SONHOS DE FEITICEIRA

A vida é maluquice,
Uma completa doideira!
É lá coisa que se visse
Fazer assim tanta asneira.

Não é nenhuma brincadeira.
Ser maluco dá uma trabalheira.

Golpear de frente a imundice
Deste profundo mundo capitalista.
Levantar bem alto a nossa crista,
Deixarmos de fazer parte do índice.

Não nos põem num pedestal,
Mas numa cama de hospital.

Porém, nunca estamos sós
Nem nos sentimos poeira,
Mesmo quando apertados nós
Se enlaçam a nós feitos eira.

Não nos atirem à cara areia
Para nos embriagar na cegueira.

Viver na Terra seria uma pasmaceira
Sendo só ser endógeno, maquinado.
Espelhar-se um ser maquilhado,
Um a um, todos iguais lado a lado.

São doidos! Deixar de ser banal,
Pintar a manta, criar, carnaval.

Sentir a criança perpetuada
Dentro, no chacra da barriga.
Trabalhar a doer, ser-se formiga,
Sobreviver na sociedade nauseada.

Vender pecados, sonhos de feiticeira,
Na Feira da Ladra, à terça-feira.

Tudo ao molho na mesma capoeira.
Mas cada uma trabalha sozinha.
Há que ter melhor do que a vizinha
E tentar ser daquela a primeira.

Iniquidade social. Ser anormal
Aqui, onde quase tudo é igual.

Tempo chuvoso, pingo doce.
Mar espumoso, fúria, frieira.
Mesmo se assim não fosse
Seria da mesma maneira.