Falar ao vento!

Falar ao vento!
Eu falo ao vento que passa,
Que faz a brisa do mar,
Que leva o perfume da flor,
Que canta no arvoredo,
Que faz o furacão,
Que dilui a fumaça,
Digo-lhe do meu segredo,
Falo-lhe da minha dor.

Eu falo ao vento que passa,
Quando sopra bem cedo,
Por ele envio o meu recado,
Para que leve de graça,
Este meu segredo,
Que trago tão bem guardado.

Eu falo ao vento que passa,
Que soprando minhas lágrimas limpa,
Fazendo o meu olhar brilhar,
Para que diga a quem me faz negaça,
Que o meu recado sinta,
Que pare para me falar.

Eu falo ao vento que passa,
Quando suave o faz por mim,
Dando-me a sua frescura,
Que é a sua grande graça,
E como ele ninguém passa assim.
A não ser para me dar tortura.

Eu falo ao vento que passa,
Sim, falo-lhe sempre,
Mesmo que eu esteja cansado,
Ou que a paciência seja escassa,
Digo-lhe da minha alma carente,
Por ele envio o meu recado.

Eu falo ao vento que passa,
Sim, falo-lhe mesmo que a voz me doa,
Dizendo-lhe que o silêncio tem voz,
Que fere quando fica calado,
Que mais que muitas palavras ele magoa,
Quando nos deixa a falar sós.

Eu falo ao vento que passa,
Até quando estou a dormir,
Enviando o meu pensamento,
Mais veloz que o próprio vento,
Porque este perde tempo a zurzir,
Eu falo ao vento que passa.

José Sereno