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Gerês.
Numa gélida montanha nórdica
paredes meias com a evolução nipónica
residia um velho poeta que vivia num casebre
o tempo fugia-lhe das mãos como uma lebre
bafo de incenso perfumava a assoalhada
este velho com a idade ficou com a mente baralhada
foram milhares de versos e parábolas
vivia dentro do mundo doido das fábulas
a caneta era o vaivém que o levitava
ao marasmo social ele não se habituava
sorvia cada vez mais fantasia e paralelismo
reincidente na incursão no oculto e no secretismo
surrealismo era tópico assente na sua agenda
foi deixando legado para o filho seguir a sua senda
do seu escritório emanavam vapores e mistérios
lia sobre guerras coloniais e a sua extracção de minérios
bruxarias nas terras africanas com bonecos e agulhas
hipotálamo incandescente que libertava efervescentes centelhas
durante décadas manteve-se à aparte da sociedade
amor extremo à arte que lhe toldava percentagem elevada de sanidade
a sua saúde era instável num furacão de internamentos e medicação
foi se apagando a chama que fervia intensamente no seu coração
tosse e falta de memória foram os sintomas da morte
nas mãos do destino irónico jogou a sua pouca sorte
septicemia colou o seu corpo no interior de um cinzento caixão
mas a escrita manteve-se vivia e viçosa, a sua única paixão
seu filho afogou as mágoas em versos e sonetos
construindo uma pirâmide de saber e cultura para filhos e netos
agora eles se deliciam com tamanha profundidade verbal
de que existia o culto à literatura estas escrituras são prova cabal
dormem embalados pelas letras dançantes que lêem dos poemas e prosas
religiosamente redigidos pelos antepassados em situações melindrosas...
Gerês, 17:20, 18/10/1921...
P.S: Esta história foi conseguida depois de anos e anos de pesquisa nas gélidas encostas do Gerês.Foram encontrados registos em papel envelhecido, carimbado a sangue, comprometi-me em manter em sigilo o local onde encontrei tal relíquia...
Jurei com a vida esconder esta história de morte...
Rui Lopes Castro
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