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O que quis eu da poesia? Que quis ela de mim? (Alexandre O´Neill)
“Que quis eu da poesia? Que quis ela de mim?
Não sei bem. Mas há uma palavra francesa com a qual posso perfeitamente exprimir o rompante mais presente em tudo o que escrevo: dégonfler.
Em português, traduzi-la-ia por desimportantizar, ou em certos momentos, por aliviar, aliviar os outros, e a mim primeiro, da importância que julgamos ter.
Só aliviados podemos tirar o ombro da ombreira e partir fraternalmente, ombro a ombro, para melhores dias, que o mesmo é dizer, para dias mais verdadeiros.
É pouco como projeto? Em todo o caso, é o meu. O que vou deixando escrito, ora me desgosta, enjoa até, ora me encanta. Acontece certamente o mesmo aos outros poetas, tenham estatuto ou não.
Mas comigo, talvez essa oscilação se dê com mais frequência. É que a invenção atroz a que se chama o dia-a-dia, este nosso dia-a-dia, espreita de perto tudo o que faço.
É o preço que tenho pago para o esconjurar, pelo menos nas suas formas mais gordas e flácidas.”
Alexandre O´Neill (1924-1986), poeta português, techo de abertura do livro de poema "Entre a cortina e a vidrça".
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