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O jornalista

Ricardo ama a notícia. Repórter, formou-se com louvor em jornalismo. Desde criança sempre respondeu que seria jornalista quando crescesse. Agora estava no UltimatePost. Cobrindo notícias policiais. Não era bem o que sonhava, mas era jornalista. E amava a notícia.
Estava cobrindo um assassinato. Na Avenue C. Morto com uma facada no pescoço. Não era muito usual aquele tipo de crime naquela região. Daria pelo menos uma nota na primeira página. Conversou com o fotógrafo, para evitar uma foto explícita demais. Com sorte, a foto também iria para a primeira página.  Pobre coitado. Perguntou ao investigador que estava responsável pela área: - Quem era?
- Não sabemos ainda. Só temos o nome, nos documentos: Anthony Ant. Achou o nome engraçado.
Foi dormir. Sem grandes novidades. No dia seguinte, outro assassinato. Uma facada no pescoço. Na 1st Avenue. Também não era muito normal um crime daquele tipo naquela região. Talvez amanhã sim ganhasse, finalmente, sua notinha de primeira página. A de ontem não deu, tinha entrado uma cobertura grande da reunião de Obama com sei lá quem e não sei lá bem onde. Era jornalista. Amava produzir notícias, mas, na verdade, não se importava muito quando as notícias não eram suas.
O investigador era o mesmo da véspera. – Oi, disse, aproximando-se. – Oi.
- E esse de hoje, quem é?
- Abraham. Abraham Bonnair.
- Então temos mais um serial killer atuando...
- Ei, quem disse isso? Não tem nada a ver. 
- Como não? Morto com uma facada no pescoço....
- Olha, não quero confusão para o meu lado. Se deixar escapar que isso é um serial killer, meu chefe me mata.
- É, mas se eu não disser que pode ser um serial killer, meu chefe é que me mata.
O policial resmungou alguma coisa e fechou a cara. Mas Ricardo teria sua primeira página.
Saiu só uma notinha. Ficou injuriado. Além de tudo, seu editor cortou a expressão serial killer. Na verdade, nem chegou a fazer menção ao crime do dia anterior. Ficou parecendo um caso isolado. Malditos políticos, pensou Ricardo. Depois dizem que a culpa é da mídia de massa, por ficar dando notícias fragmentadas...
Dois dias depois e novo assassinato, desta vez na Broome st. Perto, bem perto dos demais. Com certeza, essa coisa tinha uma ligação. Dessa vez, duas facadas. Uma no pescoço, outra no meio da barriga. O sujeito estava um pouco obeso, então gorduras saíam pelo buraco aberto em sua barriga. Um nojo. Bernard Coleman. Fisicamente, não se parecia nada com os outros dois. O primeiro era negro, os dois outros brancos. Os dois primeiros eram magros. Mas a questão da facada era uma conexão muito forte. E havia a proximidade física.
Nova notinha independente. Brigou com o editor. Ameaçou demitir-se. Já tinha passado por aquilo antes, nunca dava muito resultado. Desanimou. Passaram-se três dias.
E então aconteceu um novo assassinato. Chase Edmond, branco, caucasiano, 42 anos de idade, três facadas – uma no pescoço e duas na barriga. O mesmo investigador. Resolveu conversar.
- É, acho que agora está ficando mais claro que temos um serial killer, não é mesmo?
- Olha, por mim, pode até ser que seja um desses doidos depravados. Como pode ser tudo uma imensa coincidência. Não me interessa. O que quero é pegar esse desgraçado o mais rápido possível.
- Mas, se você quer realmente pegá-lo, tem que entender que é um serial killer. É diferente! Entendendo a lógica dele, você vai conseguir prever o seu próximo crime!
- Veja, isso aqui não é filme. As coisas não acontecem assim na realidade. Pelo que sei, podemos ter centenas de serial killers por aí, agindo agora mesmo, e noventa e nove por cento deles não são pegos. Ou são pegos e não são pegos, sabe como, são pegos mas só por um crime, não se faz a conexão com outros crimes.
- Não estou falando em filme. Estou falando de três mortos, em um quadrilátero de menos de dois quilômetros de lado.
Dessa vez, o editor não pode recusar. Saiu uma notinha na primeira página e a manchete apontava para a ligação: “crimes com facadas intrigam a polícia”.
No dia seguinte, seu editor o chamou: - Olha, Ricardo, você já teve a matéria que queria. Agora concentre sua atenção em outra coisa. Vá cobrir a Feira do Livro pelos próximos dias, ok? - Tudo bem, posso cobrir a Feira do Livro. Mas se acontecer alguma coisa, vou lá para conferir, certo? - Errado, Ricardo. Não é para conferir mais nada. A matéria já foi. O Prefeito ligou. Você sabe, ano que vem é ano de campanha. Não dá para ter um serial killer na cidade nesse momento. - Espera aí, e desde quando é o Prefeito que decide quando dá para se ter ou não um serial killer na cidade? Há um concurso para candidatos a serial killer? Eles têm a license to kill? - Poupe-me das brincadeiras, Ricardo. Esse assunto está encerrado. Encerrado. Esta cidade não tem um serial killer e pronto. Quero só notícias sobre livros, ok?
Terminou a conversa com um ok. Há muito tinha desistido de levar esses embates verbais até as suas últimas consequências. Era contraprodutivo. Preferia acabar concordando e depois fazer o que quisesse.
Foi assim que, logo que escutou na rádio que tinha um assassinato na Essex Street, correu imediatamente para lá. Dessa vez, uma mulher. Emily Hartley. Cinco dias tinham se passado desde o último assassinato. Agora eram quatro facadas, uma no pescoço, duas na barriga, uma na região genital. Tinha um pessoal identificado com coletes do FBI na área. Tentou puxar conversa: - Está piorando, não é mesmo? Não respondeu. Continuou: - O aumento da quantidade de facadas mostra que ele está ficando mais violento, não é isso? O agente virou-se. - Olha, não sei do que você está falando. - Estou falando de um agente do FBI na cena de um crime. Isso é comum? - Estou aqui sim, mas estava passando por aqui. Não tenho nada a ver com a investigação desse crime.
- Como não? Esse é o quinto crime que acontece, nessa região, com facadas, será que não dá para perceber que há um padrão evidente nisso?
- Já te disse, não estou nem sabendo dos outros crimes. Estava passando por aqui, então resolvi parar para ver o que estava acontecendo. Se quer saber mesmo sobre o crime, fale ali com o investigador responsável. Era aquele que eu já conhecia. Não iria adiantar em nada.
Não saiu nada na imprensa. Nenhuma linha. Maldito Prefeito.
Foi para casa. Deitou. Não conseguia parar quieto. Pegou um pincel, daqueles de escrever em cartolina. Passou a rabiscar a parede.
Dia 3, Anthony Ant, uma facada, Avenue C.
Dia 4, Abraham Bonnair, uma facada, 1st Avenue.
Dia 6, Bernard Coleman, duas facadas, Broome Street.
Dia 9, Chase Edmond, três facadas... Qual era mesmo o nome da rua? Tinha anotado em algum lugar, pegaria depois.
Dia 14, Emily Hartley, quatro facadas, Essex Street.
Pegou seu bloquinho de anotações. Chase Edmond, dia 9...Canal Street. Completou as anotações.
Não foi trabalhar. Acordava e ficava horas olhando para a parede. Anotava incessantemente em folhas de papel aquilo que acreditava que poderiam ser padrões. Ficou sem comer dois dias.
Acordou. Estava assim, dormia, acordava, frenético. Bebeu duas doses de whyskey. Olhou para a parede. Anotava.
Dia 3 - 1st morte, dia 4, 2nd morte, dia 6, 3rd morte, dia 9, 4st morte, dia 14, 5st morte. Dia 3, Dia 1. Dia 4, dia 2. Acho interessante essa linha, transformar a série de dias em uma série linear. Dia 6, Dia 3. Dia 9, Dia 4. Dia 14, Dia 5. 1,2,3,4,5. Não, não adiantava muito, não ajudava em nada.
Foi então que pensou nos intervalos. Dia 3 para o dia 4 – 1 dia. Dia 4 para o dia 6, 2 dias. Dia 6 para o dia 9, 3 dias. Dia 9 para o dia 14, 5 dias. 1,2,3,5. Conhecia essa sequencia. De algum lugar. 1,2,3,5. Sim, havia um padrão nisso. Ligou o computador. 21.640.000.000 de retornos. O primeiro da lista: Fibonacci number, da Wikipedia. Era isso! Se contasse a primeira morte como 1 e depois os intervalos entre as mortes, tinha uma perfeita sequencia de Fibonacci!
E os nomes? Sim, tinha algo ali nos nomes.
Anthony Ant, Abraham Bonnair, Bernard Coleman, Chase Edmond, Emily Hartley. Anthony, Abraham, Bernard, Chase, Emily. A, A, B, C, E. Voilá! 1, 1, 2, 3, 5! Fibonacci novamente! Os sobrenomes! Ant, Bonnair, Coleman, Edmond, Hartley. A, B, C, E, H. 1,2,3,5,8!
Estava quase histérico. Riscava a parede. Os nomes das ruas. A mesma coisa. Avenue C, 1st Avenue, Broome Street, Canal Street, Essex Street. Avenue, Avenue, Broome, Canal, Essex. A, A, B, C, E. 1, 1, 2, 3, 5!
Saiu correndo. Ia para a delegacia. Completamente desgrenhado e com ar de bêbado. Quase foi preso. Insistia em contar sua história. Ninguém deu crédito Foi para o jornal. A mesma coisa. Dessa vez, terminou demitido. Afinal, estava sumido e sem dar notícias há alguns dias. Ninguém acreditaria.
*
Johnny era novo na polícia. Tinha apenas dois meses de força. Fazia a ronda. Era noite. Ouviu um grito. Vinha da Howard Street. Correu para lá. Uma cena de filme. Um homem estava em cima de uma mulher, dando facadas. Gritou. O homem não obedeceu e deu mais uma facada. Atirou. O homem caiu de lado. Aproximou-se primeiro da vítima. Tinha levado sete facadas. Uma no pescoço. Não sobreviveria. O assassino, ao lado, sussurrava alguma coisa. Aproximou-se. - Falta a oitava, falta a oitava... morreu. Olhou em seus bolsos, achou um cartão de visitas. Ricardo, do Ultimate Post. Ora, era um jornalista.

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segunda-feira, dezembro 14, 2009 - 16:29

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Re: O jornalista

Parabéns pelo texto.

Um abraço amigo
angelo

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