EPISODIOS TRADUZIDOS XIV
Fragmento ultimo
Pezavam sobre a terra os ferreos tempos:
Da virtude priméva um só vislumbre,
O minimo fulgor por entre as sombras
Da geral corrupção não reluzia:
No seio enorme da reinante infamia
O Averno com seus monstros se acolhera,
E d'ali, vaporando atrocidades,
O mundo transformava em novo inferno:
Inda illéso porém jazia o globo
Das mais tremendas culpas, inda estava
Das maldades o numero imperfeito.
Cinco ministros horridos de Pluto
Crêram que seu terrivel ministerio,
Usado a embrutecer no crime os homens,
Cumpria alçar-se da impiedade ao cume.
Ante o solio de ferro, onde negreja
O deus das maldições, o deus da morte,
Seus projectos expõem, licença rogam,
E á negra execução se deliberam:
Pelo estygio tropel bramando rompem,
Com duros encontrões a turba espancam,
Correm á bronzea porta: eilos no mundo,
E o mundo em convulsões, e o polo os sentem.
De clima em clima se derramam logo,
Ao nunca visto horror dão prompto effeito,
E no abysmo infernal depois baqueam.
«Monarcha tenebroso (exclama um d'elles
Ao fero, que sedento está de ouvil-os)
O plano executou-se: a natureza
Mais não póde aviltar-se: é já quaes somos !
Ouve; e decide quem merece a palma
No desempenho atroz da iniquidade:
Eis o mal, que dispuz, e o que hei cumprido.
Nas amplas margens do orgulhoso Euphrates
Prole de ternos pães, mimosa, e linda,
Zelina, de tres lustros enfeitada,
Zelina em flôr, tão virgem, como a rosa,
Antes que algum dos Zéphyros a engane,
Lanosas ovelhinhas côr de neve,
Mansas, como a virtude, ou como a dona,
Em viçoso retiro apascentava.
O riso no semblante, e n'alma o riso
Trazia a bella, conhecendo apenas
O crime pelo horror, que tinha ao crime:
Ignorava paixões, eram sómente
Amores seus as cordeirinhas suas.
N'um seculo de infamias, de torpezas,
Tão doce candidez olhei com pasmo,
E, quasi em mim domado o torvo instincto,
Ia depondo a raiva, ia esquecendo
Minha essencia, meu voto. Eis indignado
Da vil indecisão, requinto as furias,
No remorso, no pejo, e sou mais monstro.
Acaso a florea estancia, onde Zelina
Na face resumido o céo pintava,
Errante passageiro ia cruzando
De membros gigantêos, melena hirsuta:
A' virgem olha, extatico a medita,
Duvida se é mulher, se é divindade
E n'um suspiro um sacrilegio teme;
Que idéas de algum nume inda lhe restam.
Eu, que attentava no amoroso effeito,
ígneos desejos subito lhe entranho,
Insoffridos, brutaes, a audacia, e furia,
Que o mimo, a graça virginal profanem,
Qual Euro, que em tufões desenfreado,
A bonina gentil das folhas despe,
Lhe esperdiça o perfume, a tez desbota.
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