Noite no campo de ti.
Deitar-me-ei em teu solo por apenas mais um dia, pois me cravam as rosetas de tua pele seca, desidratada e febril. Não posso adormecer em teus sonhos e sentir-me refeita ao amanhecer, pois teus espinhos ficam-me incessantemente e mesmo quando não estão, as pústulas que ficaram das perfurações anteriores vertem o sal de minha alma criando crostas azedas em minha costas nuas. Sou um ser em chagas, cuja saliva esgota-se a cada arranhão de teu solo. Não consigo mais sobreviver nesta sépsis de pelos nús que revoltos grudam-se às lembranças do que um dia foi um chão de alabastro alvo e liso.
Hoje sou o resultado da lepra que carrego, juntando os pedaços que doei pelo caminho, mas como carne espúria, foram queimados na fogueira das vaidades. Então cauterizo-me com as incandescentes brasas dos desejos que queimam minhas mãos burras, que querem agarrá-las sem proteção. Essa sou eu, um coração envolto em uma epiderme em chagas, queimando em ardente febre que consome as horas e os desalinhos de um ser que não se pertence, sem chão para deitar-se, nem catre para esgotar-se até a hora da morte. Por isso permaneço sobre este capim selvagem em que me deito e finco-me com as rosetas de teu chão. Mas mesmo assim, é melhor que estar morta e apenas, apenas a lembrança longínqua de pele exposta ao confortável sol primaveril na enseada do teu mar, onde deitávamos e éramos perfeitos e intocáveis, me conforta, a lembrança de nossos frutos que nasceram fortes a guisa do chão árido de nossas almas, me fazem ainda querer respirar.
Por isso ainda acredito em mais um dia e, mesmo agônica, deito-me à espera de um mágico remédio que cure minhas chagas ao amanhecer.
Há de se saber o destino da vida? Muito menos o caminho da morte. Estamos à deriva deste vendaval que varre os campos sem piedade.
Submited by
Poesia :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 1088 reads
Add comment
other contents of analyra
Tema | Título | Respuestas | Lecturas | Último envío | Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia/Pensamientos | Pasto-gente | 8 | 805 | 04/28/2010 - 17:32 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Meu amigo Cérbero | 6 | 1.064 | 04/27/2010 - 21:36 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Até chegar em ti. | 4 | 1.072 | 04/27/2010 - 16:43 | Portuguese | |
Poesia/Pensamientos | Depois que o barco fantasma passa. | 4 | 1.012 | 04/27/2010 - 16:31 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Coração | 11 | 987 | 04/26/2010 - 14:44 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Quente? | 10 | 1.030 | 04/21/2010 - 21:28 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | A duas vozes. (duo Nuno Marques e Ana Lyra) | 4 | 1.226 | 04/19/2010 - 16:56 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Quase amor | 3 | 877 | 04/19/2010 - 16:49 | Portuguese | |
Poesia/Comedia | Não aprendo! | 3 | 759 | 04/17/2010 - 13:32 | Portuguese | |
Poesia/Fantasía | Último pedido | 12 | 1.309 | 04/15/2010 - 03:55 | Portuguese | |
Poesia/Erótico | Desejo carnal | 9 | 1.724 | 04/14/2010 - 01:37 | Portuguese | |
Prosas/Cartas | Masturbação (dueto Ana Lyra e Vony) | 6 | 2.392 | 04/12/2010 - 19:15 | Portuguese | |
Poesia/Pasión | Masturbação (dueto Vony e Ana Lyra | 6 | 790 | 04/12/2010 - 15:31 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Pensamento aprisionante | 12 | 1.237 | 04/12/2010 - 15:28 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Hoje | 6 | 1.115 | 04/12/2010 - 15:25 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Paradigma | 5 | 807 | 04/12/2010 - 15:09 | Portuguese | |
Poesia/Meditación | Crescer? | 4 | 1.114 | 04/12/2010 - 14:28 | Portuguese | |
Poesia/Dedicada | Dança comigo, amigo poeta( para Fabio Vilela | 3 | 925 | 04/10/2010 - 21:51 | Portuguese | |
Poesia/Dedicada | Dança comigo | 6 | 1.166 | 04/10/2010 - 17:20 | Portuguese | |
Poesia/Amor | Por favor | 6 | 1.500 | 04/09/2010 - 17:40 | Portuguese | |
Poesia/Intervención | Grito contido | 15 | 1.558 | 04/01/2010 - 17:28 | Portuguese | |
Poesia/Aforismo | decisão | 3 | 862 | 03/29/2010 - 15:37 | Portuguese | |
Poesia/Comedia | Meu requiém | 6 | 933 | 03/29/2010 - 09:13 | Portuguese | |
Poesia/Comedia | Moira por favor não deixe meu sol se por | 2 | 615 | 03/28/2010 - 17:17 | Portuguese | |
Poesia/Dedicada | Ler um poema de amor | 5 | 915 | 03/27/2010 - 21:42 | Portuguese |
Comentarios
Re: Noite no campo de ti.
Tão triste que chega a doer-nos,
tão belo que me deixa sem palavras.
Gosto muito também de te ler neste registo.
Um beijo, Ana e... força!!!
Vóny Ferreira
Re: Noite no campo de ti.
"Por isso ainda acredito em mais um dia e, mesmo agônica, deito-me à espera de um mágico remédio que cure minhas chagas ao amanhecer."
Em teu texto, uma imensa dor e uma sempre esperança, força que nos permite continuar!
Um beijo, amiga, no aguardo deste mágico remédio!
Lila.
Re: Noite no campo de ti.
Um capitulo sugestivo, numa prosa intimista e alucinante na forma e na acção.
Sempre fantástico te ler!
Essa sou eu, um coração envolto em uma epiderme em chagas, queimando em ardente febre que consome as horas e os desalinhos de um ser que não se pertence, sem chão para deitar-se