CONCURSOS:

Edite o seu Livro! A corpos editora edita todos os géneros literários. Clique aqui.
Quer editar o seu livro de Poesia?  Clique aqui.
Procuram-se modelos para as nossas capas! Clique aqui.
Procuram-se atores e atrizes! Clique aqui.

 

Voltaire e o Iluminismo francês - Parte IX - O Antagonismo entre Voltaire e Rousseau

Os franceses que acreditam em Deus devem, certamente, agradecer-lhe por terem nascido no mesmo país que deu ao mundo homens como Voltaire e Rousseau.

Ambos, mais que gênios, tornaram-se os próprios sistemas filosóficos que criaram. Em Voltaire, a Razão; em Rousseau, o Sentimento; e na soma de seus privilegiados intelectos, a visão panorâmica do homem em toda a sua complexa grandeza.

E, justamente por conta da excepcionalidade de cada um, alguns estudiosos (como esse modesto escrevinhador) ousam criticar-lhes em aspectos específicos, talvez pelo mau costume de esperar de gênios como eles, a perfeição absoluta.

Assim sendo, se alguma censura pode ser feita ao filósofo Voltaire, talvez seja a de ter tratado com certo descuido as questões políticas, em virtude de sua imersão quase absoluta na luta contra o Clero e contra a supersticiosa ignorância que ele promove.

Aliás, o próprio Voltaire assumia essa falha, proveniente de seu, também assumido, desapego às questões de Estado, de Governo. Em suas palavras:

“A política não é do meu feitio; sempre me limitei a fazer o máximo de meus modestos esforços para tornar os homens menos tolos e mais honrados. (...) Estou cansado de toda essa gente que governa Estados do recesso de seus sótãos. (...) Esses legisladores que governam o mundo a dois centavos a pagina; (...) incapazes de governar suas esposas ou suas casas, sentem grande prazer em regular o universo. (...) É impossível resolver essas questões (as políticas) com fórmulas simples e genéricas, ou dividindo todas as pessoas em bobos e escravos de um lado, e nós do outro. (...) A verdade não tem o nome de um Partido”.

Contudo, ainda que lhe faltasse um apetite mais aguçado para o jogo político, ele tinha bem definidas as suas posições sobre o tema. As principais podem ser elencadas da seguinte forma:

1 - Inclinação para certo Conservadorismo econômico, com a crença no poder da propriedade como indutor de comportamentos mais ordeiros, cuidadosos e produtivos.
2 - Indiferença em relação à suposta melhor forma de Governo, com ligeira preferência pela República, já que para ele “os homens são indignos de governarem a si mesmos”. A posição de Platão a esse respeito – o Governo composto apenas por sábios – era o seu ideal, embora ele reconhecesse a sua impossibilidade (É claro que se ele assistisse ao triste espetáculo atual, a sua posição seria muito mais severa nesse quesito.).
3 - Indiferença a conceitos sem amparo natural ou racional, tal como: patriotismo, nacionalidades, ufanismo etc. Para ele, o patriotismo só significa que “o indivíduo odeia todos os países, exceto o seu”. Por ter tido a oportunidade de viajar muito, ou por ter sido obrigado a exílios, ele não se prendia às ideias rasteiras de glorificação das “causas nacionais” e, por isso, permitia-se admirar a literatura inglesa, a pintura italiana, a Filosofia hindu e a várias outras manifestações do gênio humano, pouco lhe importando donde proviesse. E isso, mesmo que aquela nação estivesse em guerra contra a sua França natal. Aliás, a seu ver, o fato das mesmas guerrearem as nivelava por baixo e justamente por isso nenhuma delas merecia o seu apreço. Apenas as suas Culturas é que recebiam sua aprovação. Em suas palavras:
“Enquanto as nações tiverem por hábito fazer a guerra, não há muito que escolher entre elas. (...) A guerra é o maior de todos os crimes; no entanto, não há agressor que não disfarce seu crime com pretexto da justiça. (...) É proibido matar; portanto todos os assassinos são punidos, a menos que matem em grande quantidade e ao som de trombetas”.
4 - Desaprovação de rebeliões populares, por desconfiar abertamente do povo enquanto agente político. A seu ver, a maioria dos homens está sempre tão ocupada que não consegue enxergar a “Verdade” até que uma mudança a transforme em erro. A história intelectual da maioria dos homens consiste apenas da substituição de um mito por outro.
5 - Discordância da tese que propunha serem todos os homens iguais, no tocante à posse de bens materiais e poderes; todavia, encampava a doutrina dos ingleses que afirmava que todos os cidadãos podem não ser igualmente fortes, ricos e poderosos, mas todos podem ser igualmente livres.

Desse modo e de acordo com essas suas convicções, o filósofo vivia sem atentar para os fatos do mundo exterior. Não percebia, por exemplo, a ascensão que vinha obtendo o filósofo Jean Jacques Rousseau, tanto no meio intelectual, quanto no seio do povo, cativado por seus romances adocicados e otimistas.

Não se dava conta de que o domínio do Racionalismo, que até aquela quadra havia dominado a cena intelectual, estava ruindo e que uma larga fatia do Pensamento acolhia o Sentimentalismo de Rousseau.

Não percebia que a complexa alma francesa, dividia-se entre o que ele representava e o Sistema proposto pelo genebrino, cujos textos emocionavam Paris e o resto do mundo.

Não atinava, em suma, que entre Voltaire e Rousseau desenhava-se o velho embate entre a Razão e a Emoção. Nele, o apego à racionalidade e ao conservadorismo; no outro, o voluntarismo, o ímpeto e o destemor pela revolução nos costumes sociais e políticos.

Porém, em determinado momento não pôde fugir da evidência do confronto e se as diferenças entre ambos não resultaram em declarada hostilidade, também não serviram para aproximá-los.

É certo que os dois mantiveram um tratamento civilizado em relação ao oponente, bem como mantiveram o respeito pelo direito de cada qual ter e expor as suas ideias; mas nem o fato de Voltaire ter oferecido o abrigo de “Les Delices” a um perseguido Rousseau, fez com que surgisse a amizade entre eles. A profunda divergência nas concepções de cada qual, não permitia qualquer composição.

Para Voltaire os argumentos de Rousseau contra a civilização não passavam de um absurdo infantil, já que, em seu ponto de vista, o homem vivia muito melhor agora, na civilização, do que quando estava no “Estado da Natureza”, sob o jugo da implacável “Lei do mais forte”. Para ele, o controle exercido pela sociedade, ainda que falho, permitia atenuar a rapinagem e ferocidade naturais do homem, impedindo o massacre dos mais frágeis fisicamente. Ao contrário de seu oponente, ele não considerava “O homem bom por natureza, tornando-se degenerado apenas por culpa da sociedade”.

Todavia, apesar das divergências com Rousseau e com as novas tendências derivadas de seu sistema, Voltaire concordava que as coisas não estavam indo bem em termos governamentais, eivado de sinecuras, corrupções, perseguições e outros males que proliferam na corrompidas sociedades governadas por tiranos (Recorte do autor – observe o leitor (a) a atualidade desse último parágrafo. A similaridade com o que ocorre em nossos dias, bem mostra o quão pouco se evoluiu nesse quesito).

Uma rara convergência entre ambos que só o espírito democrático da “Cidade Luz” poderia abrigar. De um lado, Voltaire e seus inúmeros seguidores, crentes que seria possível romper com o círculo vicioso e nefasto da Política, de maneira racional, gradual e pacifica; e no outro lado, Rousseau e seus adeptos, confiantes que o deletério círculo só poderia ser rompido com medidas drásticas, radicais, passionais.

E talvez por essa largueza de espírito, é que Voltaire nunca deixou de amar Paris e de se encantar com as suas características redentoras. Ali, encontrava-se o aprisco perfeito para a exuberância de sua inteligência, a qual, mesmo com a sombra das ideias adversárias, não sofreu qualquer déficit de reconhecimento e de consideração. Afinal, na “Cidade Luz” todas as “luzes” convivem, ainda que em castiçais opostos.

No próximo capítulo faremos as considerações finais sobre o Iluminismo e sobre a sua face mais exata, Voltaire.

Produção e divulgação de Pat Tavares, lettré, l´art et la culture, assessoria de Imprensa e de Comunicação com o Público. Rio de Janeiro, Primavera de 2014.

Submited by

segunda-feira, setembro 29, 2014 - 20:43

Prosas :

No votes yet

fabiovillela

imagem de fabiovillela
Offline
Título: Moderador Poesia
Última vez online: há 8 anos 9 semanas
Membro desde: 05/07/2009
Conteúdos:
Pontos: 6158

Add comment

Se logue para poder enviar comentários

other contents of fabiovillela

Tópico Título Respostas Views Last Postícone de ordenação Língua
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - O BARBEIRO DE SEVILHA - Resenhas. Parte II 0 3.034 02/27/2015 - 15:18 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - O BARBEIRO DE SEVILHA - Resenhas. Parte I 0 4.990 02/24/2015 - 20:46 Português
Poesia/Tristeza Ana e a Bala Perdida 0 2.234 02/22/2015 - 15:14 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - CARMEN - Resenha. 0 3.235 02/20/2015 - 18:03 Português
Poesia/Geral A Quaresmeira de Poços 1 1.514 02/18/2015 - 19:37 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - AÍDA - Resenhas 0 4.599 02/12/2015 - 17:09 Português
Poesia/Geral Amores e Realejos 0 2.279 02/09/2015 - 13:17 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - Mme. Butterfly - Resenhas 0 2.327 02/05/2015 - 15:20 Português
Poesia/Amor Infinitos 0 2.081 02/02/2015 - 13:42 Português
Poesia/Amor Recomeços 0 1.039 01/31/2015 - 18:40 Português
Poesia/Tristeza Anjos e Esquinas 0 1.957 01/30/2015 - 19:38 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - Parte IX - Quadro Sinótico e breve Glossário 0 3.860 01/27/2015 - 13:41 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - Parte VIII - A Ópera no Brasil 0 5.666 01/26/2015 - 21:02 Português
Poesia/Amor Aqui 0 1.033 01/25/2015 - 23:26 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - Parte VII - A Ópera Alemã. 0 4.837 01/23/2015 - 19:46 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para inciantes - Parte VI - A Ópera francesa. 0 1.056 01/22/2015 - 23:59 Português
Poesia/Geral A face no espelho 0 2.327 01/21/2015 - 01:09 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes - Parte V - O desenvolvimento da ópera italiana. 0 2.764 01/20/2015 - 18:56 Português
Prosas/Outros A Ópera no Ocidente - Parte IV - Uma breve história - A Ópera italiana. 0 6.538 01/19/2015 - 19:23 Português
Prosas/Outros Ópera, guia para iniciantes - Parte III - Apêndice "O estilo Kunqu" 0 2.852 01/16/2015 - 14:10 Português
Prosas/Outros Óperas, guia para iniciantes. A história da ópera. A ópera chinesa. 0 3.740 01/15/2015 - 20:58 Português
Prosas/Outros ÓPERAS, guia para iniciantes - Parte I - Sinopse 0 2.768 01/14/2015 - 13:12 Português
Poesia/Amor Quartos 1 1.633 01/13/2015 - 21:35 Português
Prosas/Outros Descartes e o Racionalismo - Parte XIV - Apêndice, o Empirismo - segunda parte 0 4.082 01/08/2015 - 14:26 Português
Prosas/Outros Descartes e o Racionalismo - Parte XIII - Apêndice "O Empirismo" 0 3.744 01/07/2015 - 14:37 Português