Fábula da Ratazana

Era uma Ratazana enorme, porém, magra, pretensiosa e de boa lábia. Alguns apostavam em mau caráter também. Queria ser poderosa e rica, mas especialmente poderosa. Morava na Vila Pequena, em um casebre desajeitado. De quando em quando, olhava, pelo buraco feito janela, a grande Casa do Governante. De quando em quando, via o Governante entrando e saindo daquela que deveria, um dia, ser a sua morada.
Aos poucos, a astuta Ratazana observava a vila e via as necessidades não atendidas e a insatisfação dos ratinhos que ali viviam. Havia um Gato muito esperto, que de tempos em tempos, fazia a festa por ali. Não havia mais segurança e a comida era pouca. Porém, via-se a boa vida da grande Casa do Governante. Aquilo era revoltante! Onde estava a segurança daquele lugar? Onde estava a comida para alimentar as bocas famintas?
Aproximou-se, dia após dia, dos pequenos ratos, insuflando reação e, num ato, que de heróico não tinha nada, como um grande golpe de estado, ganhou a Casa do Governante e o título. De que forma? Bem, são relatos colhidos aqui, ali, acolá.Desencontrados, em alguns pontos. Tornando a Ratazana em questão, ora mais mau caráter, ora menos. "Más línguas que sopram maledicência e agouros assombrosos." Assim ele dizia. Assim seus súditos comentavam. Mas, o que de fato diziam os de visão acelerada? Ah sim, que era um oportunista mal-intencionado, cheio de blá blá blá e que só queria o bem-bom da vida de Governante. É fato que os que não se calaram, em tempo, foram comidos pelo Gato que, novamente segundo às más línguas, foi contratado para tal. Contudo, rato contratando gato? Pois é. Disseram que foi uma espécie de acordo de cavalheiros em que os dois saíram ganhando. A Ratazana não teria mais pedras no seu caminho e as pedras em questão serviriam de refeição ao bichano, contanto que não voltasse à vila, sem a permissão daquele que seria o novo Governante. Isso é o que se ouviu, aqui, ali, acolá.
O que foi visto, todavia, foi, bem no centro da vila, a Ratazana esbofeteando o Gato bem na cara e dizendo palavras ameaçadoras. O Gato foi embora, com olhos de ator, aterrorizados. Era o que estava faltando para total consagração.
Foi um plano audacioso e feliz. Grande festa, comemoração. O melhor de tudo estava ali: comida, bebida, ratinhas dengosas e o melhor, poder. Sua palavra era lei. Mais que isso, sagrada.
A "felicidade" , naquela vila, seguiu, por algum tempo, vitoriosa. O Gato, todos se esqueceram dele, com o tempo. Vez ou outra, algum rato miúdo sumia, mas era tão miúdo, que ninguém se dava conta do sumiço do coitado. A vida era bela e boa...

Então a fábula se despede?

Não. Há ainda muito a fabular. A ainda um ENTÃO para contar.

Então, um belo dia, a fama da Ratazana Governante, por meio da mídia promovida por seus súditos, chegou a vilas bem maiores e mais poderosas. E o Governante da maior delas convidou a Ratazana para uma visita.Lá foi ela toda ditosa.
A Grande Vila era maravilhosa. Muitos ratos e ratas para se "governar". Muito luxo e lixo. Maravilha! A Ratazana que, com a boa vida que levava, engrossou as medidas, engordou, também, os olhos naquilo tudo. Pensou quanto poder poderia ter, se governasse a Grande Vila. Ficou por ali durante uma semana. Atentamente estudando o terreno. Conversou sorrateiramente com os ratinhos e ratinhas, para descobrir a fragilidade do governo daquele cara-de-bolacha. Anotou tudo. Problemas enormes, como a Grande Vila. Olhe aí a grande chance. Aquela vilazinha de porcaria que se danasse com a falta de comida e a visita do Gato. Ali na Grande Vila ele finalmente seria O TODO PODEROSO. Voltou à Pequena Vila, onde governava. Tornou-se obcecado por arquitetar um plano infalível, a fim de se tornar o Governante da Grande Vila e se esqueceu do lugar onde morava. Com o passar do tempo, a população foi ficando mais infeliz e abandonada por sua Ratazana Governante. Chegou a se revoltar, mas o Gato voltou com um gato amigo e muitos pereceram, principalmente os mais revoltados.
A Ratazana finalmente teve a grande ideia. Chamou o gato e entregou a própria vila a ele, desde que arrumasse mais amigos e, numa encenação dramática, aterrorizasse a Grande Vila, engolisse o cara-de-bolacha e se deixasse, junto com os amigos, ser aprisionado pela Ratazana e seus súditos, também chamados puxa-sacos, que já eram muitos, pois quem quer ficar fora de uma boquinha como essa? Somente os trouxas honestos e que prezam a dignidade. O plano continuava: em seguida, após sua ascensão, os libertaria, para se deliciarem com a Pequena Vila.
Trato feito, dia e hora marcados. Ansiosos, Ratazana e súditos vão à Grande Vila salvar a população da invasão dos gatos. Quando chegaram, viram apenas um lugar totalmente vazio. Não compreenderam o que estava acontecendo e não tiveram muito tempo, para entender. No lombo do Gato estava o Governante, com sorriso malicioso. Apareceram do nada. Atrás, alguns gatos lambendo os beiços. Pensou que pudesse enganar um Governante tão experiente como aquele. Grande engano, grande erro. Entendeu, de imediato, tudo o que estava acontecendo. Conseguiu, nos poucos segundos de vida, prever tudo o que aconteceria em seguida e, até, nos dias que se seguiriam.
Sem um Governante para governá-los e com a ameaça do Gato e seus amigos, os ratinhos da Pequena Vila resolveram aceitar a oferta do Governante cara-de-bolacha, da Grande Vila. Abandonaram tudo e foram morar em um local especialmente preparado para eles. E, do fundo da alma, quiseram acreditar que seria bem melhor...

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Lunes, Junio 6, 2011 - 23:59

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Sueli Fajardo

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