Alma em Terra

Alma em terra

Ia por aí e parei
Desceu em mim uma sensação ocre
no arrepio de uma imagem espelhada
Confuso, de face fria
são-me familiares estes afectos

Só tenho esta memória:
uma estrada por onde vou
Vivo-a para sentir que existo
guiada por dois muros fronteiros
e lá gostaria de ficar

Ninguém a viu
mas cabem lá todos os mundos
no tamanho de um segundo infinito
recortando essa luz estranha e única
entre melros que se atravessam

Aparece-me sempre esta linha:
dúbia e imaculada
no limite de uma vegetação rasteira;
um horizonte desmedido
União de um amarelo velho e um verde gasto

São quatro dimensões:
três para a carne
uma para a alma
Mas o tempo não existe
agora que me vejo a alma em terra

Aqui encarnou a solidão
em espaço e luz
Vivi-a fora do meu corpo
e senti a textura da minha imagem
Sentei-me nela e abracei-a

Feita de caminho esquecido e remoto
podem comer-se as nuvens
entre muros barrocos de pedras salteadas
com sabor a mar intenso no alto
A minha solidão existe
Eu estive lá