Uma carta

Depois de finalmente me ter conseguido libertar e ter começado a pensar em tentar confiar em alguém, depois disso tudo, perdi a hipótese de deixar entrar alguém na minha complicada forma de existir. Será sempre assim? E agora nada mais há a fazer... desististe de mim...e eu, mesmo agora, não sei (ou não consigo admitir) o que senti ou sinto por ti...é este o meu fado...a indecisão...o sentimento indecifrável...nunca poder ou saber ou conseguir arriscar...Ser demasiado cautelosa ironicamente faz-me sofrer mais. Sei que apenas sobrevivo...sei que não vivo...só o pensar na imensa tristeza que sinto me faz dar-me algum descanso deste tormento...que dura há tanto tempo...só tendo cessado no período infame de tempo em que decidi existir no engano...nesse doce envenenado engano... Vislumbres de histórias de amor, pessoas felizes, causam-me um torpor imensurável...corroem-me a alma (ou o coração?). Desconheço-me...do outro lado do espelho não me sinto como pessoa una...como poderei estar perante outro alguém que não possua semelhantes fragilidades? Porventura, teremos todos alguma fragilidade...talvez por isso eu exista sem que me julguem...ou reparem a fundo na minha solidão. Solidão...é mesmo isso que sinto...eterna, profunda, cortante...insistente...tal como o arrependimento que agora sinto...por não me ter permitido gostar de ti... sim, é a ti que me dirijo... peço-te desculpa... reconheço que brinquei, involuntariamente, com a tua própria (porventura) e não revelada fragilidade...talvez por isso te sintas com razão em me abandonar, de certa forma...fizeste-o...quem sou eu para te culpar ou julgar? Nem sequer te dei uma oportunidade para seres tu próprio...comigo...mas também não me permiti ter essa oportunidade...perdemos os dois...sempre...nunca saberemos o que perdemos... e foi o receio irracional de que o que podia ser construído me viesse algum dia magoar , por não ser suficiente, que me levou a afastar-te... mesmo com todos os indicativos (que coexistiam com confusos pensamentos) na minha mente que me diziam o que sentia por ti...não deixei que nada acontecesse...só quando te afastaste eu percebi a falta que me fazias...e mesmo assim sempre a cruel incerteza não me larga... apesar do terrível arrependimento.
Não consigo perceber como durante tantos meses contiveste esse sentimento...mas também não percebo como pudeste afastar-te tão rápido e aparentemente de forma tão abrupta...apesar das minhas tentativas para não te deixar ir...se ao menos eu soubesse o que sentias para além disso...mas sei que não te deixei ser como tu és... tentei mudar-te...não por não gostar de quem és (por muito contraditório que isto possa soar) mas pelo facto de que o teu silêncio apenas fazia crescer cada vez mais o meu medo e a minha insegurança... como dói hoje pensar que podíamos ter construído algo juntos...ou pelo menos tentado...admito aqui que a culpa está do meu lado...a insegurança é só minha e tu nunca podes ser culpado de uma coisa como essa...
Sinto-me vazia pois acredito em algo que não consigo viver...defendo algo que não me deixo experimentar...Espero que me perdoes... Tudo o que alguma vez te disse e te magoou era apenas um apelo desesperado para que me perdoasses...e me aceitasses com todos os meus medos...e que agora vejo ter-se revelado como uma tentativa muito egoísta de te recuperar...
Repara: um desabafo só meu tornou-se no fim numa carta para ti...Nada mais te peço senão que a leias...e depois de leres guarda apenas o que de bom ficou entre nós...
 

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Jueves, Febrero 10, 2011 - 15:04

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