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AURORA
AURORA
Da fantástica realeza
de um céu mirabolante
brota a vontade de sua alteza
o grande deus navegante:
descobrir novas terras
catequizar novos povos
conduzir almas tenras
à justiça de evangelhos gasosos;
retirar os aborígenes da solidão
tranqüila que lhes dá Tupã, o astuto,
e conduzi-los à crucificada escravidão
libertária da Santa Empresa Ind. Com. de Indultos.
Do Portugal longínquo, confim europeu,
partiram naves aproando ao desconhecido.
Belonaves carregadas de um deus
marítimo, marinho, maresiítico
que carregava nos pulmões
o ar salgado de procelas místicas,
a valentia de vencedor de tufões
que lhes rasgavam as latinas,
que deixavam a descoberto o coração
salgado, aturdido, curado, recrudescido
pelo sal, sol, lutas e diva solidão
do deus mercador marítimo.
Em pleno mar, outrora
habitado por feras monstruosas
pergunta-se o trabalhador do mar,
das águas tortuosas:
-O que procuras, marujo?
A si mesmo responde: por uma aurora
que resplandeça o coração sujo
dessas raças sem deus ou glória.
E partem, cabrais financiados
caminhas assalariados
para enfiar em índio confiado
as culpas de um cristo justiçado.
Quando ao longe apontou a verga
Tupã guinchou, saltou de galho em galho,
ordenou:-Que a noite se erga!
E imenso breu tentou ocultar a ilha do barco.
A noite que trouxe a esquadra
trouxe os olhos grandes capitâneos
trouxe a fome e sede das galés
a beata, a prostituta e a ladra
condenou a caldeirões satânicos
a massa sintética de nossas ralés.
A esquadra que trazia a Aurora
deixou a noite em nosso porto,
à usura de capitães frustrados
trazidos de todos os mares
a amargura de marujos embriagados
que nunca mais deixaram nossos bares.
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