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O Aceno

Depois de 15 dias ela estava indo embora. Já, há muito tempo, havia percebido como encontros e despedidas são doloridos. Minha vida estava marcada por uma série deles há muitos anos. De certa maneira havia criado uma certa película protetora em torno de meu coração, para que esses momentos não fossem tão doídos.
O caminho até o aeroporto é cheio de risos, brincadeiras e alegrias. Mas no fundo a tristeza estava à espreita, à espera de saltar e tomar conta da situação. A saudade, naquele caso, se tornava um paradoxo. Quando ela estava longe a saudade quase não tinha lugar, porém, a pureza do reencontro, o brilho nos olhos quando de um longo abraço após uma infindável espera fazia com que ela renascesse. E a cada dia que passava, junto com o prazer da companhia, a saudade ia crescendo, pouco a pouco, ante o irremediável momento da despedida. Crescia tanto que no dia em que ela ia embora, rompeu a película protetora – como sempre acontecia. Então vinha todo aquele tempo necessário para a reconstrução. Os últimos passos juntos antes da partida, são como que contados. Quase uma contagem regressiva para o clímax da saudade. Pois não sentia saudade enquanto ela estava longe, sentia quando ela estava perto, sempre na penumbra, pronta para devagarinho tomar o seu lugar. A saudade explodia mesmo era na última caminhada antes do portão do embarque, quando com alguns passos e em alguns minutos ela desapareceria da minha vista por um bom tempo. Ela caminha, às vezes um pouco à frente, às vezes ao meu lado. Saltita de alegria, alegria natural pra ela, porém incompreensível (ou inaceitável? ) para mim.À beira do portão de embarque, última fronteira antes da separação, a despedida inevitável e emocionada. Palavras de bênçãos e amor incondicional fazem precipitar algumas poucas lágrimas em mim. Seu sorriso sincero, de que não está triste e que todos os dias passados foram maravilhosos não são suficientes para segurar meu pranto interior. Ela caminha com seu jeito característico, meio de lado, meio que se arrastando e olha pra trás. Fazemos uma vez o sinal característico e rimos de nós mesmos. Mais uma vez ela está indo. Mais uma vez me despeço de alguém que amo. Seus passos são lentos, enquanto meu sofrimento se acelera. É o ápice da saudade. Em nenhum momento eu a sinto mais intensa do que naquele momento. No momento do aceno. Ela se vira mais uma vez e fazemos o sinal característico. Rimos de nós mesmos outra vez. Talvez outras pessoas riam desse gesto, que importa? Ela vai caminhando, se arrastando pelos lados, olhando para o chão e para o vazio. Eu a olho fixamente. Pela terceira vez ela se vira e fazemos o sinal característico, nosso aceno, o momento em que colocamos as mãos no rosto imitando óculos. É o nosso melhor sinal e, às vezes, aquele que pode se transformar na pior careta. Ela continua sua caminhada sem fim e eu, por um momento me distraio olhando para o chão. Justo o momento em que, de repente, ela se vira e faz, pela quarta vez, o sinal, porém eu não vejo no exato instante e quando vou fazer o mesmo, ela já não está me olhando. Fico naquela angústia, torcendo para que ela olhe de novo, para que não vá embora sem um último adeus representado naquele gesto. Fico esperando ela olhar novamente, ansioso para que veja a minha ansiedade. Ela passa pelo raio-x e caminha para o lado, mas não olha para mim. Meus olhos fixos nela, esperando uma esguelha, um átimo, um instante, para a derradeira despedida. Meu coração, angustiado, se aperta de saudade não contida e de uma despedida sem um último adeus. Seus passos miúdos a levam pra longe de mim, sem ao menos eu poder dar... um último aceno.

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sábado, fevereiro 20, 2010 - 23:40

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