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Carta de amor"

Quando me confidenciaste que tinhas ALGO DE DEFINITIVO A DIZER-ME...os teus olhos outrora brilhantes ficaram repentinamente com uma transparência opaca como se fossem olhos envidraçados, quebrados traiçoeiramente por um murro de silenciosa indiferença.
Mal te ouvi dizer essa palavra pus-me a divagar em pensamento, num hábito teimosamente antigo. E como quem ensurdece depois de uma violenta tempestade, respondi-te EM SILÊNCIO, como se fosse um túmulo.
- Algo de de definitivo… amor? Ah… nada na vida é definitivo, só a morte!

Em vez desse pensamento que inundou a minha mente, afogando irremediavelmente o que restava da esperança, respondi-te com uma voz estupidamente embargada
- Não… agora não me digas nada… por favor, peço-te!
Abracei-me a ti a tremer. Talvez tenhas sentido esse tremor traiçoeiro porque de repente foi ele que sacudiu violentamente a convicção envidraçada dos teus olhos inexpressivos e permitiu que os teus braços me entrelaçassem o corpo, numa dinâmica de desejo arrepiantemente fatal. Como um bêbado em abstinência bebeste então os meus beijos, como se eu fosse um cálice de vinho do Porto. Transformaste esse olhar frio num relampejar de foguetes de arraial, e de repente passaste a ser um leão indomável e feroz.
Amaste-me ali no sofá, sem cerimónias, como se fosses meu dono e Senhor. Exploraste o meu corpo numa ânsia de navegador Português, numa rapidez fria de osga assustadiça. E eu entreguei-me de corpo e alma…
Dançaste dentro de mim o eterno tango dos amantes enlouquecidos pelo desejo da carne... e eu entreguei-me de corpo e alma…! Sim... DE CORPO E ALMA!!
Agora quando penso e revivo esses momentos pergunto-me:
- Porque será que nesses momentos de loucura a nossa alma foge de nós? Já pensaste nisso, amor?
Amei-te de corpo e alma… sim, mas perdi-a nesses derradeiros momentos, percebes? é UMA CONTRADIÇÃO INEXPLICÁVEL!
Se me percebes, então… pensa comigo e diz-me:
- Faz algum sentido?
Sei que não! Sei… que nesses derradeiros momentos apenas me sobrou o arrojo e o tempo para te prender as mãos, para esvoaçar até ao céu dos meus desencantos, enquanto as apertava com medo de te perder. Eu soube desde o primeiro instante que aqueles momentos eram uma despedida. Sabias, amor?
Tinhas algo de definitivo a dizer-me, lembras-te? Meu Deus! Porque será que na generalidade, nós, mulheres, somos nesses momentos… tão intuitivas?
Se eu sabia com antecedência o que me esperava depois, diz-me…
Porque permiti que as tuas mãos voassem sobre mim transformadas em mãos de pianista habilidoso a tocar a mais bela sonata?
Porque não te repeli como se fosses um moscardo nojento, se eu pressenti logo no momento em que olhei para os teus olhos, que te despedias de mim?
Não sei…porque permiti que o luar cativo na minha mente, não rasgasse definitivamente as fatídicas sombras daquela noite, quando feito animal esfomeado, me possuíste como se eu tivesse vendido a minha alma ao Diabo!
Porque não te repeli? Anda, meu atrevido, diz-me…
Será que te apercebeste enquanto dançavas incessantemente dentro de mim o ritmo desenfreado dos amantes, que eu chorava nesse momento?
Ou pensaste que essas lágrimas eram fruto de um prazer insaciável e fantástico?
Foi por isso que ficaste ainda mais excitado?
Oh… amor, como te odeio! Sim… odeio-te com a mesma fúria com que odeio a trovoada. Odeio-te ou amo-te?
Definitivamente, ODEIO-TE…! Quero que saibas que seria mil vezes preferível ouvir trovejar em cima da minha cabeça, mesmo que ficasse paralisada em estado de choque, ceifada pelo medo de uma tempestade no meio de uma floresta, do que te ouvir dizer, à laia de sonâmbulo sem escrupulosidade, depois de te saciares do meu corpo exausto.
- Preciso que me dês um tempo… estou confuso. Não sei se é a ti que amo!
- Estúpido…Raios te partam… Estupor… Cabrão… Filho de uma égua…! Odeio-te! Oh… sim… odeio-te!
Porque permiti ser refém do meu próprio desejo? Porque me entreguei de corpo e alma a alguém que se despedia de mim como se eu fosse uma carta fora do baralho?

Odeio-te…oh, como te odeio,amor!!

Autoria: Vóny Ferreira

P.S: - Para que compreendam um pouco a razão porque escrevo em determinados momentos de uma forma mais emotiva, passo a dizer-vos que sou desde miúda, uma espécie de esponja, que absorve todas as lágrimas de todos aqueles de quem goste. Amigos íntimos, familiares, por vezes até desconhecidos por quem nutro alguma simpatia. Esta carta foi inspirada num desabafo de uma amiga que me telefonou a contar pormenores de um relacionamento interrompido abruptamente.
Vóny Ferreira
Maio de 2008

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sábado, junho 7, 2008 - 12:28

Poesia :

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Comentários

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Re: Carta de amor"

Uma carta de muita sinceridade!!!

Bom texto!!!

:-)

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Re: Carta de amor"

Um texto de facto emotivo!
Mas nem sempre o abandono de um dos amantes gera ódio!
Muitas vezes fica só uma enorme tristeza e vazio!
Palavras que merecem estar inseridas numa narrativa excelente!

Abraço

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