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O Menino e a Mulher

por Osvaldo Fernandes

Trouxe o menino de volta: o sorriso largo e a vergonha. Vergonha de sentir o toque, de olhar e admirar: vergonha gostosa. Menino feliz, despreocupado. Queria apenas comer os brilhos daqueles vários olhares dela (que colecionou); se fartar. Bastava-se.
Ficava horas fitando-a e, por vezes, sentia-se um girassol: eternamente virado para luz; eternamente cativo pelo sol.
Se o espaço escuro devora estrelas, assim ele se servia, se sentia! Todavia, não havia indigestão: a felicidade era plena, era além.
Corria para seu portão de madeira, ansioso pelos fios de ouro depositados no semblante sério, prático.
Jimmy (que também a admirava) concordava com ele... e eram felizes: um cachorro e uma criança. Jimmy lhe ganhava as gostosuras e o menino, seus olhos, seu ouro, sua presença, sua essência, sua vivacidade.
Ainda que mal humorada (talvez porque a sorte não lhe tinha encontrado na vida), esboçava um sorriso vez ou outra: e era tudo! E era o mais! Mais que ela própria! Uma constelação!
Ai! Como o menino a admirava! Seus olhos — eternamente cativos — fazia-se desejar crescer logo, crescer rápido, crescer desmedidamente! Desejava ser-lhe o homem que procurou por toda vida, por entre homens desacriançados de si. E por tanto desejar, renasceu homem: tornou-se sério; procurou responsabilidade; perdeu o bom-humor e a inocência pueril. Cobrou-se e cobrou-se e cobrou-se. Virou carne demais. Virou homem demais (virou caule). Perdeu-se da própria essência. Foi podado (e foi se podando). A cada dia: mais noites, menos estrelas... e a fome crescia, exponencialmente.
Ah! Que fome daquele olhar! Daquele semblante angelical! Daquele sol! Daquelas luzes! Que fome!
Para Jimmy, ainda criança (ainda cachorro), perduravam as constelações; perduravam as gostosuras:  ela ainda o existia. Jimmy era feliz, mas nunca mais que o menino!
Agora homem, nenhum sorriso, nenhuma vergonha: apenas medo. Um medo daqueles que trazem fraqueza às pernas, aos olhos e ao coração. Medo de errar, medo de decepcionar...
E foi num domingo: chorando ele morreu por dentro. Morreu de medo. Morreu no escuro.
Ela trouxe o menino de volta, mas acabou por mandá-lo embora: quis o homem.

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segunda-feira, janeiro 23, 2012 - 05:36

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