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Saturnina - 2. Unidade
Saturnina
2. Unidade
Minha pele quase se rompeu quando pelo pulso me segurou, levando-me em direção ao centro do salão. Um movimento súbito. Não sabia o motivo de sua escolha, mas me arrancou da exatidão, da suposta invisibilidade que achava haver alcançado, para o ponto mais evidente da noite. Mas não me opus – mesmo que isso adiantasse para impedi-lo.
Olhou-me com olhos de imensidão, de cólera, de dor. Com um dos braços passados à minha cintura, juntou-me a seu corpo, em asfixia. A outra mão, a minha segurava, indicando a direção de suas intenções. A pele quase enrugada – não do tempo, mas da angústia que a face tentava esconder – se fechou numa armadura, uma carapaça quase intransponível.
Não havia lógica aparente nesta cena: eu e um quase desconhecido a iniciar uma valsa festiva, sem festa para ambos... não concebia seus motivos, nem sua escolha. Mesmo assim, deixava-lhe ser o que anseava ser, buscar o que anseava ter. Logo, a minha entrega seria uma resolução ou uma condenação - tanto fazia, pois me bastava em curiosidade.
A música não nos invade da mesma forma quando apostos estamos. Há estímulos sonoros que envolvem os sentidos, mas não sobressaem à atenção fixada no corpo oposto em mistério – uma ameaça ou uma redenção?
Não sentia mais o vestido ou as anáguas, não sentia os pés ao chão. Apenas a luz dos candelabros que parecia formar um único cinturão energético nos orbitando. Havia olhos em estranhamento que nos seguiam, dando-me uma sensação de vitória e de desdém sobre estes.
O ar quase não me chegava aos pulmões devido ao ímpeto das mãos alheias em me juntar em si, e, em movimentos sinuosos e espaçados de cada volta, quisesse me consumir através da pele, espremer em seus braços para obter a essência daquilo que sou. Os olhos, numa caçada hipnótica de querer sobressair e decifrar, de falar e querer ainda falar, eloquência sem palavras, e todas as palavras de uma vez, não sucumbem ou recuam.
A cabeça vaga em voltas longas e não quer cair nas vertigens do ar rarefeito. E toda angústia que regularmente me preenche de outras sensações – meu caminho pessoal para a consumação do que eu mesma sou - alcança um estado de um alerta pouco evidente - me faz ativa, mas não me pesa, apenas acompanha meu corpo e se faz presente.
E quando acho que estou a desfalecer, a mão que jaz sobre meu dorso me ampara mais uma vez, trazendo-me à realidade. A música quente e cativante termina num rompante e, no olhar igualmente assustador, o homem se abstrai de mim, como se de mim descolasse um pedaço a mais da alma já fragmentada, levando consigo. Aplausos. Sem palavras. Larga-me inerte ao fim desta sequência de voltas, com o mesmo brilho colérico que me fulmina a retina e os pensamentos – e se esvai, sem nada dizer, entre a sebe, a bruma e o luar outonal. Eu, confluência de imagens e sensações, caio em mim novamente, no mundo inaparente que carrego, num alvoroço para tentar compreender a unidade que consigo me transformei por alguns minutos – na guerra que travamos por nós mesmos.
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Comentários
Re: Saturnina - 2. Unidade
Clap!Clap! Bis...
O que valeu esperar. Uma valsa sibilante, no arfar do instante, o jeito cândido de quem morde um sentimento, num luxurioso consentimentos.
Dois passos reais de dança, e quatro na imaginação.
Que te deixou, que te abandonou...Ah canalha que ele foi!
Olha...favoritos!
Re: Saturnina - 2. Unidade
Oh... que honra, Mefistus... mais uma vez! Achava que nem era viável pôr a "minha Saturnina, tão saturniana" aqui... mas vejo que me enganei... há quem a acompanhe nesta valsa com os olhos e sentidos...
Obrigada por não deixá-la sozinha... e ser a ela até solidário...
Obrigada por tudo!
bjs
;-)