O Combate dos Valinhos
Paulo Monteiro
O Combate dos Valinhos, ocorrido nos arredores de Passo Fundo no dia 8 de fevereiro de 1894, é um dos acontecimentos mais violentos e menos conhecidos da Revolução Federalista. Só nos Valinhos, como resultado de apenas meia hora de confronto morrem 141 homens e outros 120 foram torturados e mortos pela Brigada Santos Filho, da qual fazia parte o desembargador e deputado federal, aí na qualidade de tenente-coronel, Antônio Augusto Borges de Medeiros, futuro presidente do Estado. Daqui, no dia seguinte ao combate, o futuro “Antônio Chimango”, expediu o seguinte telegrama: “Hontem em renhido combate, nas proximidades da cidade derrotamos inimigo em numero de 1500 homens. Nossas forças combateram com grande denodo, salientando-se a nossa infantaria na resistência extraordinariamente heroica ás impetuosas cargas de cavallaria inimiga. Viva a Republica. - Borges de Medeiros.”
O Combate do Umbu, travado em 16 de janeiro de 1894, quando mais de 1.500 homens, comandados pessoalmente pelos coronéis Gervázio Luccas Annes e José Gabriel da Silva Lima, intendentes de Passo Fundo e Cruz Alta, respectivamente, são derrotados entre São Miguel e Pulador pela cavalaria maragata, repercutiu em todo o Estado. Nele morreram cerca de duzentos atacantes, centenas, inclusive Gervázio Annes, ficam feridos. Os feridos que não tiveram a sorte de escapar, foram degolados. Até nos mortos aplicou-se a “gravata colorada”. A repercussão da derrota provocou o envio a Brigada Santos Filho, às pressas, para Passo Fundo. Reforçaram seus 1.200 integrantes com 500 passo-fundenses, comandados pelo tenente-coronel Pedro Lopes de Oliveira (Coronel Lolico), e cruz-altenses, liderados pelo intendente José Gabriel da Silva Lima. O coronel Joaquim Thomaz dos Santos e Silva Filho evitou um contato frontal com os maragatos, estacionados no Umbu. Partindo da Fazenda dos Mellos sua tropa cortou as nascentes do Rio da Várzea, na direção do atual Bairro Valinhos.
Protegidos pelas brumas do amanhecer, os pica-paus colocam o transporte ao centro da infantaria montada e, para despistar a manobra, mandam um piquete tirotear com os maragatos concentrados no Umbu. Quando estes entenderam a situação, já era tarde. Os republicanos se aproximavam dos Valinhos. Restou apenas um movimento desesperado: mobilizar um esquadrão de lanceiros, que aproveitando as canhadas, subiram pelas encostas do rio Passo Fundo, e, às 11 horas e 35 minutos, lançaram uma violenta carga de cavalaria contra os castilhistas.
Os atiradores legalistas, em linha, começam atirando em pé, ajoelham-se e, ao fim, deitados, abatiam os cavalos a baioneta. Muitos lanceiro conseguiram vencer essa barreira humana, chocando-se com o centro da coluna, enfrentando espadas e baionetas a facão. Empregaram também seios de laço, avançando com laços esticados nas cinchas de dois cavalos, sem conseguir romper as linhas adversárias.
Em meia hora de combate recuaram, deixando 91 mortos e mais de oitenta feridos, numa circunferência de 120 metros. Santos Filho, em telegrama enviado de Cruz Alta a 18 de fevereiro de 1894, para o coronel Henrique Guatimosin Ferreira da Silva, afirmou que os maragatos tiveram 120 feridos e 106 mortos. Os republicanos somaram 35 mortos e 15 feridos. Ao entardecer, após enterrarem seus mortos, ocuparam a cidade, encontrando muitos maragatos caídos ao longo do caminho.
Manoel Thomaz Rosendo, pai da historiadora Delma Rosendo Gehem, participou do combate e deixou a informação de que os feridos foram mortos. Ele integrava a banda de música da Guarda Republicana, criada em Passo Fundo, em princípios de 1893. Por motivos óbvios, ficou mais conhecida como Treme-Terra. Essa testemunha chegou a solicitar que seu comandante mandasse a banda do Treme-Terra tocar para abafar o clamor dos feridos. A banda era comandada por José Thomaz Rosendo e as forças passo-fundenses pelo tenente-coronel Pedro Lopes de Oliveira (coronel Lolico). No dia 3 de junho, retornando do Paraná, com seus homens já incorporados à Divisão do Norte, ao passar diante do local em que ocorreu o Combate dos Valinhos os pica-paus pararam “para fazer continência ao campo, que estava ainda lastrado de ossamentas”, segundo deixou registrado o capitão Pedro Carvalho, oficial da Brigada Santos Filho.
O Combate dos Valinhos começou às 11 horas e 35 minutos do dia 08 de fevereiro de 1894 e durou meia hora. No dia seguinte a força vencedora permaneceu na cidade. No dia 10, marchou cedo, alcançando os vencidos “no lugar chamado Povinho – entrada para o Matto Castelhano”. Corridos por cerca de quatro léguas, deixaram mortos pelo caminho. À noite, atacados à margem do rio do Peixe, seguiram perseguidos até o arroio Carreteiro.
No dia 12, com os maragatos desbaratados, Santos Filho retornou para Passo Fundo. Como butim de guerra anotou 2.500 rezes, dois mil e tantos animais cavalares, 14 carretas, vinte e tantos cargueiros, perto de 200 lanças, estandartes, muitas Comblains, Remingtons, Winchesters, Miniés, pistolas, facões, cerca de 200 arriamentos. E concluiu com um “etc”.
Estudando as informações sobre o Combate dos Valinhos chega-se aos seguintes dados: 106 mortos no campo de batalha (Valinhos), mais de 120 feridos ali chacinados, ao som da banda de música do Treme-Terra, integrante do corpo comandado pelo coronel Lolico (Pedro Lopes de Oliveira), mais tarde intendente (prefeito) de Passo Fundo, 19 mortos na perseguição até a cidade, 35 mortos na perseguição até o arroio Carreteiro, totalizando 280 federalistas mortos, além dos que “foram sendo encontrados pelo caminho”. Acrescentando-se a esse número os 35 legalistas tombados no Valinhos, contabilizaremos 325 mortes, 120 dos quais ao som de banda marcial.
O massacre dos feridos chama a atenção pelo grau de violência empregada, fugindo aos padrões violentos da época. Uma vingança pelo ocorrido no Combate do Umbu pode explicá-lo. Nada, porém, justifica o telegrama laudatório expedido por Borges de Medeiros. Mais agrava a emissão do documento, em ter sido emitido por um deputado federal e desembargador, mesmo investido no posto de tenente-coronel legalista. Serve para provar o quanto há de injusto nos epítetos aplicados aos homens públicos, enquanto homens públicos. Um simples “Chimango” (Ibyter Chimango ou Milvago Chimango) não participaria da carnificina ocorrida nos Valinhos entre as 11 horas e 35 minutos e as 16 horas daquele fatídico 8 de fevereiro de 1894. Ato indigno de um simples comedor de carrapatos, pintos e outros pequenos animais; vem mais conforme a coragem de um Polyburos Noll – carancho, para os gaúchos; carcará, para os nordestinos.
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