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LORINHO DUDU

Lorinho Dudu chegou para nós em novembro de 2002 ainda desempenado, com o bico em formação e com uma das asas quebradas, ficamos todos emocionados, com sua chegada, mas ao mesmo tempo tristes por saber a forma que fora derrubado de seu alto ninho ocasionando a fratura em uma das asas. Que maldade fazem esses caçadores de papagaios! Acolhemo-lo com todo nosso amor e carinho, sem saber como lidar com uma ave aparentemente inofensiva, mas, selvagem por sua natureza silvestre. Informaram-nos que seu alimento nesse primeiro momento deveria ser uma polentinha, um mingau de fubá, pois ainda não sabia comer sementes, e que ele iria adorar. Providenciamos uma gaiola bem ampla e confortável, aninhamos o bichinho dentro e ficamos todos boquiabertos observando como iria se adaptar àquele seu novo lar. Fizemos a polentinha duvidando que ele fosse mesmo gostar sendo um pássaro, mas para nossa surpresa ele devorava a polentinha introduzida em seu bico por uma colherinha, era como se estivéssemos tratando de um bebezinho. Ao comer fazia um balbucio estranho parecido com o coaxar dos sapos e rãs. Ali sem penas com o bico pequenino ainda, arrastando uma das asas, o coitado mais parecia mesmo um sapo do que um pássaro. Com o passar dos dias com o nosso afeto e cuidados ele foi se formando, as penas crescendo lindas de um verde avermelhado e nuances azulados. O bico cresceu, mas ainda arrastava a asa agora mais pesada com penas crescendo. Decidimos levá-lo a um veterinário que sentenciou:
_ Esse já não tem mais jeito, vai arrastar essa asa para sempre enquanto viver, nunca voará!
Inconformado meu esposo resolveu dar um jeito naquela asa enfaixando-a com fita crepe. Por algum tempo ele ficou assim imobilizado com aquelas fitas, quando resolvemos tirá-las percebemos para nossa alegria que a asa havia se ajustado e colado, que não mais a arrastava. Alegria ainda maior foi perceber que podia voar. Ai bateu uma dúvida, um medo: e agora? Deixaremos que se vá? Levaremos ao um zoológico? Será que sobreviverá sozinho? E no zoo? Como reconhecê-lo entre tantos tão parecidos? Tarde demais! Nós e ele já havíamos nos afeiçoados.
Decidimos: ficará conosco! Providenciamos um habitat bem natural: o colocamos em um pé de jabuticaba do quintal de casa. A jabuticabeira nunca mais produziu frutos, mas Lorinho Dudu amou sua nova morada, agradecido ele começou a assoviar, conforme fomos imitando seus assovios e inventando outros, ele ia acompanhando-nos, cada novo assovio que silvava a gente se emocionava, e fomos ensinando-o as palavras... Musiquetas... Ruídos ele aprendia rapidinho, de tudo um pouco fomos ensinando... Já falava e chamava nossos nomes, pedia o papa: “dá papa pro Louro”; “dá o pé louro”; “lorinhoooo” “duduzinhoooo”. Cantava “parabéns pra você”, “atirei o pau no gato”, essa sabia inteira, mas o atropelava para chegar logo no “miauuu”. Ás vezes não se entendia ao certo o que falava, mas sabíamos qual música ele estava tentando cantar, ou nossas conversas anteriores. Aprendeu a imitar o alarme do carro, nos confundindo por vezes, tão bem que interpretava o som. Atendia ao telefone e celular antes de qualquer um, falando alô no primeiro toque. Até rezar a Ave-Maria ele aprendeu, o dia que o povo do grupo MFC vinha em casa rezar o terço, no outro dia ele rezava dia inteiro. Gostava de subir o mais alto que podia na jabuticabeira em um minúsculo galinho de onde poderia enxergar tudo a sua volta e cantava... Quando chovia então ia rapidinho lá pra cima, amava se banhar com as águas da chuva abria suas lindas asas, e cantava feliz.
Perto da jabuticabeira tinha um pé de limão Taiti que vez ou outra ele o visitava também, mas só para passear e brincar derrubando os limões, comê-los nem pensar! Para que pudesse vir mais perto de nós e tivesse mais opções de passeio, meu esposo adaptou uns canos PVC que iam da jabuticabeira, atravessava todo o beiral da edícula e chegava a nossa cozinha onde fazíamos as nossas refeições. Lorinho amou a idéia e passeava pra lá e pra cá... Quando passava perto dos arames do varal ele se dependurava e ia escalando agarrado com o bico e os pés até chegar à janela da cozinha que ficava na outra extremidade. Era bonito ver a habilidosa travessia!
Um dia por necessidade de aumentar a garagem de carros em casa, decidiram arrancar os pés de árvores do quintal dentre elas a jabuticabeira que ficava bem no centro. Lorinho Dudu perdia sua morada! Meu marido engenhoso construiu um poleiro grande com canos PVC, em uma das paredes de nossa casa, que liga a casa e a edícula. Fez uma parte coberta de telhas Eternit e abaixo da cobertura, colocou uma casinha de madeira, pequena, parecida com essas de cachorro, mas que ficava ao alto e dentro dela também um poleiro de canos. Amarrou em um canto as vasilhas de comida e água, e lá Lorinho Dudu foi morar. Ele estranhou muito sua nova morada e começou a voar tentando buscar em vão sua jabuticabeira querida. Já não canta nem assovia mais como antigamente, limita-se a chamar-nos, e pedir o seu papa. Sua diversão preferida é comer sua casinha que hoje já esta pela metade. Nunca dormiu dentro dela em protesto. Só nos dias chuvosos ele se alegra um pouco, canta e faz festa se banhando. Um dia percebendo que estava estressado, pois estava com comportamentos estranhos e cacarejando, isso mesmo, parecia uma galinha! Chamamos uma médica que cuida de animais silvestres, ela jogou uma toalha nele para pega-lo, e realizar a consulta, revelou-nos que ele, ou melhor: “ela”, estava no cio, para nossa surpresa, ficamos sabendo: Lorinho Dudu é uma ave fêmea. Então deveria se chamar Duda? Coitada! Ainda essa! Depois de tantas mudanças, pensamos. No desabrochar da puberdade, tanto tempo sendo chamada de Dudu, será que não confundimos sua sexualidade?
Dudu ou Duda ela sempre foi muito amada e querida, e sabe disso, porque nunca mais se aventurou voar do seu poleiro, resignou-se e é feliz bem pertinho de nós todos os dias.
Depois da visita da médica, qualquer mulher parecida a ela, que se aproxime, ela mostra seu lado selvagem. São os instintos naturais de defesa que nunca se perdem, mesmo morando em cima de canos de PVC, sob telhas de Eternit.

 

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quinta-feira, maio 12, 2011 - 01:04

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