Luluzinha Vegetariana e os Micróbios
“é que fornecerei, depois de morto, alimento aos animais que me nutriram...” Sófocles, em FILOCTETES.
Luluzinha, menininha adolescentezinha, fragilzinha, mas revoltadinha, certo dia cansou de ser “Animal Pessoa” e quis sair da Natura.
— Não sou onívora como a natureza me fez, sou vegetariana como o senso me fez.
E se recusou a comer outro bichinho. Definhou, emagreceu e pensou que um animal talvez salvasse. Talvez dois, ou talvez três, ou talvez uma salva... E assim pensava:
Se João Antonio e Antonio João dizem que ela é gostosinha, logo ela “tc” com suas amiguinhas para contar que embarcaria na boleia de um caminhão da CEAGESP e só pararia em Porto Seguro do agreste. Do agreste?! A passagem para o bruto ela pagaria com seu corpinho nas mãos do caminhoneiro. Poderiam comê-la, pois ela era Safadinha (sem ser Bruninha), mas ela não comeria mais nenhum bichinho, que é tão fofinho. Ela não era mais da mamãe. Nem da biológica, nem da telúrica. Era da Supernatura.
Por que cismou que a morte da planta é menor que a do bicho? Quem lhe garantiu que planta não sente?
Sente sim! Piriripimpim! Notou o Micro bufão e chinfrim.
– E ademais, falou o Micro sagaz, As duas mortes já estão com ela. No seu rímel, no seu perfume, no seu sapato e noutros quetais. Quetais?!
E a magrela, falou o Micro Requenguela, é insolente, pois se acha melhor que a gente.
O estranho é que aquela cabeça, donde nada saía, firmou pé na resolução e nada comia, e emagreceu, e definhou, e quase morreu, enquanto pensava no animal que salvava. Aliás, pensou (para espanto geral): salvei um, dois, três salamê mínguê. Salvou, talvez, uma salva. Mas isto não pensou, porque ela não sabia que “salva” era coletivo, o qual MODUS OPERANDI, ELEMENTO, não era só o “busão”.
Tornaram a lhe perguntar: quem lhe dissera que a plantinha não sente dodói quando é arrancada, triturada, refogada, assada e comida? Bobinha... Amanhã mesmo, em Harvard, Princeton, Yale e na Faculdade que não gosta de vestidinho curtinho, um sábio dirá que: Sim! Sente, sim! PIRiripim... (foi bom ter-lhe olhado com a cara feia).
No caminho leitoso da Galáxia, instaurou-se RIGOROSO INQUÉRITO para descobrir o que pretendia A ELEMENTO LULUZINHA. Trovões de Zeus cortaram os Céus e as peles zimbelinas; e o balacobaco chegou de vez...
- Oui, oui, disse o Micro francês.
E naquela algazarra pós-incipiente e pré-deprimente; naquele caleidoscópio com jeitão de Falópio, o burburinho do “little Joe”, ou “Zé Povinho”, foi calado pelo ilustre Micro Filósofo, que ordenou:
— Pulemos, para a próxima sub-partícula!
O Pseudomicro Pseudopoeta atendeu-lhe enquanto chupava uma bala toffee.
Continuou o Micro Filósofo:
— Companheiros e Companheiras (antes da Presidenta, vou tomar a saideira) Micros e Bac. (Hã? Bac? Bacteriazinhas patricinhas) nada tem de suave esse momento tão grave. Estalou os olhos e disse: PERGUNTO: quem fez o transunto? (hã?). PERGUNTO: Lulu tem boa intenção ao massacrar uma forma de vida em beneficio de outra? Será? Ou não? Será apenas comodismo, ou modismo, ou avançado estudo do simbolismo russo?
— HÃ?
— Ou estará brincando de ser pobre? Sempre à beira do abismo?
— Pero, poco importa, disse o mano HERMANO, és todo lo mismo!
— O diabo (Ave Maria, cruz credo), falou o Micro Filósofo que não acreditava em Deus: e no Diabo, só depois de conhecer a terra do Tiago; é que ela deixará de alimentar milhões, bilhões, trilhões de nano-animais quando chegar a hora de seu abate.
— SIM! Piriripimpim! Disse o Micro Bufão (e chato). Onde terá ficado a carne que deveria ser dela e nossa?
— Não sei, retrucou o Micro Sagaz.
— Não, não sabe, resmungou o Micro Requenguela, mirando o “buraco negro” de sua panela.
E volta o Micro Filósofo dos Micros Poderes de Foucault:
— É certo que não temos o garbo de um boi pardo.
— Mas bicho é “gente humana”, falou a Bac cigana.
— Somos bichos também, gemeu o Micro Ghost do Além.
— Até Camões já nos citou, disse o Micro Letrado no Pelô.
— Não temos culpa de sermos como somos (isso amiga! Tenha atitude!)
A palavra volta ao Micro Sagaz:
— Por mim tanto faz! Mas se pudesse eu lhe diria: não há Lulu, como sair dessa Roda que a Natureza cria. A minha morte (malditos antibióticos) manter-te-á viva.
— Manter-te-á? Oh! Que lindo! Urrou a turma do “vamos indo”.
— Mas a tua morte, retornou o Sagaz, alimentaria trilhões de pequenos animaizitos. Aliás, tais animaizitos são teus ancestrais, como bem dizem os cabedais.
Retornou o Filósofo que era mais que o Sagaz, embora isso lhe custasse a paz:
— Não te importe só com a altura do decote. Veja Pequena Soraia (ouvira isso de um apresentador de programa policial, mas como era Filósofo de Lei, só assistia escondido na TV do Warley)...
— Hã, hã! Fez-se silêncio para a fala do Micro Sábio, do astrolábio e do alfarrábio:
— Não te importes se somos microscópicos. Existimos. Mormente nos Trópicos. Cuide de nós. De todos nós. Isso sim!
— SIM! SIM! PIRIRIPIMPIM! (chega, cale-se!).
— Não suporte, pequena Soraia Sereia (caraca, isso é cristal na veia), que os bípedes nos maltratem. Prenda o “Bípede Domador” na jaula; faça o “Bípede Latifundiário” refazer o pré-primário; ordene que o “Bípede Torturador dos Rodeios” vá para a Escola dos Sacos Cheios. Faça o “Bípede Caçador” endoidecer da caraminhola de tanto cheirar cola. E faça que todos os outros “Bípedes Covardes” puxem carroças pelas manhãs e pelas tardes.
— Como assim? Falou Luluzinha Pequena Soraia.
—Burra! Quando você mata e come um bicho, só está seguindo o que a Natureza te obriga a fazer. Outros bichos farão o mesmo contigo. Tal como eles, você não está além da Natura.
—Como assim?
—Estúpida e Patética (eles acham que patética é sinônimo de deplorável, ah, ah, ah, não ria, isso é sério). Você já viu os Leões obrigarem os Cervos a serem servos? Já os viu combinando uma tortura institucionalizada chamada “Rodeio” ou “Farra do Boi”? Já viu a lagartixa, o besouro e os outros vermes que comerão teu corpo, torturar antes as suas refeições? Você já viu um pobre animal obrigar um “Bípede” a saltar entre arcos de fogo? Dizer-lhe que o montará (opa!)?
— Como assim? Insistiu a pequena Soraia-Lulu
—Faça "Serzinho Inteligente", que a Vida e a Morte do irmão- bicho seja de tal sorte que ele desfrute da Primeira e seja respeitado na Segunda. Que sua dor seja leve e sua agonia seja breve. Mas ao comer a carne do irmão-bicho não se ache atroz. Nem superior se não o fizer; pois tu, eu e o irmão-bicho somos da mesma matéria e escravos de uma mãe comum. Nossas vidas se alimentam de nossas mortes. Até as das irmãs-plantas. É a Mandala da Natureza. Nós somos a Natureza! Aceite-a, você não está acima dela. Alimente-se sem hipocrisia, pois a Vida não tem hierarquia. Só nós é que temos essa mania. Também há morte em cada prato de Alface mandado para o Sumano...
— Humano?
—Não! Esquece.
—De morte se faz a comida. Quer vegetal, quer animal. Todos morreram para te alimentar. Não se furte da nobre missão de saber que leva no teu corpo o alimento para milhões de animais que só esperam a tua hora. E lembre-se que nem por isso eles te maltratarão, torturarão, escravizarão e usarão para compensar suas pequenas medidas...
—Quais medidas?
—Preciso dizer?
Não se furte de transportar a energia das vidas que acabaram para preservar a tua. Toda morte só se justifica no seu oposto. Repasse a Vida. Todas as vidas.
—Como assim?
Em defesa do bem estar animal. Pelo fim da hipocrisia.
Nota Legal - Texto ficcional, qualquer semelhança com fatos ou com pessoas será mera coincidência.
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