O Ursinho de Pelúcia
Em época de eleições o Brasil vira um ursinho de pelúcia simpático.
Para qualquer lugar que se olhe, obras imponentes. Os jornais mostram a criminalidade diminuindo vertiginosamente. Ruas desertas passam a receber um desfile de policiais. As taxas de juros caem, alguns impostos além de diminuir, chegam a ser suspensos. Milhares de empregos temporários surgem do nada. Aquele dinheiro que os aposentados e doentes tinham para receber há anos aparece da noite para o dia. Multas de trânsito são perdoadas. Os buracos das ruas, aqueles de quase dois anos, são tapados. Postos de saúde são inaugurados a cada semana. O preço da gasolina despenca. A televisão mostra o combate à corrupção; traficantes, sequestradores e quadrilhas de roubo a banco perseguidas a meses, são todos presos em um intervalo de semanas.
Os homens do executivo e do legislativo, aqueles que passam mais da metade do ano no exterior, de repente sentem uma estranha vontade de trocar seus paraísos no Caribe, nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia, pelas vilas do sertão brasileiro, pelas cidades paupérrimas e pelas favelas. Trocam seus Lincon´s e suas Mercedes por jegues. Trocam seus champagnes e whiskies pela cachaça. Trocam o restaurante de luxo onde comem seu caviar por um prato de arroz, feijão, bife e ovo frito num botequim qualquer. Trocam seus aviões por caminhões velhos, acenando de suas carrocerias. Trocam seus ternos italianos por jaquetas surradas e calças jeans. Trocam seus semblantes sérios e arrogantes por sorrisos de palhaços. Trocam sua aversão por crianças por um carinho de babá, pegando ao colo as mais pobres e sujas e distribuindo beijos como pais apaixonados.
E aquele povo que não via carne a meses, de repente se vê em meio a centenas de leitões assados e barris de chopp. Aquele show do artista do momento, que custava um terço do salário mínimo na capital, passa a percorrer as mais insignificantes cidades de graça na praça principal. Campeonatos e projetos de comunidades que batalham ano após ano em busca de patrocínios recebem contribuições vindas de várias partes sem se dar ao trabalho de pedir. Funcionários públicos recebem aquele aumento que estava sendo prometido há anos. Carros de som, bandeirinhas, e cartazes para todo o lado.
E, enfim, no grande dia, milhões de cestas básicas são distribuídas. Gente que nunca entrou dentro de um carro ganha carona em carros importados para ir votar. Materiais de construção são deixados na porta das casas mais humildes. Analfabetos ganham professores que os instruem quanto ao voto. E coisas tão estranhas quanto estas vão ocorrendo por todos os cantos.
Este ursinho de pelúcia tão simpático e festivo que se apresenta a cada dois anos abraça a todos os brasileiros com sua maciez e seu carisma, para logo em seguida devorar a todos com fúria de leão, dilacerando as almas. Mas ele promete: Se forem bonzinhos e se comportarem direitinho, dali a dois anos ele volta a ser simpático e carinhoso e distribuirá muitos beijos e abraçará a todos os brasileiros novamente...
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