ali? Espantoso! Isso não interessava... Era bom encontrá-lo! As suas particulares e críticas preocupações que fossem para o diabo. Era bom encontrar Jimmy!

Contudo, ficou indeciso. Importar-se-ia Jimmy de ser reconhecido? Madeleine não estava com ele. Louise e Hana já se teriam apercebido da sua presença?

Desviou o olhar e deu  meia volta  sobre si,  abraçando ambas pelos ombros como se pretendesse encaminhá-las para alguma das mesas mais distantes. Sentiu-as aconchegarem-se a ele, dadas à familiaridade do seu afago, e aproveitou o instante para despertar a atenção dum empregado que a alguma distância estava à espera que eles escolhessem lugar. Gostava do Black Cat porque, mesmo nas noites animadas por muita gente, a música não era demasiado barulhenta e podia-se conversar sem ser por mímica ou por frases quase berradas ao ouvido. Nessa noite havia ali calma bastante para que Jimmy sem dificuldade os avistasse e, se fosse essa a sua vontade, num instante desandasse para outro lado.

— Aquele senhor está a convidá-los para a mesa dele. — disseram-lhe, nas costas. — Façam o favor... por aqui.

Jimmy levantara-se da cadeira e acenava-lhes para que se lhe juntassem. Tinha uma expressão risonha, mas não mostrava surpresa pelo acaso.

— Quem diria, ein!... Um beijinho, Hana, você está encantadora! Os ares daquela lezíria são saudáveis... E você, Louise, linda como sempre!... Então, têm tomado bem conta do meu maninho? Sem dúvida, sem dúvida... ele está com uma óptima aparência.  Sentem-se. Que é que tomam?...

— Não te dou um abraço, James, porque tu não mereces... então andas aqui perto e não vais visitar-me! Como está a ...

— Madeleine? De excelente saúde. Eu estou aqui só de passagem, mesmo de passagem... negócios. Há coincidências que ainda bem que acontecem. Ia telefonar-vos, amanhã de manhã, mas assim poupo tempo... Formidável!

— Claro. Ainda tenho esperança que qualquer dia venhas para cá à procura de passares umas férias repousantes.

— Podes crer que te invejo a existência sadia que levas aqui... sadia e divertida, olha só as duas lindas mulheres com quem te apresentas em público! Homem de sorte!... Muitas novidades, Louise?

— James, você sabe bem que esta terrinha é de uma monotonia excitante... não é? Mas há novidades, há... Não vamos é falar delas agora. Prefiro dançar. Vá, leve-me para a pista...

Ficou sozinho com Hana, olhos nos olhos, numa conversa muda, perguntando-se o que resultaria daquele encontro, pois se até então não tinham sido bem sucedidos a descobrir os tais testemunhos presenciais que poderiam ilibá-los em definitivo da bronca aprontada pelo Zeca, agora, com James no caminho, isso seria ainda mais improvável. Valeria a pena contar a James alguma coisa? E afinal não deveriam também eles recrear-se, já que estavam ali?

— Caprichoso destino!... Vamos nós também embalar os nossos “invólucros fisiológicos”. — Disse William por fim, dando-lhe uma risonha piscadela de olho e levando-a para dançar.

— Estou com um calor..
.
— Alto, Hana! Alto!... Por favor, aqui não, aqui não é o meu contentor no meio do nosso solitário arrozal!... Não pense em despir-se. Num instante causava uma desordem pública! — provocou-a ele, mostrando-se espirituoso.

— Mas você acha que eu faço exibições daquelas só para si? Antes de irmos embora vai ver como é. Entretanto, abrace-me com muita delicadeza, ou como mais lhe apetecer, que o seu irmão vai de qualquer modo imaginar que dormimos ambos no laboratório nos braços um do outro. Como é que ele apareceu, logo aqui?

— Não faço a mínima ideia... "um beijinho, Hana, você está encantadora"... parafraseando James.

— Foi preciso ser ele a ver isso? Você não via?

— Mas como?... Ainda está vestida!

— Ai que você nunca me olha com olhos de ver, William...

— Como disse?

— Nem pode acreditar! A chinesinha a falar assim e a portar-se de modo escandaloso, não é!

— Ouvi alguma coisa que não devesse escutar? — interrompeu-os James, inesperadamente ao pé deles, balançando Louise, que apesar da pose romântica parecia apreensiva, a um ritmo lento e descompassado da música. — Isso de escândalo, é muito grave! Os cientistas têm de ter sempre muito cuidado com a reputação...

— Ouviste bem, mas não ouviste tudo. Há uma ameaça no ar... daqui a bocado é que vais saber o que é a reputação dos cientistas. — rebateu William, com um duplo sentido. Por um lado era a continuação da sua brincadeira com Hana, e por outro aludia com subtileza à trapalhada a que a sua ingenuidade o conduzira, por via das suas relações com Zirá. E ainda era uma resposta pronta à piadinha do irmão, a quem Louise já devia ter contado a lamentável aventura.

— Apraz-me ver-te bem-humorado. É sinal de que vai tudo bem contigo. O que, aliás, Louise acaba de me confirmar. Vamos, vamos continuar a festa... enquanto estamos vivos e bem dispostos. Não sei se vocês têm intenção de ficar aqui, ou se preferem ir para outro lado. Por mim, só preciso de dois ou três minutos para fazer uns telefonemas... os tais negócios... e depois fico livre, para o que vos aprouver. Aguardem um momento, por favor, que eu volto já.

 

 
(continua)

Escrito de acordo com a Antiga Ortografia

 

.
 

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quarta-feira, maio 22, 2013 - 11:04

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Nuno Lago

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