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Filosofia Moderna e Contemporânea - HEGEL e a DIALÉTICA
HEGEL, GEORG W. FRIEDRICH e a Dialética.
1770 – 1831
Hegel foi um dos filósofos alemães que mais se afamou na primeira metade do século XIX. E tal foi a força do seu Pensamento, que ele continuou exercendo grande influência nos Pensadores do século XX e, provavelmente, permanecerá ativo com os filósofos do século XXI.
Para Hegel todos os fenômenos (as coisas, os objetos, os Seres, os fatos etc. que são captáveis pelos Sentidos [tato, olfato, audição, paladar, visão]) são apenas faces, ou aspectos, de um único “Todo” que ele chamava de “Espírito”, ou “Mente”, ou “Idéia”. Por isso, sua tese central é chamada de Idealismo Absoluto; ou seja, absolutamente tudo que existe é apenas “parte” “face”, “aspecto” de uma “Idéia”.
Essas “faces” ou “aspectos”, incluindo o Ser Humano, em certo momento “desprendem-se do Todo”, cumprem a sua trajetória (ou a sua história), cuja meta é aperfeiçoá-lo, e ao Todo ou ao Absoluto retornam mais evoluídas. Esse processo: Desprendimento - Trajetória de aprimoramento - Retorno ao Absoluto é o que o filósofo chamou de “Dialética” (voltaremos a esse conceito). Nós, Humanos, chamamos esse processo de “História”.
Hegel acreditava que todas as Coisas, Objetos, Seres, Fatos etc. são, como já se falou, partes de um único Todo, ou Absoluto. Por isso, sua filosofia também é classificada como Monista e Idealista, já que concebia a Realidade de forma essencialmente Imaterial e Única; ou seja, não material, abstrata e indivisível. Os nomes que ele escolheu já sugerem essa sua afirmativa, pois Idéia, ou Espírito, ou Mente remetem diretamente para a noção de não matéria.
Com essas primeiras definições já colocadas, adentraremos o cenário em que se formou o seu Ideário. Para melhor compreensão, achamos por bem o uso de subtítulos para os assuntos a seguir:
A História e a Consciência.
A maioria dos Pensadores concorda que os Homens são “Históricos”; ou seja, herdamos coisas do Passado, usamos e modificamos as mesmas e as deixamos para as gerações futuras. A “Linguagem” é um bom exemplo dessa afirmativa. Nós a apreendemos, a usamos e modificamos (com neologismos, gírias, etc.) e a legamos para os Homens que nos sucederão. Idem com as “Ciências”, já que os cientistas usam o Conhecimento existente e acrescentam novos Saberes. Poder-se-ia citar, ainda, outras Instituições, como a Família, o Estado, a Igreja etc. De todos esses exemplos, é possível dizer que os do Presente já são formas modificadas do que existia no Passado e embrionárias do que existirá no Futuro.
RECORTE – note-se que o Ser Humano não inicia sua existência a partir do Nada. Ele já nasce dentro de algum tipo de contexto, o qual, às vezes muda radicalmente no curto intervalo de uma geração.
Todavia, algumas coisas parecem NÃO serem históricas. Num primeiro momento parecem flutuar acima da mudança. Parecem imutáveis. A CONSCIÊNCIA, por exemplo. Tem-se certeza de que aquilo de que se tem consciência (de que se sabe) já mudou ou vai mudar em algum momento. Mas o fato de que se tem a Consciência, ou de “ser ou estar consciente (ie, estar desperto, ser capaz de pensar e decidir, estar ciente – inclusive daquela coisa que se sabe que está mudando) parece que foi sempre igual. Tende-se a crer que sempre foi igual para todos.
Também não é raro que se suponha que as “Estruturas do Pensamento (voltaremos ao assunto)” NÃO sejam históricas, ie, mutáveis. Idem com o tipo de atividade do Pensamento, com as faculdades (ou capacidades) mentais, tais como a memória, a percepção, a compreensão etc. Por um erro, segundo Hegel, achamos que sempre foi o mesmo, para todos, ao longo do tempo.
Essa concepção de que algumas coisas não mudam seduziu grandes Pensadores, dentre os quais Kant, o principal filósofo que antecedeu Hegel. E para se compreender o ideário do nosso filósofo é preciso saber o que ele pensava sobre o Sistema kantiano.
As Idéias de Kant
Como se sabe, para Kant, o modo como o Pensamento funciona e as Estruturas (o que forma, como forma) da Consciência são A Priori, ie, já existem antes de qualquer experiência feita com os Sentidos (tato, olfato, visão, paladar, audição). Por isso, são independentes do que se está pensando, ou do que se tem consciência. Também são independentes de qualquer influência externa e estão livres do Processo de Aperfeiçoamento.
Kant chamou essas Estruturas do Pensamento de Categorias sendo que nelas estão os conceitos, ou as noções de:
1. Causa
2. Substância
3. Existência
4. Realidade.
Vejamos o seguinte exemplo: certa Experiência Sensorial (ie, feita através dos Sentidos [tato, olfato...]) pode nos oferecer conhecimentos sobre o “Mundo Exterior”; porém, não nos ensina, nem nos comprova que o “mundo exterior” existe realmente. E nem seria necessário, pois nós admitimos sua existência, já que, conforme Kant, isto é um “Conhecimento A Priori”. Já sabíamos dessa existência antes de qualquer experiência. Prossegue Kant dizendo que esse “Conhecimento A Priori” é possível porque já nascemos com as “Categorias (as Estruturas do Pensamento)” prontas. Temos essa faculdade, ou capacidade desde o nascimento.
RECORTE - Essas Categorias seriam como “uma fôrma, um receptáculo, um lugar” para acolher e racionalizar os dados captados através da Experiência Sensorial.
No entanto, conforme Kant, essa Estrutura A Priori só nos permite acessar, ou captar, o Mundo, as coisas, os objetos de uma maneira pessoal, subjetiva. Apenas através do ponto-de-vista individual. E isso se torna uma limitação importante, porque existem outros modos de se captar esse mesmo Mundo, coisa, objeto. Ademais, mesmo que existam mil pontos-de-vista sobre o Mundo, objeto, coisa etc. nenhum deles representará, ou captará, a Essência desse Mundo, objeto, coisa etc. Nenhum mostrará como São em si mesmos. Como são realmente. Essa essência Kant chamou de numeno e afirmou que ela não pode ser conhecida pelo Homem, que lhe é incognoscível, porque a Razão (ou o Raciocínio) humana não tem a capacidade para compreendê-la, mesmo se os Sentidos (tato, olfato...) tivessem a capacidade de captá-la.
RECORTE – pela importância do tema, o autor recomenda o estudo da obra de Kant, mormente a “Critica da Razão Pura”, onde o filósofo aborda a questão sobre qual é o limite da Razão ou do cérebro humano.
Tudo que o Homem pode conhecer, segundo a teoria kantiana, é o Mundo dos Fenômenos, ou Mundo fenomênico, ou Mundo da Experiência Cotidiana. Enfim, o Mundo, as coisas, os objetos que podem ser captados pelos Sentidos (visão, audição...) e analisados pelo cérebro.
A Discordância de Hegel.
Ainda que reconhecesse a enorme contribuição que Kant deu à Filosofia, principalmente por ajudar a extinguir certa ingenuidade que permeava a matéria, Hegel se opunha ao Ideário kantiano por acreditar que as concepções do “Mundo em Si”, ou da “Coisa em Si (ie, a essência daquela coisa)” e a concepção sobre as “Categorias (ou estruturas, formatos do Pensamento)” eram apenas “Suposições NÃO criticas (critica= estudo minucioso; logo, Não critica = estudada insuficientemente), ou carentes de estudos mais agudos e de embasamento teórico”.
Para ele, Kant fracassou em pelo menos dois aspectos em seus estudos. Afinal, se existisse o Mundo em Si e o Mundo dos Fenômenos ter-se-ia aí uma duplicidade, com o que ele não podia concordar por ser um ardoroso MONISTA, como já se viu no inicio. Para ele, “Tudo é apenas Um”. Não há diferenças entre Fenômeno e Essência já que “o que existe É o que se manifesta” na Consciência, ou na Razão, ou raciocínio. Manifestação oriunda da Experiência Sensorial e da conseguinte reflexão do Cérebro. Manifestação, ainda, que pode ser entendida como: “o que foi sentido”, ou “o que foi pensado”.
O segundo erro de Kant seria a excessiva quantidade de suposições sobre a origem e natureza (o que é) das “Categorias (as Estruturas do Pensamento)”.
A partir dessas objeções, Hegel chamou a si a responsabilidade de entender e explanar as Categorias, ou Estruturas do Pensamento sem fazer nenhuma suposição, ao contrário de Kant. Aliás, a pior suposição que Kant fez, segundo Hegel, refere-se ao NÃO relacionamento, ou ligação, das Categorias entre si. Kant supôs que cada uma delas fosse racionalmente, ou Logicamente, distinta das outras. Que não derivariam uma das outras.
RECORTE – de todas as Relações, a mais comum – ou universal – é a do contraste, ou oposição. Todo pensamento, ou noção sobre o que é determinada coisa, leva ao seu oposto e depois, a ele se une para formar um todo (a síntese) mais elevado e complexo. Esse “movimento dialético” que embasa o pensamento hegeliano é uma idéia antiga que mereceu de Aristóteles o seguinte comentário: “o conhecimento dos opostos é uno”.
Para Hegel, essas mesmas Categorias são Dialéticas; ou seja, estão em constante mudança já que sofrem em seus interiores o processo de:
Tese x Antítese = Síntese.
E que, tal processo também se verifica no “exterior” das Categorias fazendo com que haja ligações e derivações entre as mesmas.
Para Kant a análise de qualquer Experiência seria imutável. Para Hegel seria exatamente o oposto, afinal, se as Categorias sofriam mudanças, as análises que fizessem também sofreriam alterações.
Tanto quanto, aliás, o próprio Mundo ou coisa (objeto, Ser, fato etc.) que exista. Porque não só os “Pensamentos” se desenvolvem e evoluem segundo esse movimento dialético, mas também as “Coisas” são por ele aprimoradas. Sobre isso, Schelling, contemporâneo de Hegel, disse: há uma identidade de contrários. Fichte, idem, disse: tese, antítese e síntese constituem a formula e o segredo de todo o desenvolvimento e de toda a realidade.
Desse modo, a Consciência (a Mente, o Raciocínio) NÃO seria apenas “ALGO” que está ciente de alguma coisa. Ou um “cérebro” que sabe da existência de certo objeto, ou Ser, ou fato etc. A Consciência (ou estar ciente de alguma coisa) seria, na verdade, parte de um Processo em Evolução. De um Processo Dialético. Ela própria seria uma “integrante ativa desse cenário de constante transformação”.
Hegel e a Dialética
A noção de Dialética é fundamental para se demonstrar e/ou compreender o desenvolvimento interno, imanente, das Coisas, objetos, Seres etc. Hegel, em suas obras, declarou que a sua exposição sobre esse desenvolvimento interno seria feita em quatro etapas que se obrigariam a observar as seguintes determinações:
1. Nenhuma suposição seria feita.
2. Que usaria apenas as noções mais amplas possíveis e que evitaria as afirmativas sem justificativas.
3. Que demonstraria como uma Noção Geral produz outras noções mais especificas ou detalhadas.
4. Que esse Processo acontece inteiramente no interior da própria noção.
Esse quarto item mostra o cerne de Lógica de Hegel; ie, toda noção (tese) contém dentro de si mesma uma contradição (antítese) que só será resolvida com o surgimento de uma nova noção (síntese) mais nova e poderosa.
Uma conseqüência desse Processo Imanente (ie, inseparavelmente contido no próprio processo e que produz seu efeito apenas dentro do mesmo) é que quando nos tornamos cientes, ou sabedores, da Síntese, percebemos que aquilo que se julgou contraditório à tese inicial era só aparente, uma falsa suposição causada por alguma limitação em nosso poder de compreensão.
A Síntese, que é o resultado do antagonismo entre Tese x Antítese, por sua vez, torna-se uma nova Tese que será contestada por uma nova Antítese, ensejando, assim o surgimento de nova Síntese, em um movimento continuo, chamado de “Processo Dialético”.
Nesse processo, o Espírito (tanto o individual, quanto o geral) alcança seguidos entendimentos, cada vez mais amplos, sobre si mesmo e, ao cabo, sobre tudo, até que atinge a “Compreensão Completa” do Todo.
Hegel oferece um exemplo dessa progressão Lógica (ou Racional, por ser fruto de reflexões sobre premissas verdadeiras) logo no inicio de seu livro “Ciência da Lógica”, de 1816, quando se utiliza da noção mais ampla e abrangente do “Puro Ser”; ie, qualquer coisa, objeto, Ser etc. sobre o qual se pode dizer que existe efetivamente.
Hegel demonstra que o conceito, ou a noção, de “Puro Ser” só poderá ser compreendida plenamente se houver uma Negação (um contraditório) da mesma, conforme abaixo:
PURO SER x NÃO SER, ou NADA.
Segundo o filósofo, essa contradição É apenas um “conflito” entre dois aspectos de uma “Coisa Só”, de um “Conceito Único”. Para solucionar o embate, recorre-se a outro patamar, mais elevado, onde o antagonismo cessará. Nesse caso, o Patamar, ou a noção, que solucionará o impasse entre “Ser” e “Não Ser” será o “Vir a Ser”.
(Em sua obra mais célebre, “Fenomenologia do Espírito”, Hegel cita outro exemplo que se tornou famoso: a Dialética do Senhor e do Escravo: o Senhor é Senhor porque é vitorioso e assim realiza seu desejo de ser reconhecido como tal pelo escravo. Mas é a consciência do escravo que reconhece o outro como Senhor, logo, é necessário que os dois antagônicos se juntem para que exista tanto a consciência de um como do outro).
A partir dessa observação, vê-se que o primeiro Conceito, a Tese “Ser”, não era uma noção única, mas era um dos aspectos do Todo, o “Vir a Ser”.
E que a Síntese, “Vir a Ser”, não foi uma solução “trazida de fora”. Ao contrário, já estava no interior do impasse. Para Hegel, o “tornar-se” foi sempre o verdadeiro significado de “Ser” e “Não Ser”.
Obs. O leitor (a) que perceber a semelhança desse Pensamento com o do pré-socrático Heráclito estará correto. Ao cabo, Hegel afirma que o Devir (o eterno movimento) é a base primeira de tudo que há.
A partir desse exemplo é possível conhecer todo o “Sistema de Lógica” hegeliano. A resolução acima demonstrada é apenas o inicio dos inumeráveis “Processos Dialéticos” que se repetem em níveis cada vez mais elevados.
Toda Síntese, enquanto nova Tese terá sua contradição, a Antítese, e do embate entre ambas surgirá nova Síntese que realimenta eternamente todo o Mecanismo.
RECORTE – note-se que o Real (a Realidade) é formado pelo conjunto dos “Processos Dialéticos”, pelas Teses x Antíteses = Sínteses. Note-se, também, que tais “Processos Dialéticos” só existem como produto de Reflexões, Racionalizações.
Logo, O Real (a Realidade) é Racional e vice-versa.
Segundo Hegel todas as Idéias estão inter conectadas e o método para se demonstrar essas conexões é o chamado “Método Dialético”. Ao afirmar que as “Estruturas do Pensamento” são Dialéticas, o filosofo quis dizer que elas NÃO são distintas umas das outras e nem irredutíveis, como Kant sustentava. Ao contrário, elas surgem (ou se revelam, mostram-se) a partir das noções mais amplas (as Sínteses) que solucionam os embates entre Teses x Antíteses. Só se mostram através do “trabalho” que executaram ao solucionar o impasse que havia.
Um exemplo que pode confirmar a doutrina de Hegel seria: o homem contemporâneo armazena ou guarda os fatos que ocorreram em mais de dois milênios de distância do homem da Grécia antiga. Ele guarda mais dois milênios de História. Se, então, as “Estruturas de Pensamento” fossem imutáveis como afirmava Kant, em qual “espaço da memória” ele guardaria esses fatos? Vê-se, pois, que essas “Estruturas” são, na verdade, elásticas, mutáveis e adaptáveis ao uso que delas é feito.
A Dialética e o Mundo
Quando se fala sobre a Dialética de Hegel é comum usar os seguintes vocábulos: emergir, desenvolvimento, movimento e outros de teor semelhante. Essas palavras refletem algo importante sobre o “Método” de Hegel que, como se viu, começa sem suposições e a partir do ponto menos duvidoso, ou controverso, permitindo que noções ou conceitos mais ricos e verdadeiros se mostrem ao longo do desdobramento dialético.
Por outro lado, Hegel argumentava que “desenvolvimentos” são bem mais que fatos da Lógica. Para ele, são desenvolvimentos reais (acontecem de fato no Mundo físico, concreto), que podem ser vistos em toda parte. Inclusive na História, como demonstra o seguinte exemplo: um homem da Grécia antiga e outro da contemporaneidade pensam, é óbvio, sobre coisas diferentes. Para Hegel, as próprias “formas de Pensar” de ambos são diferentes, pois são tipos diferentes de Consciência. São estágios ou etapas diferentes no desenvolvimento histórico do Pensamento e da Consciência.
A primeira obra de Hegel, Fenomenologia do Espírito, de 1807, oferece uma explicação do “Desenvolvimento Dialético” dessas Formas de Consciência, ou Estruturas de Pensamentos. Ele relata os tipos de Consciência que um Homem pode possuir e avança gradativamente até as formas coletivas de Consciência. Com isso ele demonstra que tais tipos de Consciência se encontram externalizadas, “visíveis”, captáveis em períodos históricos, ou em acontecimentos particulares, como se pode ver nas Revoluções Americana e Francesa.
Indo além, o filósofo afirmou que em certas épocas o “Espírito (que é formado pelo Mundo, pelo Universo, por todas as coisas, todos os Seres etc.)” se utiliza de alguns indivíduos, como Napoleão Bonaparte, para “forçar” a “marcha dos fatos”, ou a História, a dar o próximo passo de seu desenvolvimento - pouco ou nada importando os motivos dos indivíduos, que, aliás, ignoram o fato de estarem sendo usados pela IDÉIA, ou ESPÍRITO. O progresso que esses indivíduos deflagram caracteriza-se por “libertar” alguns outros “aspectos (homens) do Espírito” de um estado de opressão política. Vencem tiranias, as quais, talvez, venceram tiranias anteriores.
Essa fantástica concepção de que a Natureza da Consciência altera-se com o Tempo, significa que NÃO há nada sobre os Humanos que NÃO seja de caráter histórico.
Esse desenvolvimento histórico da Consciência, segundo Hegel, NÃO acontece por acaso. Aleatoriamente. Por ser um “Processo Dialético” deve, necessariamente, possuir ao nível individual um rumo, uma direção e, claro, um propósito, uma finalidade. E é justamente essa finalidade que o filósofo chama de “Espírito Absoluto”.
A finalidade do “Processo Dialético” é, ao cabo, fazer com que através da resolução das Teses x Antítese = Sínteses, o Homem assimile gradativamente maior conhecimento até chegar ao ponto em que renega voluntariamente a sua individualidade e retorna ao Todo, de onde saiu justamente para isso. Até que chegue ao ponto de compreender que o Todo, do qual é parte, é o “Espírito Absoluto”, pois tudo é imaterial, tudo é abstrato, tudo é espiritual. E tudo é apenas UM.
Nesse ponto do desenvolvimento, o Conhecimento estará completo, já que a IDÉIA (o Espírito, a Mente) abrange através da Síntese Dialética, tanto quem conhece, como o que é conhecido. Mas o Espírito não existe apenas para abranger a Realidade. Existe para estar “ciente de Si mesmo” e de que é o movimento (ou o “sopro” que causa esse movimento) rumo à abrangência da Realidade, do Real. Segundo Hegel, “A História é o Espírito extravasado no Tempo.
O Espírito e a Natureza
Nesse tópico, Hegel, tece considerações acerca da aparente dissociação entre o Mundo Material e a História Humana. Começa, fazendo a seguinte indagação: o que significa dizer que a Realidade (física, material) É histórica? Na seqüência passa a elaborar a sua resposta à pergunta.
Para ele o que chamamos de “Natureza” ou de “Mundo” é também um dos aspectos do “Espírito”. A natureza, prossegue, deve ser considerada uma sucessão de etapas, ou estágios, em que cada qual deriva do anterior, tornando-se “a verdade” daquele. Por isso é histórica. Mais especificamente aqui, a visão da Dialética aproxima-se da de Platão, por incluir a idéia de aprimoramento através da superação das opiniões opostas.
Também afirmou os “Estágios da Natureza” rumam, marcham, progridem, daquilo que é “apenas vida (ou seja, a natureza como um organismo vivo)” para aquilo “que existe sempre como Espírito (ou seja, aquele mesmo organismo, porém com Consciência de que tudo é o Espírito).
Essa progressão, como não poderia deixar de ser, também obedece ao “Processo Dialético”, porém de uma maneira diferente, pois se trata da Dialética da própria Consciência, onde o “Espírito Absoluto (tanto o individual, quanto o geral)” progride dialeticamente rumo a autorrealização, mostrando as diversas formas que assume enquanto participa do movimento.
Hegel expõe essa progressão iniciando pela Consciência que primeiro pensa em Si como se fosse uma “coisa individual” que existe entre outros indivíduos, ocupando um lugar especifico na Matéria, no Mundo físico, concreto. Posteriormente avança para os estágios seguintes e já não se vê apenas como um indivíduo, mas sim como integrante de determinado grupo social e/ou político. Deixa, por exemplo, “de ser Fabio, para ser brasileiro”. E assim continua evoluindo até que se vê parte do Todo. Vê-se como Espírito Absoluto.
RECORTE – comparar essas idéias de Hegel com o hinduísmo é automático e correto. O filósofo, como outros, bebeu nessa filosofia que, a bem da verdade, é o berço de quase todas as formas de Pensamentos posteriores. Ainda que lhes sejam discordantes.
Espírito e Mente
Na época de Hegel predominava na Filosofia a visão de que existem dois tipos de Entes: as Coisas (os objetos, os Seres etc.) que existem no Mundo Físico e os Pensamentos sobre essas coisas. O pensamento seria uma espécie de fotografia dos objetos.
Hegel afirmou categoricamente que tal concepção era um erro; que as diversas formas de se afirmar a “Dualidade”, ou a separação entre “Coisas e Pensamentos” era um equívoco tão grande que ele chegou a classificar como “um ridículo cenário em que coisas e pensamentos são separados, embora se lhes conceda semelhança, haja vista que o Pensamento é uma imagem das Coisas”.
Seu arroubo, é certo, originou-se de sua forte convicção Monista (que prega: tudo e todos são apenas um) e Idealista. Afinal, a idéia de que as “coisas” e os “pensamentos” são apenas aspectos, faces de um só “Todo Espiritual, um Espírito Absoluto” é a pedra basilar de todo seu Sistema Filosófico.
Hegel dizia que a diferença, a separação, entre Coisas e Pensamentos era apenas aparente; uma ilusão oriunda da ignorância, pois o Pensamento e o Objeto do Pensamento (ie, aquele objeto sobre o qual se está pensando) só parecem separados, distintos enquanto não se sabe que ambos são aspectos, faces de um único “Todo”.
Prosseguindo dentro de seu ideário, afirmou que tal ilusão, ou engano, é superado a partir do Conhecimento de que ambos são aspectos do Todo, que ele chamou de Espírito Absoluto. Quando se vê que existe apenas uma realidade. A realidade do Espírito que (se) sabe e que a reflete em Si. Realidade única, que é tanto o Pensamento como aquilo que é Pensado.
A totalidade do Espírito ou o Espírito Absoluto
Aqui Hegel encerra a sua Dialética. É o ápice do movimento de tese x antítese = síntese que ocorreu em estágios sucessivos e progressivos.
Porém esses estágios anteriores que antecederam o “Gran Finale” não são desprezados pelo filósofo. Permanecem e são mostrados quase que didaticamente como: aspectos do Espírito que foram insuficientemente analisados, pois o que pensamos sobre uma única pessoa NÃO É um elemento separado da Realidade, mas sim um aspecto (uma amostra) de como o Espírito se desenvolve – ou como ele “extravasa no Tempo”. Nas palavras de Hegel: “a verdade é o Todo, mas o Todo é somente a essência que se implementa (fortalece, agrega) por meio do seu desenvolvimento”.
A Realidade é o Espírito (tanto o pensamento, quanto aquilo que é conhecido por esse pensamento) que sofre um processo de desenvolvimento histórico.
Em outros termos, tudo aquilo que se imagina como Realidade (objetos, coisas, seres, fatos etc.) “só existe” no Pensamento, na Idéia, no Espírito. Essa Idéia ou Espírito que abriga o que se chama de Realidade não está inerte; ao contrário, ela se desenvolve dialeticamente, historicamente, através do mesmo processo que cada um de seus aspectos, ou cada uma de suas partes, também sofre.
São Paulo, 02 de Março de 2012.
Bibliografia Consultada e Recomendada:
1. Dicionário de Filosofia – Nicola Abbagno
Ed. Mestre Jou – São Paulo, capital.
Tradução – Alfredo Bosi.
2. O Livro da Filosofia – Anna Hall, editora de projeto e Sam Atkinson, editor Sênior – Londres, Grã Bretanha.
Tradução de Rosemarie Ziegelmaier.
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