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Viagem a Ramelau

Tatamailau


Quando ouvi falar, pela primeira vez, de Ramelau imediatamente a associaram à palavra Lulic, razão pela qual começou a minha curiosidade sobre esta denominação: Lulic.
Ramelau é uma cordilheira que se desenvolve longitudinalmente, dominando a zona ocidental do território timorense. O cume mais alto é o Tatamailau com 2.963 m.
Os timorenses afirmavam convictamente que os indonésios, quando perseguiam a resistência timorense - que se refugiava por lá quando se sentia ameaçada - não conseguiam subir aquelas cordilheiras, mais concretamente o monte Tatamailau. Atestavam que as tropas indonésias desistiam ou morriam a subir aquelas montanhas, porque simplesmente eram Lulic. Sobre esta designação, naturalmente, fui, aos poucos, descortinando que é algo relacionado com o divino, sagrado, proibido ou vedado; tudo que é venerado pelos timorenses é por estes assinalado de Lulic: locais, pedras, árvores, animais, etc. Com efeito, alguns dos objectos considerados sagrados, são religiosamente conservados na casa sagrada: uma-lulic.
Os timorenses preservam com toda a crença tudo o que é designado por esta palavra. Contaram-me as mais variadas experiências relacionadas que descreverei no desenrolar deste livro.
Esta demanda despertou-me uma desmesurada vontade para conhecer Tatamailau, que é, segundo o meu entendimento, o local mais sagrado pelos habitantes desta ilha e produziu uma crescente almejada viagem ao cume mais alto de Timor-Leste que fora, em tempos anteriores à descolonização, o cume mais alto do império de Portugal.

 


A Viagem

 

Eu e o Saulo, naquela semana, combinámos sair no domingo seguinte para a cordilheira de Ramelau com o intuído de subirmos ao cume de Tatamailau.
Reservava o Saulo como um bom amigo; trabalhávamos juntos naquela ilha há meia dúzia de meses. Era-mos sócios duma pequena empresa sediada na capital, em Dili. O escritório situava-se perto do nosso hotel.
No dia anterior, sábado, trabalhamos normalmente e distraidamente sem nos lembrarmos que teríamos de comprar mantimentos para efectuar a senda a Ramelau. Pois, para aquele lugar não haveria, com toda a certeza, restaurantes ou supermercados onde nos pudéssemos abastecer convenientemente…
- Leonardo amanhã sempre vamos a Ramelau? - indaga Saulo sentado na sua secretária.
- Ramelau?... Esquecemo-nos, Saulo... Mas, claro que temos que ir! - afirmo.
- Pois… Mas, não fomos às compras. Não temos nada preparado para a viagem. Precisamos de comida, água, combustível no Jipe e combinar com o Luís, que aguarda a nossa confirmação. - esclarece Saulo.
- Eh pá! Não me lembrei nada desses pormenores, como vamos resolver?! - indaguei.
- O Jony não está cá, está para Darwin, a melhor forma é irmos à cozinha de madrugada, pegámos em mantimentos e depois contámos ao Jony – sugeriu o Saulo.
Depois de várias gargalhadas, das que dão choro, ficou assim combinado ir à cozinha do restaurante do Jony! Este era o Administrador do Hotel onde estávamos hospedados, bem como do restaurante que brevemente será confrontado com um assalto por dois ilustres recém-licenciados à pressa e sem grandes demoras estagiários a ladrões de amplo estilo.
Após o repouso daquelas gargalhadas que perduraram uns longos minutos. Naquele vazio o Saulo sugere-me para abastecer o Jipe de combustível. Apressadamente desloquei-me para a gasolineira habitual, que por sorte ainda aberta e consegui abastecer o Jipe de combustível.
Quatro da manhã! Saímos do quarto, pé ante pé, descemos as escadas, passamos pelo segurança, que dormia profundamente deitado no sofá de perna alçada, atravessamos o corredor em direcção à cozinha. Tendo chegado à porta, rodamos o puxador com todo o cuidado para não fazer ruído e abrimos a porta do restaurante, consequentemente a nossa boa disposição desperta com uma mistura de sorriso e medo, talvez adrenalina, pela aventura de pedir emprestado sem autorização prévia. O meu coração batia fortemente. Embora soubéssemos que estaria tudo bem quando contássemos ao Jony, não estávamos à vontade, pois podíamos ser avistados pelos funcionários e não ficaríamos bem na figura, mas o entusiasmo era tanto que tudo se vencia naquele momento. Atravessamos o salão, desviando-nos das mesas, cadeiras e sem qualquer ruído chegamos à cozinha. Começámos por investigar o frigorífico, vimos um frango e uns pedaços de carne, olhamos em volta e vimos uma geleira.
– Perfeita! - murmurou Saulo
- Precisamos de gelo. – afirmo em surdina.
- Psssst… ouvi algo… - sussurra Saulo.
Ouvimos a porta da entrada do restaurante a abrir e agachamo-nos de imediato debaixo da mesa destapada do centro da cozinha.
- Quem será?... – indago em surdina.
- Não faço a mínima ideia… – responde Saulo do mesmo modo.
Os paços vinham em nossa direcção. Fitámo-nos e estávamos completamente lívidos. A porta da cozinha abre-se e desenha-se um vulto no chão de azulejo branco na entrada. O Saulo agarra-me no braço esquerdo e acena com o dedo no nariz. O vulto entra sem ligar a luz e lentamente se dirige ao frigorífico. A luz do frigorífico atinge a parte do centro do rectângulo da “nossa” mesa. Estava-mos localizados mais acima, quase juntos aos pés da mesa. Facilmente era-mos descobertos se a luz nos atingisse. Ouvimos umas garrafas a tilintar. Deslocou-se de novo em direcção à porta e saiu sem demora, pouquíssimo tempo depois ouvimos a porta principal do restaurante a fechar e a ser trancada com a chave. Ficamos, porém, sem saber quem é que foi à cozinha àquela hora. Saímos daquela posição constrangidos. Ficamos algum tempo em silêncio. Alguns minutos depois desloquei-me à arca frigorífica e encontrei gelo. De imediato o colocamos dentro da geleira, bem como o frango, os pedaços de carne, algumas bebidas e ufa!… Saímos pela porta da cozinha que apenas estava fechada sem ser trancada à chave. Et voilá! Carregamos a mala do Jeep, que nos fora emprestado pelo Jardas, e dirigimo-nos para as portas da frente da viatura…


Jardas

 

O Jardas, um grande amigo nosso, com 1,90 m de altura, pesava por aí uns bons 180 quilos, bonacheirão, com um modo de falar pachorrento e majestoso, com um andar tranquilo, muito embora também usufruía de um andar apressado para as situações mais céleres que o tornavam desassossegado, diria até um autentico tornado em forma humana… Bom, presidia, em Dili, uma importante instituição portuguesa e, com alguma frequência, sentado no cadeirão, refastelado, de frente à sua imponente secretária, de madeira sumptuosa, pegava no telefone, ligava para o nosso escritório:
- Está lá, Sr. Leonardo?... - indaga Jardas, com a sua morosa e sumptuosa voz que lhe era característica.
- Sim, Sr. Eng.º Jardas, estou à sua disposição, faça o favor de dizer. - retorqui.
- Dormiu bem, Sr. Leonardo?... - continuou Jardas de forma pausada.
- Sim, Sr. Eng.º muito bem, obrigado, faça o favor de dizer. – retorqui de imediato.
- Ooooolhe…
- Sim, Sr. Eng.º faça o favor… está?... Sr. Eng.º?...
- Estava a pensaaaaarrr…
- Sim?... Sr. Eng.º?...
- Estava a pensaaaaar… como é que está o apetite do meu caro amigo Leonardo?...
- Como?!... O meu apetite?... Sr. Eng.º, não estou a entender?
- Pois, de facto Sr. Leonardo… Bom, sabe? o Barbichas está com um problema de infestação… o meu apetite está a dar nota de si, faço-me entender caro Sr. Leonardo?...
- O Barbichas com uma infestação? Não sabia, mas de quê Sr. Eng.º?... – indaguei.
- Ora, caro Sr. Leonardo, o homem está a ficar com a casa cheia de bichinhos…
- Bichinhos?... – indago de forma surpreendente.
- Sim, os bichinhos do Barbichas! Ora, aqueles bichinhos com bigodes…! Faço-me entender Sr. Leonardo?...
- Não Sr. Eng.º, não estou a perceber…
- É que o Barbichas tem recebido, semanalmente, pletoras daqueles bichinhos… e nós temos, de certa forma, a obrigação de ajudar o homem na desinfestação. Faço-me entender Sr. Leonardo?…
- Continuo a não perceber Sr. Eng.º… mas… bichinhos com bigodes… oh claro, Sr. Eng.º! Claro! – Declaro com um manifesto sorriso e continuo - Com certeza, peço desculpa pela lentidão de raciocínio, estou convicto que o Eng.º Saulo concordará com essa desinfestação, vou de imediato confirmar com ele, mas para quando Sr. Eng.º?...
- oh, oh, oh, oh… Quando mais depressa melhor, não é Sr. Leonardo?... oh, oh, oh…
- eh, eh, eh… pois claro Sr. Eng.º, então logo à noite?...
- Confirme com o Eng.º Saulo e ligue-me por favor.
- Está muito bem Sr. Eng.º… até já então…
Bom, depois de tamanha engenharia do Jardas para nos deslocarmos ao Barbichas, dei conhecimento ao Saulo que, após umas longas gargalhadas, das que dão choro, disponibilizou-se para tal aventura!
Naquela noite, o Jardas passou pelo nosso escritório e sem demora deslocamo-nos apressadamente para o estabelecimento do Barbichas. Sentados à mesa e com um grande sorriso nos lábios solicitamos os famosos bichinhos… Uns deliciosos camarões tigre, oriundos dos corais do Oceano Pacífico que banha toda a consta timorense, fritos à maneira do Barbichas, como só ele sabe, pois mais tarde, em Portugal, tentei confeccionar de igual modo, mas muito me faltou para chegar àquele inigualável sabor dos bichinhos do Barbichas.
E pronto, o Jardas era de facto um ser humano extraordinário, tinha as duas vertentes bem acentuadas, diria até quase no limite, na fronteira, da tranquilidade e da inquietude, tanto estava demasiado calmo, quer no trabalho quer fora dele, como também passava para o outro lado da medalha como se de um “click” se tratasse…
 

 

(continua...)

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domingo, junho 19, 2011 - 13:58

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