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OS GÉMEOS - 36

 ( continuação)  

  
Estranhou não ver Cláudia a servir-lhe o desjejum, que encontrou preparado, à sua espera. Nem ela nem Madeleine, embora esta nunca lhe tivesse aparecido antes da hora do almoço. Sem a vivacidade de Madeleine e sem a presença de Jimmy a casa estava a tornar-se um local adequado para férias de sossego. Manhã de Sol. Rumou de imediato para a piscina. Enquanto durasse, a sua paz seria um regalo.
E durou quase todo o dia, como se estivesse em casa sozinho, assistido por invisível mão, que até lhe teve pronta para saborear a refeição do almoço, à hora tardia em que regressou da soalhenta preguiça salpicada de revigorantes entra e sai da água. Faltou servirem-lhe o café, mas arranjou-o ele próprio no bar da sala e, acompanhado de uma excelente aguardente, foi até à biblioteca da casa, onde porém não tardou a sentir-se zombado pelos raiozinhos de Sol que, disparando por nesgas entre os cortinados iam trespassando as centenas de livros que guarneciam as paredes. Por isso, e por interposto bloqueio da sua psique de estudioso, que nem música logrou estimular, voltou para se esparramar de novo na relva fagueira ao lado da piscina, pachola de pensamentos, morno de física mandriice.
Ao fim da tarde, quando inopinadamente estava a surgir-lhe no raciocínio uma ténue linha de solução para um dos mais estrondosos falhanços nas manipulações genéticas que andava a explorar com uma espécie de ratos-cegos, escutou um ruído de portas a bater e ao olhar para a casa deu com Cláudia a acenar-lhe da janela do quarto dele. No momento não deplorou aquela aparição. Mas no mesmo instante esqueceu-se daquilo em que estava a pensar e, agarrado à amistosa imagem dela, como que a convidá-lo para se lhe ir juntar, veio um aguçado apetite de jantar. Fez-lhe sinal de que ia para dentro e pretendia comer, e depois achou que devia aguardar uns minutos antes de ir vestir qualquer coisa, dando assim tempo a ela se retirar dos seus aposentos. Interessante, que estivesse com tal preocupação, o que bem mostrava que afinal era mais forte a apreensão por vir a ter de aturar a pregação dela do que o sofreado desejo de a possuir.
  
Trazia uma bata cor-de-coral, muito justa ao corpo — e era impossível que por baixo tivesse mais alguma peça de roupa, que os vincos se notariam sem dúvida — e toda abotoada na frente, desde o pequeno decote até um pouco abaixo dos joelhos. Reparou nisso logo, porque, filosofou com ironia, estava ali um exemplo concreto da coexistência de dois contrários: um corpo encoberto por pudibundo tecido que, de tão apertado, lhe descobria a impudicícia. O certo é que entre a sopa e o café, entre sorrisos angélicos e meia dúzia de frases de circunstância, a intervalos quiçá calculados por ela com precisão mas que ele não pôde determinar, foi vendo aparecerem, sucessivamente desapertados, o primeiro botão junto ao decote, o que lhe suscitou olhares enviesados, depois o seguinte, o que lhe relembrou promessas acolhedoras, depois o último botão no extremo da saia, o que lhe sugeriu auspícios deliciosos, e ainda o outro logo acima, o que lhe ditou uma excitação tão imperiosa que, erguendo-se devagar da cadeira e espreguiçando os braços, apenas para que ela visse bem a excitação que se lhe empinava sob as calças, e ante a sua exclamação “Oh! Meu Deus!...”, a puxou para ele abafando-lhe a expressão de outras tolices com um beijo sôfrego, e depois, com alguma violência, porque ela ora cedia ora resistia à devassa das suas mãos, a pegou ao colo e com ela a espernear, com os botões a desapertarem-se por si próprios, numa colaboração que ela talvez nunca tivesse imaginado, e repetindo quase a gritar “Não, não! Vamos pecar!”, o que o fez apressar-se a levá-la, mordendo-lhe uma orelha e sussurrando “Cala-te, que damos escândalo!”, e ela em crise de choraminguice e de beijos no peito dele murmurar “Madame não está... Oh! Meu Deus, vamos pecar!... Vamos pecar!”
Cláudia fez amor com um desvario cantante, linguajado e impossível de perceber para ele, mas agradável e místico, com entoação entre um hossana e uma ladainha, e com orgasmos frementes, e ao cabo de perto de duas horas de ardorosa lascívia fugiu-lhe da cama, desarvorada, como se tivesse acordado de um sonho, saindo do quarto despida e desgrenhada como estava, deixando a porta escancarada, mas nem dois minutos demorando a regressar, risonha e ofegante, alardeando na mão um livrinho de capa grossa e azul celeste com um título em letras douradas, que com deferência colocou em cima do leito, junto aos aparrecados pés dele, e então pegou no vestido e nas sandálias e foi para o quarto de banho lavar-se e arranjar-se e depois foi dar-lhe um esquivo beijo de despedida, outra vez abotoada a rigor mas já com ar sério de compenetrada acusação.
Se a relação deles porventura continuasse, ia ser aquilo mesmo... — reflectia William — um misto de desejado desbragamento carnal e de redimida incriminação, o que tornaria tudo emocionante. Dentro dela, a luta dramática entre Deus e o Diabo era renhida mas com tréguas de apaziguamento, e ele, simples mortal, nunca saberia quem a ganharia, e quando.
Adormeceu consolado do prazer que vivera com Cláudia, e a tentar analisar, com o distanciamento próprio de um observador psiquiátrico, se cometera ou não uma violação. E, se sim, as consequências éticas e práticas que poderiam sobrevir e se tinha direito a beneficiar de atenuantes, uma vez que, com intencionalidade ou não, ele próprio fora na verdade vítima de assédio sexual.
De facto, no dia seguinte a consciência do seu atrevimento tocou a rebate logo ao pequeno-almoço quando encontrou Madeleine muito pensativa em conversa com uma Cláudia vestida com recato e muito pesarosa, que apesar de tudo o cumprimentou com um cerimonioso “Bom-dia senhor doutor!”, ainda que sem o habitual complemento “O senhor dormiu bem?”, e que logo se retirou de ao pé deles.
— Vamos ficar ainda mais sozinhos. — informou Madeleine. — Cláudia vai-se embora... — e ele assustou-se deveras — Já tinha cinco dias de férias acertados comigo há algum tempo. E como eu contava com William e que estivéssemos agora para fora, não contratei ninguém para a substituir. Cá nos havemos de arranjar...
— Claro! Eu darei o menos trabalho que puder. — concordou ele, com a alma a aquietar-se. — Até sou capaz de cozinhar, nem que sejam bifes e batatas fritas. — acrescentou, o seu íntimo já a começar a atanazar-se com outra perspectiva de igual modo constrangedora: ele e a cunhada isolados, sabendo ele, como sabia, embora interditando o pensamento, que era bem amor, e do entranhado, e inefável, o que o ligava a ela para além de James.
— Ah, ah! Seria uma vergonha se eu não pudesse afirmar que sou boa cozinheira. Além disso, devemos ter aí muitas provisões. Quanto ao resto... Tendo em vista que tu adoras a calma e à minha vivacidade preferes uns bons dias de fleumática quietude, recheados de livros, música e piscina, eu vou abster-me das minhas reuniões sociais e de alguns espectáculos que estão em cena por aí. Ficaremos a repousar.
— Madeleine, por favor, é lógico que não poderei sentir-me bem se por minha causa nos remetermos à pasmaceira de que eu gosto. Estou repimpado aqui em casa porque sou preguiceiro e este lugar é agradável e diferente. Mas para ti, que aqui resides todo o ano, é natural que não possa ter muita graça. Avança com os teus planos, que eu por mim vou achar tudo óptimo.
— Há uma alternativa... Fui inspeccioná-la ontem... A nossa casa em Rimini. Não fica assim muito longe, mas só lá costumamos passar alguns fins-de-semana porque aqui é que é o centro nevrálgico para os negócios de Jimmy. Sendo uma moradia pequena, também é muito confortável e bonita. Está situada num ponto alto, sobre o Adriático, também tem uma piscinita e tem a vantagem de não facilitar a curiosidade de olhares indiscretos, como aqui. Não se nota, mas jurava que nas redondezas desta casa andam binóculos assestados sobre o meu atlético “marido” em regime de lazer caseiro.
  Era visível que o Diabo estava a levar a melhor em todas as frentes. A alternativa, não o era para ele. Madeleine já tinha decidido por ambos. Tudo tem um custo que é preciso ser pago, e a contrapartida destas férias seria uma alta parada de sacrifício. Contudo, não deveria recusar a Madeleine o menor dos males, porque para consentir um alegado prazer dele a ela pertencia o direito de pelo menos permanecer em sítio que lhe aprouvesse, ainda que, por ingenuidade dela, afinal, o mal a ele coubesse.
— Decerto. Vamos para Rimini. Talvez que James se junte a nós bem depressa. — deixou William escapar — E se há por lá Sol para mim e alegria para ti, então de que é que estamos à espera?
— Que chegue o motorista que nos levará. Não tenciono estafar-me a conduzir. — respondeu-lhe Madeleine, com a satisfação a brilhar-lhe nos olhos. — Cláudia já está a tratar da tua bagagem. Ela também queria ir connosco mas desta vez não a roubarei ao marido. Concedo-lhe de boa vontade a dispensa que tínhamos acordado. Rimini... Vais gostar!
  
   
(continua) 

Escrito de acordo com a Antiga Ortografia     

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sexta-feira, junho 7, 2013 - 14:43

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