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Quando surgir a oportunidade

Quando surgir a oportunidade

Ontem fui tomar o pequeno-almoço a um café perto do meu local de trabalho, que o frequento quase diariamente. Quem me serve, quase sempre, é o filho do dono. Estuda da parte da tarde e de manhã está no café a ajudar o pai. Costumava sentar-me numa mesa, perto de um grande espelho fixado na parede. Mas, ontem, preferi sentar-me ao balcão e aí tomar o habitual pequeno-almoço. Reparei que o rapaz, o Alberto, Berto para os amigos, estava um bocado intrigado pelo facto do pai não lhe ter deixado ir ao cinema com os colegas da turma, na noite passada.
- Mas é que eu queria muito ir ao cinema. Apesar de ir com os meus colegas, ia pela primeira vez a um sítio novo onde poderia experimentar sensações novas.
- Há-de surgir outras oportunidades – comentei, como se aquele fosse um assunto insignificante.
- Quando? Daqui a quantos anos? Todos os meus colegas já foram ao cinema várias vezes, menos eu. Todos eles já viajaram para o estrangeiro, menos eu. Todos eles já andaram de comboio e de avião, menos eu...
Berto estava, nesta confissão, a relatar-me o que os seus colegas conheciam ou já tinham experimentado e ele ainda não. Deveras, havia muitas coisas que ele não tinha feito.
Perguntei-lhe porque não foi ao cinema.
- Meu pai não me deixou.
Com certeza tinha motivos para não o deixar ir. Ou por ser demasiado novo para sair, assim sem mais nem menos, numa noite escura e perigosa, a um sítio onde nunca estivera e depois voltar a altas horas. Disse-lhe isto tudo e Berto respondeu que não vinha muito tarde. Ele gostava muito de ter ido ao cinema.
- Qual era o filme? – perguntei.
Ele não sabia muito bem qual era o filme. Sabia que era uma comédia e que ouviu alguns comentários do filme que os colegas disseram num dos intervalos das aulas.
Ele estava triste. O pai olhava para ele. Talvez por compaixão, não lhe disse nada quando Berto veio sentar-se ao meu lado, ao balcão, para podermos conversar melhor.
- Você já foi ao cinema?
- Sim, já fui muitas vezes.
- E já andou de comboio e de avião?
- Sim, já andei.
- E já conhece outros países?
- Também.
Berto olhou para baixo. Estava á espera que eu lhe dissesse qualquer coisa. Ou então estava á espera que eu lhe convidasse para ir ao cinema ou para andar de comboio. E, ao ver que eu ia começar a falar, olhou rapidamente para mim.
- Berto, que gostas mais de fazer?
Ele fez uma cara de espantado e depois de eu repetir a pergunta, respondeu:
- Sei lá, gosto de ler, por exemplo.
- O que costumas ler?
- Histórias pequenas, contos,...
- E que mais?
- Gosto de jogar á bola. Dizem que jogo muito bem.
- E que mais?
- Andar de bicicleta, passear com o meu cão, jogar ás escondidas, ver televisão, jogar computador, brincar com o meu irmão,...
Deixei-o dizer tudo o que gostava de fazer. Ele estava a gostar de falar comigo, pois reparei que tinha feito um sorriso. Queria que ele percebesse uma coisa e, para isso, achei que era este o caminho a seguir. Continuei o interrogatório:
- Quantos amigos teus gostam de ler?
- Nem todos gostam. Sei que a Luísa gosta muito de ler, ela escreve muitas histórias. O João não gosta de ler nada.
- E quantos amigos teus jogam á bola?
- Quase todos. Só o Eduardo e o Hugo é que não gostam de jogar á bola.
- E andar de bicicleta?
- Eu gosto de andar de bicicleta, porque tenho uma, mas o João, o Miguel e a Rita não têm bicicleta. Não podem andar. Eu tenho um cão, chama-se Tourito. E muitos amigos meus não têm cão.
- Estás a ver, Berto? O que queria que tu percebesses é que tu tiveste algumas oportunidades que outros colegas teus não tiveram. Tu querias ir ao cinema e os teus amigos já foram algumas vezes. Querias andar de avião e de comboio e os teus amigos já andaram várias vezes. Mas os teus amigos queriam ter um cão para brincar, ou um irmão ou uma bicicleta e não têm e tu, Berto, tu tens.
- Pois é! – exclamou.
- Há muitas coisas que tu queres e não consegues ter e há muitas coisas que os teus amigos querem e tu tens.
- Pois é! – voltou a exclamar.
- A vida é assim mesmo. Não te podes reprimir nem ficar chateado com o teu pai só porque ele não te deixou ir ao cinema. Afinal tens muitas coisas boas que os teus amigos queriam ter e não têm, não é?
- É.
Acho que o fiz entender que nem todos podem ter as mesmas oportunidades na sua curta vida. Uns sofrem mais que outros, uns são mais felizes que outros, uns viajam mais que outros, uns sabem mais coisas que outros... O Berto tinha o que os amigos queriam ter e vice-versa. O que temos de fazer é agarrar todas as oportunidades, se alguma nos falhar é porque aquela oportunidade não era para nós, era para o nosso vizinho.
Berto agradeceu-me por lhe ter ajudado e prometeu-me nunca mais ficar chateado com o pai e que ficava para uma próxima oportunidade a ida ao cinema, afinal ainda tinha muito tempo. Quando a oportunidade surgir, então ele vai.

Prémio Literário 2006 - Colectânea de Contos para Viagem no I Concurso de Contos da Editora Arte Literária no Brasil, Dezembro 2006, com o conto “Quando surgir a oportunidade”.

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segunda-feira, julho 5, 2010 - 09:32

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