Casimiro de Abreu : ***
Pobre criança que te afliges tanto
Porque sou triste e se chorar me vês,
E que borrifas com teu doce pranto
Meus pobres hinos sem calor, talvez;
Deus te abençoe, querubim formoso,
Branca açucena que o paul brotou!
Teu pranto é gota de celeste gozo
Na úlcera funda que ninguém curou.
Pálido e mudo e do caminho em meio
Sentei-me à sombra sofredor e só!
Do choro a baga umedeceu-me o seio,
Da estrada a gente me cobriu de pó!
Meus tristes cantos comecei chorando,
Santas endechas, doloridos ais...
E a turba andava! Só de vez em quando
Lânguido rosto se volvia atrás!
E louca a turba que passou sorrindo
Julgava um hino o que eu chamava um ai!
Alguém murmura: - Como o canto é lindo! -
Sorri-se um pouco e caminhando vai!
Bendito sejas, querubim de amores,
Branca açucena que o paul brotou!
Teu pranto é gota que mitiga as dores
Da úlcera funda que ninguém curou!
Há na minh'alma alguma cousa vago,
Desejos, ânsias, que explicar não sei:
Talvez - desejos - dalgum lindo lago,
- Ânsias- dum mundo com que já sonhei!...
E eu sofro, oh anjo; na cruel vigília
O pensamento inda redobra a dor,
E passa linda do meu sonho a filha
Soltas as tranças a morrer de amor!
E louco a sigo por desertos mares,
Por doces veigas, por um céu de azul;
Pouso com dia nos gentis palmares
À beira d'água, nos vergéis do sul!...
E a virgem foge... e a visão se perde
Por outros climas, noutro céu de luz;
E eu - desperto do meu sonho verde -
Acordo e choro carregando a cruz!
Pobre poeta! na manhã da vida
Nem flores tenho, nem prazer também!
- Roto mendigo que não tem guarida -
Tímido espreito quando a noite vem!
Bendito sejas, querubim de amores,
Branca açucena que o paul brotou!
Teu doce pranto me acalenta as dores
Da úlcera funda que ninguém curou!
A minha vida era areal despido
De relva e flor e na estação louçã!
Tu foste o lírio que nasceu, querido,
Entre a neblina de gentil manhã.
Em ondas mortas meu batel dormia,
Chorava o pano a viração sutil,
Mas veio o vento no correr do dia
E, leve, o bote resvalou no anil.
Eu era a flor do escalavrado galho
Que a tempestade no passar quebrou;
Tu foste a gota de bendito orvalho
E a flor pendida a reviver tornou.
Teu rosto puro restitui-me a calma,
Ergue-me as crenças, que já vejo em pé;
E teus olhares me derramam n'alma
Doces consolos e orações de fé.
Não serei triste; se te ouvir a fala
Tremo e palpito como treme o mar,
E a nota doce que teu lábio exala
Virá sentida ao coração parar.
Suspenso e mudo no mais casto enlevo
Direi meus hinos c'os suspiros teus,
E a ti, meu anjo, a quem a vida devo
Hei de adorar-te como adoro a Deus!
... - 1858.
Submited by
Poesia Consagrada :
- Inicie sesión para enviar comentarios
- 1495 reads
other contents of CasimirodeAbreu
Tema | Título | Respuestas | Lecturas |
Último envío![]() |
Idioma | |
---|---|---|---|---|---|---|
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Juramento | 0 | 503 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Perfumes e amor | 0 | 799 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Segredos | 0 | 450 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Clara | 0 | 480 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Dedicada | Casimiro de Abreu : A valsa | 0 | 1.572 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Borboleta | 0 | 381 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Quando tu choras | 0 | 686 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Canção do Exílio | 0 | 542 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Minha Terra | 0 | 394 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Saudades | 0 | 375 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Canción | Casimiro de Abreu : Canção do Exílio | 0 | 1.503 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Minha Mãe | 0 | 623 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Rosa Murcha | 0 | 817 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Juriti | 0 | 460 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Meus oito anos | 0 | 455 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : No álbum de J. C. M. | 0 | 999 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : No Lar | 0 | 413 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Moreninha | 0 | 723 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : Na rede | 0 | 459 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/General | Casimiro de Abreu : A voz do rio | 0 | 490 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Novela | Casimiro de Abreu : Carolina – Capítulo I : Adeus | 0 | 1.476 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Novela | Casimiro de Abreu : Carolina – Capítulo II: Caiu! | 0 | 1.373 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Novela | Casimiro de Abreu : Carolina – Capítulo III : A Volta | 0 | 1.182 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Novela | Casimiro de Abreu : Carolina – Capítulo IV : Deus | 0 | 1.287 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese | |
Poesia Consagrada/Novela | Casimiro de Abreu : Carolina – Capítulo V : Perdão | 0 | 1.282 | 11/19/2010 - 15:54 | Portuguese |
Add comment