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o quintal

Hoje voltei ao quintal onde brinquei. Vi-o pequeno e abandonado e por momentos vi-me a mim mesmo.

Olhei com ar confuso o barraco cor de tinto onde todos os dias ia para dar de comer aos coelhos e às galinhas.
Mais velho estava, tentando segura-se em pé e tal como quem mais velho está, mostrou-se-me solitário.
E o terreno que o rodeava, ainda tinha o muro de pedra cinzenta, a rede que me segurava e as casotas dos cães.
As ervas e o entulho cresceram, já não há ramada, nem couves nem gatos nem nada.
Dali se via vizinhos, roupa a secar, discussões e brincadeiras e pintaínhos a fugir!
Ali as plantas nasciam, os animais criavam e assim eu cresci.
E vê-se as varandas juntas onde as mulheres tagarelavam, e eu chamava os amigos e se vigiava os quintais.

Não fui ao pátio, esreitei só do muro. Mas sei que o pátio deve estar feio. Sempre o foi!
Húmido, lamacento e infestado de aranhas e minhocas.
Talvez por ser onde se encontravam os alicerces daquelas robustas paredes de pedra,
ou porque o sol nunca lá marcou presença, o que sei é que me lembro de lá lavar as garrafas para ir engarrafar vinho,
ou lavar os cães, ou lavar os comedouros. Tanto lavei eu naquele pátio sujo...

Mas a memória esfuma-se quando mais olho, e a janela da casa de banho é miniscula para tudo o que de lá vi.
Como era do outro lado? E sei que olho para a janela e imagens aparecem - da janela olho. Nem sei que vejo, o que vi do outro lado é agora passado.
E já não consigo recordar de lá ter espreitado para ver quem estava eu onde me encontro agora.

Tenho visões de momentos dispersos, em alturas diversas, onde ali estive sem ser quem agora sou. De fazer o que já não faço.

Há dias tive um sonho com este lugar. Estava em pânico porque não tinha alimentado os animais. Os coelhos, as galinhas, os cães, todos estavam magros.
A Fany olhava para mim com olhar meigo, carregada de pulgas e carraças. Feliz por me ver, mesmo estando eu de mãos vazias e hesitante em lhe fazer festas.
O outro cão ladrava e saltava de felicidade. Já eram pele e osso, mas eu era a felicidade deles.
Eu, aquele que deveria ter cuidado deles e os sujeitei à miséria em que se encontram. Eu...

As galinhas estavam também esqueléticas, faltavam-lhes penas. Havia algumas mortas e debicadas.
Os coelhos fediam. Jaziam na sua própria urina, na sua própria merda.
E acordei...

Na minha insistente memória falhada, continuei a tentar recordar como se fechou esse capítulo.
Sei que não era capaz de os deixar para ali, decerto que algum fim lhes dei!
A Fany lembro-me de a ver na casa da minha avó. Essa cadela era de facto minha, por muito que o dono fosse o meu pai.
Ela mostrava-me isso quando olhava para mim.
Os coelhos e as galinhas concerteza foram para o congelador. Aposto, mas não me recordo.

Seja como for, talvez com a anseância de começar de novo, talvez com a confusão dos acontecimentos de então, e já o disse: não me recordo.
Serão essas memórias guardadas para a velhice? E porque não tenho acesso a elas agora?
Voltei à posição geográfica, ao cenário. Pormenores.

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segunda-feira, janeiro 11, 2010 - 01:43

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GiLagrima

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Re: o quintal

Ai meu amigo, chorei! Suas recordações eram lindas, mas seu sonho era um pesadelar! Maravilhoso texto, abraços

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