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Segredo - 1
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O tempo estava excelente, a manhã com céu limpo e azul, mais adiante o mar calmo e luminoso, mas aquela gente era exuberante de mais para mim. A dada altura levantei-me espreguiçadamente, num gesto alheado passei a mão pelo cabelo, perscrutei distraidamente em redor e, com um aceno como que pedindo-lhes escusa por momentos, fiz menção de me dirigir para o Bar. A dois passos do balcão olhei de relance para trás, na intenção de confirmar que não estavam atentos a mim, o que me possibilitaria mais facilmente sair de cena sem ser notado. Queria pensar, aproveitar a primeira manhã de repouso para poder concentrar-me, refrescar duas ou três ideias sobre a dualidade sucesso – insucesso que o nosso Director de Vendas me suscitara durante a última das estafantes reuniões de avaliação de objectivos.
Julgava que me poderia escapar do grupo, mas a Patrícia, nem mais nem menos, vinha ter comigo e fazia-me sinal para a esperar. Logo ela, que enquanto eu estivera na mesa se tinha mostrado, excepcionalmente, uma das participantes mais loquazes e folgazãs. Estranhei. Entre ambos existia um trato fácil mas, por inexplicado hábito, muito parcimonioso. Talvez porque não brincávamos em serviço, modo de dizer, e isso nos ajudava a sobressairmos nos bons resultados. Ou porque ela era muito bonita e insinuante e de certo modo o seu encanto pessoal me intimidava. Ou porque se calhar um dia escutara alguma parva mas inocente tolice minha sobre loiras, e o cabelo curto dela era doirado, o que para mim não é bem a mesma coisa que loiro sendo contudo esta uma diferença que nunca imaginara esclarecer-lhe.
Armei um sorriso solícito e quando a Patrícia chegou ao pé de mim nem sequer estive preocupado em ter-me já servido de um copo de refrigerante, limitando-me a soerguer o cenho, interrogativo e amável.
– Apanhado em flagrante... – murmurou ela, piscando-me o olho, ainda que não denunciando particular intencionalidade. – Aquilo ali está muito agitado. Uma manhã tão linda, exige-me mais serenidade. Talvez mesmo um acolhedor silêncio, que deixe a maresia embalar-me.
– Exactamente. O Sol não bate forte, vou sentar-me um bocado acolá no murete de cascalho, mais perto da areia e do mar, a escutar-me a mim próprio, sem desprimor da companhia, claro.
– Nem mais. Vou pegar uma toalha. Queres uma?
– Sim, sim, se me fazes o favor. Pode-me dar para ir à água...
Não esperei pela Patrícia. Afastei-me vagarosamente até bem longe da Esplanada, pelo menos tão distante que os outros não nos pudessem atingir com a sua alegria espalhafatosa, e então sentei-me a contemplar embevecida um barquito de pesca que perto da linha do horizonte ora mergulhava ora ressurgia por entre a miríade de prateados lampejos das ondas. Disse para mim que a companhia da Patrícia não seria perturbante para o sossego que eu procurava. Em quantas ocasiões já havíamos estado prolongadamente sozinhos num gabinete de trabalho, mudos e atarefados, sem darmos um pelo outro? Mas estava a enganar-me. Do que me dei conta mal ela regressou, deixou cair as toalhas a meus pés e enquanto com uma mão retirava do alto da cabeça os óculos escuros e com a outra se amparava no meu ombro para agachar-se e dar um saltito do murete para a areia. São Pantaleão! Eu estivera tão ausente na Esplanada, que nem reparara que a Patrícia usava um reduzidíssimo biquíni azul-marinho estampado com pequeninas gaivotas brancas em gracioso voo planado. Sim! Também deu para ficar satisfeito por comprovar que sempre estivera certo ao considerar que ela não era uma falsa loira, pele tão clarinha era a sua. Bem, o que me impediria, de facto, de abdicar de reflexões próprias das horas de trabalho e gozar a beleza e a amenidade daquela manhã sugestivamente paradisíaca?
Aprontei para a Patrícia uma das toalhas, na beira do pequeno muro de cascalho que delimitava o areal, e depois preparei a outra para mim. Sentamo-nos e durante uns bons minutos acho que nos esquecemos um do outro, enlevados talvez pelo aroma acre do sargaço que a brisa salgada trazia até nós e também pela sensação de paz e de miragem à nossa volta.
O Departamento de Marketing da nossa empresa organiza periodicamente seminários de estudo e preparação de trabalho em que envolve as diversas Equipas de Vendas que tem espalhadas por todo o país. Então, durante uma semana, isola cerca de trinta colaboradores num estabelecimento hoteleiro com cómodas condições de estadia e aí realiza intensos programas com vista ao alcance das melhores performances possíveis em cada faixa de mercado. Esta é a massa crítica de uma das áreas fundamentais da empresa. Trinta participantes, homens e mulheres, que são a nata da força de vendas, um núcleo seleccionado e quase inalterado ao longo de mais de uma dezena de anos, e que já se consideram quase familiares, tal a intimidade de convívio a que foram induzidos pela pratica regular destes tempos de aperfeiçoamento da objectividade comercial, independentemente dos patamares de ambição e dos níveis de eficácia pessoais. Os fins-de-semana incluídos, que não são facultativos, culminam sempre, para uns com larga diversão para outros com bom repouso, quatro ou cinco dias de duras tarefas. Se então haveria lugar a relacionamentos íntimos que ultrapassassem a rigorosa formalidade laboral a que todos estavam sujeitos fora daquelas ocasiões, nada constava, nem nunca constaria, decerto, tal o assumido espírito de clã e de reserva que presidiam a toda a acção no isolamento. Eu conhecia a Patrícia há pelo menos sete anos e há imensos Seminários, e, tendo nós por diversas ocasiões usufruído de tempos em praias privadas, não me recordava de algum dos seus biquínis. Bom, na verdade, eu e a Patrícia não somos exemplo porque, como já expliquei, nunca fomos muito próximos. Certamente que desta vez, por qualquer circunstância que não vislumbro, ela se sinta justificadamente mais cansada e se esteja a aproximar de mim muito simplesmente porque me vê tranquilo e conservo ante ela aquele ar de bom tipo, confiável e ainda para mais sério candidato a Director-Adjunto. Livra! Não, não pensem isso. Acho que a Patrícia, por alvura de personalidade, é incapaz de usar o seu charme para obter benefícios profissionais. Está trintona, é o que é. Ah, querem saber... É bonita e casada; pelo menos usa aliança, como eu, o que por idiossincrasia pessoal nada significa.
De súbito, após largos minutos da nossa costumeira mútua indiferença, ainda estou para saber a razão, deu-nos um golpe de fadiga nas pernas e gerou-se entre nós uma situação cómica, dado que em simultâneo cruzamos uma perna sobre a outra, eu a direita, ela a esquerda, e, como no caminho os nossos pés se encontraram, de imediato as descruzamos para logo cruzarmos a perna contrária e num sobressalto de novo invertermos as nossas caricatas manobras como se um inusitado raio de Sol nos tivesse aberto os espíritos lembrando-nos que afinal naquilo não havia mal algum, e o contrário até poderia ser mal interpretado pelo outro, em estarmos pé com pé, dedos a brincarem com dedos, como garotos a divertirem-se num afectivo jogo do empurra. Donde, ambos demos uma gargalhada. E eu neste riso então já senti que a minha pressuposta inocência estalara qual finíssima lâmina de vidro e estava na iminência de se esmigalhar totalmente em face da liberalidade dela. Mas não. Também a ela deve ter passado algo semelhante pela cabeça e a consequência foi, de repente, os nossos pés ficarem hirtos, sola contra sola, e nós cada qual a segurar ali o seu tornozelo em cima dos respectivos joelhos, para não o deixar descair e dar parte de fraco, olhares bem postos longe no mar alto, como querendo fugir de nós próprios, outra vez sem pensamentos, só deliciosamente esparramados no azul do céu.
Qualquer coincidência entre a realidade
e os factos ou personagens deste obra é,
precisamente, coincidência. ficcional.
Escrito de acordo com a Antiga Ortografia.
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Comentários
SEGREDO
Não sendo normal visitar com uma certa assiduidade os meus companheiros de escrita, por absoluta falta de tempo, hoje fi-lo e constatei que também gostas de "contar", Nuno. Entusiasmei-me de tal forma que prefiro ler mais e depois comentar. Voltarei, se me permites...
Um abraço.
"Ou porque se calhar um dia
"Ou porque se calhar um dia escutara alguma parva mas inocente tolice minha sobre loiras, e o cabelo curto dela era doirado, o que para mim não é bem a mesma coisa que loiro sendo contudo esta uma diferença que nunca imaginara esclarecer-lhe."
Só por aqui caro Nuno, já ganhou uns pontos ;)
Ora aqui está uma coisa que poucos sabem.. ehehehehe
Beijo R.
Doces pontos...
Obrigado por teres polvilhado sobre o meu texto a tua doce leitura, Sweet R.
Deixa-me dizer-te que os homens apenas brincam (as mulheres talvez se esgadanhem rss) com o louro ou o moreno dos seus amores. De qualquer modo, na verdade o teu dourado fascina...
Beijo
Nuno