O Segundo Milagre XIV
XIV
- Farás grandes obras. Usando a tua poderosa influencia conseguirás muitos e bons aliados que apoiaram tantos os teus projectos como as tuas dores que serão infelizmente muitas. É nobre a tua causa.
Neste momento a voz tinha vontade de lhe dizer por quais privações e tristezas teria de passar, mas não tinha esse direito. Não cabia em si o poder de divulgar o futuro sob pena desse mesmo futuro poder ser alterado em função das revelações. Estava ali a comunicar-lhe que tinha um importante caminho para desbravar, mais nada. Além do mais, a sua função, o seu papel entre os mundos é apenas o de captar as boas vibrações nos homens e ajuda-las a caminhar para o paraíso. Ela faria grandes obras em prol do bem-estar do seu povo mesmo que não soubesse disso antecipadamente. A voz tinha que conter-se e assim o fez. Por isso continuou o diálogo não deixando denotar quaisquer indícios de perturbação no seu discurso:
- Experienciarás a dádiva de ser misericordiosa e sentirás a eterna gratidão de todos da mesma forma que os outros te ajudarão nas horas das perdas mais difíceis.
Aqui Leonor não se conteve e teve que interferir:
- Perdas? Dores? De que falas tu voz misteriosa? Diz-me tudo o que preciso saber. Dás-me o privilégio de saber antecipadamente que estou destinada a grandes feitos, mas escondes porém o que me afligirá. Conta-me tudo. Estou preparada. Não me deixes viver nesta angústia permanente da alegria seguida de uma iminente desgraça.
O súbito e doloroso desespero de Leonor ansiava por uma resposta. Mas essa resposta não viria. A voz já tinha falado de demais. O silêncio instalara-se em toda a floresta e o ambiente escurecia dramaticamente anunciando um enorme temporal. Leonor indiferente a tudo o resto voltava telepaticamente:
- Responde-me. Imploro-te!
De novo o silêncio apenas cortado pelo ambiente hostil que se instalara naquele local. Leonor perdia o controlo das suas faculdades e alto e em bom som, já com o seu rosto coberto de lágrimas disparou sobre a mata:
Onde estás? Responde-me? Onde estás? Ah meu Deus. Onde estás?
- Estou aqui minha senhora. Está tudo bem? Estava aqui mais alguém? Guardas! Guardas!
Era a voz do capitão da guarda que acabava de chegar decidido à presa naquele instante para de novo aconselhar a rainha que seria prudente continuar a viagem. Agora nem mesmo a rainha mudaria a sua decisão, mas ao vê-la naquele estado lastimoso percebeu instintivamente que alguma coisa estava errada. Ao seu chamamento, dez guardas reais surgiram de trás dos troncos das árvores próximas e num instante chegavam também lá empunhando a bandeira da desconfiança.
- Está tudo bem. Não há problema algum. – Respondia ao mesmo tempo que inspirava profundamente e enxaguava as suas lágrimas na manga do seu vestido antes de se voltar para o capitão.
No semblante do capitão e dos seus companheiros transparecia um sentimento de cautela. Leonor virou-se por fim para todos e erguendo o seu queixo, confiante e austeramente disse:
Está tudo bem. Vamos prosseguir a nossa viagem. – E sem olhar para trás dirigiu-se até ao local onde a restante comitiva esperava ansiosa a sua chegada. Entrou na sua carruagem e seguiram viagem.
A rainha D.ª Leonor usou todos os meios, a sua bondade, a sua riqueza e toda a diplomacia necessária nos anos vindouros, na precursão do seu sonho de ajudar os pobres e os negligenciados.
No ano de 1485, utilizando toda a ralé disponível do reino (vigaristas, assassinos, e outros parecidos) como mão-de-obra, inicio a construção do primeiro hospital termal do mundo, tendo o mesmo sido concluído na década de 90 do mesmo século. Em volta deste edifício histórico ergue-se a bela cidade que é hoje. Caldas da Rainha. (Coitada. Mal podia sonhar que a índole da mão-de-obra que trouxe para cá se espalharia de gene em gene como uma peste até aos dias de hoje)
Já no séc. XVI, inauguraria em Lisboa a primeira Santa Casa da Misericórdia em Portugal.
O seu marido, D. João II, grande impulsionador da expansão marítima portuguesa e patrocinador da descoberta das Índias morreria em 1495, três anos antes da sua descoberta por parte de Vasco da Gama em 1498.
O seu filho D. Afonso morreria num acidente trágico a cavalo em 1491 com aproximadamente 11 anos de idade.
A Rainha Velha, como ficaria respeitosamente lembrada nos anais da história de Portugal, morreria no ano de 1525.
D.ª Leonor foi sepultada, segundo suas indicações, no Convento da Madre de Deus, em campa rasa, num lugar de passagem, para que todos a pisassem, gesto de humildade que comoveu a nação
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